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Aramis

Cinema checo, com menos vigor vinte anos depois

Há 20 anos um ítalo-paulista, Mário Civelli, acertou na loteria esportiva cinematográfica ao trazer para o Brasil um lote de filmes da Checoslováquia. Até então os brasileiros nunca tinham assistido em circuitos comerciais filmes daquela república popular e, de repente, aqui chegavam obras deslumbrantes como "Um Dia, Um Gato" (Az pridje kocour, 1963), de Vojtech Jasny, espécie de conto-de-fadas fantástico sobre um gato que conferia as personagens a cor de seu verdadeiro caráter. Foi o maior sucesso de bilheteria e até hoje há espectadores que sonham em rever este filme, bem como outras produções daquela safra, como os da dupla Jan Kadar e Elma Klos - "O Anjo da Morte" (Smrt si Rika Engelchen), "O Acusado" (Obzalavanez, 64) e, especialmente "A pequena Loja da Rua Principal", que, em 1965, receberia o Oscar de melhor filme estrangeiro. Seria, entretanto, o jovem Milos Forman (hoje com 55 anos) que se tornaria o mais conhecido dos cineastas de sua geração. Suas duas primeiras comédias a chegarem ao Brasil, importadas por Civelli, foram "Pedro, o Negro" (Peter and Pavla, 64) e "Os Amores de Uma Loira" (Lasky Jedne Plavovlasky, 65). Emigrando, posteriormente para os EUA, desenvolveria uma fértil carreira a partir de "Procura Insaciável" (Taking Off, 71), até eclodir no superpremiado "Amadeus", há 3 anos. xxx Esta breve reminiscência vem a propósito da promoção que hoje se encerra no cine Groff - uma semana do novo cinema checoslovaco, com a exibição do desenho "Amoroso Funerale" e do longa "Contigo o Mundo Me Distrai" (Stebou me baví svet), 1982, da cineasta Marie Palednakova - o que prova de que também naquele país as mulheres estão ascendendo a categoria de realizadoras. Entre os filme da safra 60/64, trazidos ao Brasil por Mario Civelli - na época, representado no Paraná pelo jovem José Augusto Iwersen (que exibia a produção no pioneiro cine de arte Riviera) a este lote que vem com aval da Embaixada da Checoslováquia, observa-se que, infelizmente, o cinema checo regrediu. A julgar por alguns dos longas que assistimos - "Três Veteranos" (Drei veteranen), 83, de Oldrich Lipsky; "O Vendedor de Humor" (Prodavac Humoru), 84, de Jiri Krejcik e "O Belo Hubert" (Fesak Hubert), 84, de Ivo Bovak, embora tecnicamente corretos, com excelente fotografia, bons intérpretes e, especialmente, belas trilhas sonoras, falta ao novo cinema checo aquela dose de renovação e criatividade que marcava os seus filmes no início dos anos 60. A conclusão é óbvia: após a invasão de Praga pelas tropas do Pacto de Varsóvia em agosto de 1968 encerrou a chamada Primavera de Praga, período em que, sob a liderança de Alexander Dubcek, o país viveu um processo de abertura política e cultural, muitos cineastas deixaram o país e a linha dura se refletiria na produção cinematográfica. xxx Mesmo com essa ressalva, o cinema checo não deixou de ter uma boa qualidade. "Três Veteranos", por exemplo, 20º filme de Oldrich Lipsky, é uma comédia em tom de conto-de-fadas, destinada especialmente ao público infanto-juvenil. Já "O Vendedor de Humor", de Jiri Krejcik, baseda numa novela de sucesso de Roman Raz, critica a burocracia estatal, através dos problemas enfrentados pelo diretor de uma agência de espetáculos. Krejcik, o diretor, 69 anos, já realizou 18 longa-metragens. Igualmente satírico é o tom que Ivan Novak deu para "O Belo Hubert", sobre um simpático malandro em suas trampolinagens em Praga. A mostra trouxe também uma comédia em ficção-científica - "Saudações Cordiais do Planeta Terra", 82, do mesmo Oldrich Lipsky, de "Três Camaradas" e o "O vento no Bolso", e Jaroslau Soukup. Lamentável a tradução das legendas! Em "O Belo Hubert", as legendas têm palavras praticamente ininteligíveis. Não se trata nem de português para Portugal, mas com expressões talvez de algumas das províncias ultramarinas. A leitura das legendas já fazia o público rir durante a projeção do filme. Descontados os senões, valeu esta mostra do cinema checo, especialmente porque, dificilmente estes filmes terão projeções em circuito comercial.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
04/11/1987

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