Login do usuário

Aramis

Alice cantando Brecht merece registro em LP

A mais generosa das instituições culturais que atuam no Brasil, com uma programação tão intensa que proporciona que algumas entidades (especialmente as de Curitiba) tenham quase 50% de suas atividades graças aos eventos que patrocina, o Goethe Institut/ Instituto Cultural Brasileiro Germânico tem agora uma ótima oportunidade para divulgar um outro lado de Bertolt Brecht (Augusburg, 10/2/1898 - Berlim Oriental, 14/8/1956) ano em que se comemora o 30º aniversário de sua morte. Para tanto basta que a elétrica Heidrun Bruckner, diretora do Goethe em Curitiba, consiga convencer seus superiores, em Munique, do bom investimento que estarão fazendo se bancarem a produção de um álbum com uma excelente atriz-cantora, Maria Alice Vergueiro, interpretando poemas de Brecht musicados por Kurt Weill (2/1900 - N. Iorque, 3/4/50) e Hans Heisller (6/7/1898-6/9/62). De certa forma, o disco está pronto para ser gravado. Afinal, há quatro anos que Maria Alice e seu primo, o pianista Guilherme Vergueiro (3 lps de jazz gravados, dois deles no Exterior), vem apresentando no Brasil e Portugal, um belo espetáculo criado com base na obra poético-musical de Brecht: "O Lírio do Inferno". No ano passado, em infeliz temporada no Paiol, pouquíssimas pessoas assistiram este espetáculo. Mulher decidida, vigorosa e que tem em Curitiba uma de suas maiores amigas - a tv-woman e radialista Léa Oksenberg - Maria Alice volta hoje para uma única apresentação de "O Lírio do Inferno" (auditório da Reitoria, 21 horas). É um espetáculo, com Maria Alice com todo seu potencial de cantriz, enquanto Guilherme mostra porque é, reconhecidamente um dos melhores pianistas de sua geração. Mas seria lamentável que neste ano do 30º ano da morte de Brecht, no qual o Goethe vem se empenhando em tantas promoções, que não seja feito algo de mais duradouro para registrar estes momentos em que as palavras do autor de "A Ópera dos Três Vintes" e as músicas de seus parceiros Heisller e Weill deixaram tanto significado. Inexiste no Brasil qualquer gravação com canções de Brecht - Cida Moreira, uma cantora paulista de bela voz - mas de péssimo gênio e humor - chegou, anos atrás a incluir em seu repertório algumas das canções mais conhecidas de "A Ópera dos Três Vintes". Entretanto, Maria Alice Vergueiro fez um trabalho mais consistente. Buscando excelentes tradutores (Catherina Hirsh, Tatiana Belinsky, Luiz Roberto Galízia, Cacá Rosset) escolheu de peças como "Happy End", "A Ópera dos Três Vintes", "Cabeças Redondas e Cabeças Pontudas" e "Alma Boa de Setsuã", as canções que se prestam a melhores interpretações. Como escreveu um dos mais rigorosos críticos teatrais do Brasil, Sábato Magaldi ( Jornal da Tarde, 16/10/82), atriz forte, indisciplina caótica, encontrou em Brecht anárquico, vital, não domesticado, da fase ainda prenhe de expressionismo, o parceiro espontâneo para esta bem realizada experiência artística. Assim, Maria Alice funde a voz e a convicção cênica, mostrando, como cantriz que é, um espetáculo de rara beleza e imensa personalidade. Sem imitar a melhor das intérpretes das canções de Brecht/Weill, a alemã Lotta Lenya (que foi esposa de Weill) Maria Alice dá a cada uma das letras aquela personalidade e beleza que só uma grande atriz consegue. Não é justo que tanta beleza e sinceridade fique restrita no palco. O álbum com "Lírio do Inferno" tem que se transformar em realidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
16/09/1986

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br