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Aramis

Belas, fortes e afinadas vozes de cantoras negras

Nos últimos meses de 1989 chegaram ao Brasil, praticamente simultaneamente ao lançamento nos Estados Unidos, discos de cantoras da maior vitalidade, com públicos ascendentes: Tracy Chapman ("Crossroads",WEA); "Rhythm Nation" (Janet Jackson, A&M/Polygram); "Bulletproof Heart" (Grace Jones, Capitol/EMI-Odeon); "The Sensual World of Kate Bush" (EMI-Odeon) - além de um revival ("Golden Hits", Imagem) de Dionne Warwick. Com exceção desta última, trazendo sucessos eternizados da dupla Burt Bachrach/Hal David - de quem foi a maior intérprete nos anos 60 ("I Say a Little Prayer", "Walk on By", "Do You Know the Way to San Jose", "Alfie", "Promises, Promises", "The Window to the World" etc.), as outras cantoras são exatas representantes da música deste final de década. De todas, sem dúvida, a mais importante é Tracy Chapman, americana de Cleveland, Ohio, que já em seu primeiro elepê, lançado há dois anos, conquistou os mais importantes prêmios, atingindo vendas impressionantes e, sobretudo, trouxe canções do maior significado político - uma delas "Talking About Revolution", já em versão de Joyce, incluída em seu último Lp. Negra, ativista, uma espécie de Joan Baez dos anos 80, Tracy Chapman participou de importantes espetáculos políticos - como os concertos do Bitter End, em Nova Iorque, em 4 de maio de 1989, e, no mês seguinte, em Londres, da homenagem ao aniversário do líder sul-africano Nelson Mandela. Portanto havia uma grande expectativa em torno de "Crossroads", seu novo Lp, lançado nos primeiros dias de outubro - e que poucas semanas depois a WEA editava no Brasil. Sônia Nolasco, em bonita apreciação no jornal "Estado de São Paulo", observou que neste novo Lp é como uma seqüência do primeiro: recicla temas e temperamento musical. Algumas das dez canções já haviam sido apresentadas em concertos e, duas delas, falam de desafios e mudanças que a fama traz aos artistas. "Born To Fight" é uma declaração sobre a dignidade humana em ritmo de blues, acompanhada pela gaita de Neil Young. "Material World" soa como "um aviso ambíguo aos negros de classe média, que tentam ser brancos na escalada social, renegando raízes, como observou Sônia. Enfim, Tracy Chapman foi a grande revelação como compositora do final dos anos 80, mostrando - assim como Joan Baez havia feito nos anos 60 e Nara Leão (ah! que sadudades) no Brasil, que cantar é um ato (muito) político. Mesmo sem ter a carga política de Tracy, outra crioula de forte presença - Grace Jones é uma cantora respeitável. Com uma imagem de "black is beautiful" internacionalizada por sua atuação no cinema, Grace é uma cantora de grande vigor e neste novo elepê reuniu um repertório diversificado, no qual chega a fazer uma interpertação muito pessoal de um clássico da canção napolitana - "Amado Mio", que pode irritar os tradicionalistas mas não deixa de ser uma curtição curiosa. Já Kate Bush em sua amostragem de "Sensual World", gravado em estúdios particulares e em Dublin, não deixa de ser pretensioso, a partir da faixa-título, originalmente inspirada em "Ulysses", de James Joyce. Afinal para esta cantora inglesa (Bexley, Kent, 30/7/1958) que surgiu nas paradas internacionais em 1978 com "Wuthering Heights" o sucesso veio cedo: aos 16 anos já era contratada da EMI-Odeon, etiqueta na qual permanece até hoje. Com seu Lp "Hounds of Love" permaneceu meses nas paradas de sucesso dos EUA e, há 4 anos, a compilação de discos e vídeos ("The Whole Story") também entrou entre os mais vendidos. Agora, neste "The Sensual World" Kate toca piano e teclados e é acompanhada por um time de músicos aclamados, incluindo as vozes incomuns do The Trio Bulgarka, da Bulgária, em três faixas ("Deeper Understanding", "Never Be Mine" e "Rocket's Tall") e o som surpreendente dos sopros de Davey Spillane na faixa-título. Já Janet Jackson - da família que canta e dança unida, faturando unida - em "Rhythm Nation" oferece uma "visão de mundo", um novo passo no trajeto desta performer que tomou a América de surpresa com seu disco anterior, "Control", lançado em 1986. Janet, seguindo os passos do irmão Michael, vendeu 5 milhões de cópias, emplacou 6 músicas no primeiro lugar da Top 100 e dos Hot Black Singles da "Billboard", ficando ainda durante 47 semanas na parada pop da mesma revista. Agora, com os mesmo produtores de "Control" (Jimmy Jam/Terry Lewis), volta em "Rhythm Nation", no qual as faixas se sucedem interligadas por vinhetas. Cada pausa é milimetricamente calculada, formando um conjunto de muita coesão. Sintomas de um desequilíbrio social e algumas maneiras de tentar superá-lo são expostos em letras objetivas. o romantismo só faz sua primeira aparição na quinta faixa do lado A - "Miss You Much". Os produtores e Janet assinam todas as faixas. LEGENDA FOTO 1 - Janet Jackson: nos passos do irmão Michael LEGENDA FOTO 2 - Tracy: nos passos de Joan Baez
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
25
21/01/1990

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