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Aramis

A boa música instrumental com Borghettinho e Pepeu

Tentativas já houveram muitas. As que deram certo - como a do Som da Gente, através do Nosso Estúdio, que graças ao empenho (e idealismo) de Tereza Souza e Walter Santos, já tem um catálogo de meia centena de títulos da melhor música (instrumental) - parte lançada no Exterior (e que, em março, na Town Hall, Nova Iorque, teve sua apresentação oficial para o mercado americano). Hoje, música contemporânea instrumental tem um sinônimo no Brasil: o Som da Gente. Outras (bem intencionadas) propostas ficaram no meio do caminho, como a série NMCP que a Polygram tentou anos atrás. Agora desde a segunda quinzena de setembro, é a Chorus, que está na praça. Ligada ao grupo Sigla/Globo e amparada em uma bem estruturada campanha publicitária, o primeiro suplemento traz jovens instrumentistas da melhor voltagem como os tecladistas Antônio Adolfo ("Cristalino", deixando assim o seu pioneirismo de produtor independente) e Marcos Ariel ("Piano Brasileiro"), guitarrista Vítor Biglione ("Quebra Pedra", após ter seus dois primeiros álbuns instrumentais reeditados há pouco pela WEA) e o trompetista Guilherme Dias Gomes ("Milhas e Milhas"). Todos em produções bem cuidadas, em formações de quartetos e sextetos de convidados de livres trânsitos internacionais, estes quatro álbuns merecem atenção especial - e aqui terão maior espaço tão logo possamos conhecê-los em maior profundidade. Não deixa de ser válido qualquer esforço pela música instrumental. Afinal, só há 5 anos foi que um tímido (hoje nem tanto) garoto gaúcho, com sua gaita ponto, numa produção de custo hoje ridícula (NCz$ 1.000,00) tornou-se o primeiro instrumentista brasileiro a ganhar o disco de ouro por mais de 100 mil cópias vendidas: Renatinho Borghetti. Mantendo sua longa cabeleira, entrecoberta por um chapéu bem nativista e com imensa popularidade especialmente no Sul, Borghettinho vem evoluindo artisticamente a cada novo disco. E uma demonstração disto está em seu novo álbum (Continental, outubro/89) com seis composições próprias. Não ficando apenas no regional - mas sem abandonar a força do que há de melhor na música regional - Renatinho realizou um belíssimo álbum, com produção do irmão Marcos e do amigo Airton dos Anjos (responsável pelo seu disco de lançamento, hoje com sua própria etiqueta, a Nova Trilha) e um repertório que se de um lado faz evoluções para projetos futuros de maior densidade (não há quem negue que Borghettinho esteja seguindo uma linha que poderia aproximá-lo, em alguns anos, a algo tão importante como fez Piazzolla, com o tango), não esquece também os mais autênticos talentos gaúchos, buscando o gaiteiro Porca Véia para participação especial em "Fabricação Caseira"; e homenagem a Gilberto Monteiro (mestre gaúcho do acordeon, que há um mês fez uma apresentação em Curitiba), autor de "Recordando as Bailantas", ou dando o título de uma das mais belas faixas a "Telmo de Lima Freitas", figura maior do nativismo gaúcho, imerecidamente ainda pouco conhecido (apesar de vencedor de dezenas de festivais gaúchos, tem apenas um elepê gravado e deixa o seu Estado para apresentações artísticas). Instrumentalmente um álbum adulto, com ótimos músicos integrados a cada faixa, Borghettinho atinge neste seu quinto elepê um ponto maior numa carreira que, aos 26 anos, ainda muito promete. Um belíssimo exemplo de elepê instrumental. Se Borghettinho é uma grata presença com as potencialidades da gaita de ponto, o ex-Novo Bahiano Pepeu Gomes, numa gravação ao vivo (aonde, com que, em que circunstâncias - perguntas que ficam no ar pela ausência de informações disponíveis) em "Antheroad" mostra todo o seu excelente lado de instrumentista, com raízes brasileiras, felizmente longe dos decibéis dispensáveis que o caracterizaram (e prejudicaram) em sua fase de "marido de Baby Consuelo". Sem temer assumir uma brasilidade (como aliás, os Novos Bahianos fizeram há quase 20 anos, em seu primeiro elepê pela RGE), Pepeu traz sua guitarra eletrificada, mas suave e harmoniosa, em homenagens das mais ternas como "Abraço para o Bonfá" (um dos temas de João Gilberto, que correu o mundo), uma nova releitura de "Garota de Ipanema", sua versão do clássico "Tico Tico no Fubá" (Zequinha de Abreu) e um poutpourri com clássicos de Pixinguinha ("Lamentos"), Jacó do Bandolim ("Noites Cariocas", "Assanhado"), Ary Barroso ("Aquarela do Brasil") e Valdir Azevedo ("Brasileirinho"). Apenas duas faixas - e também "Amazonia" e "Cartagena" de sua autoria (esta em parceria com Luciano Alves). Resultado: um esplêndido álbum, da melhor música instrumental brasileira - provando que Pepeu tem talento para não ficar barrado na porta do melhor de nossa MPB.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
18
05/11/1989

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