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Aramis

A Columbia aproveita a vitrine do FestRio

Rio de Janeiro - Há quatro anos, quando da primeira edição do FestRio falava-se até em boicote organizado do cinema americano contra o festival brasileiro. Afinal a representação americana era pequena em proporção ao poderio da industria cinematográfica e alegava-se que não interessaria as tycoons da Usina dos Sonhos fortalecer um evento que nascia já declaradamente favorável as pobres, esquecidas e desconhecidas cinematográficas do Terceiro Mundo. Assumidamente, os idealizadores do FestRio, especialmente o diretor-geral, Nei Sroulevich e Cosme Alves, diretor da Fundação Cinemateca Brasileira, tinham uma posição favorável ao cinema do Terceiro Mundo, por eles sempre defendida com unhas e dentes. O cinema americano, seria, portanto, tratado, em pé de igualdade com as outras cinematografias - sem privilégios ou vantagens, mas também sem discriminação. Assim é que o FestRio, chegando agora ao seu quarto ano consecutivo - e para tanto enfrentando imensos problemas, a começar pela sempre crônica falta de recursos (só nas últimas semanas foram viabilizados os quase US$ 2 milhões necessários para um evento desta magnitude), tem se caracterizado por uma linha independente de interesses e pressões, preocupado, isto sim, em oferecer aos espectadores uma visão universal do cinema. Razão pela qual, na parte competitiva, traz obra de cinematografias totalmente desconhecidas entre nós - como a Turquia, representada pelo filme "Aaah Belinda", de Atif Yunaz e mesmo dos países do Leste europeu - Hungria, Checoslováquia, Polônia - ainda restritos a um público específico, que acompanha os poucos filmes destes países que chegaram ao Brasil, raros em lançamentos comerciais. A VISÃO DA COLUMBIA - Se algumas das grandes produtoras do cinema americano insistem em ignorar o FestRio - preocupadas apenas em ter o Brasil como um mercado para ser explorado com a produção mais comercial - ao menos a Columbia Pictures/Screem Gems está sabendo usar a grande vitrine promocional que representa este evento. Tanto é que está antecipando um farto material promocional de duas produções que terão suas exibições hors concours na Sala Glauber Rocha - "Esperança e Glória" de John Boorman, e na sessão de gala de encerramento, dia 28 - "O Último Imperador", de Bernardo Bertolucci. A Columbia ainda participa do FestRio trazendo cópias novas de quatro clássicos, premiados com Oscar, e que estarão sendo exibidos na mostra paralela "O Cinema Americano": "Do Mundo Nada Se Leva" (You Cant Take It With You), 1938, de Frank Capra; "A Grande Ilusão" (All The King's Men),1949, de Robert Rossen; "A Um Passo da Eternidade" (From Here To Eternity),1953, de Fred Zinemann; e "Sindicato de Ladrões" (On The Water-Front),1954, de Elia Kazan. Telma Gadioli, a atenciosa assistente de imprensa da Columbia Pictures, a exemplo de outras duas senhoras experientes na arte de bem divulgar o cinema - Hanny Rocha e Elza Costa - sabe aproveitar o momento certo para conseguir, na imensa oferta de material cinematográfico, fazer chegar às mãos dos jornalistas as informações sobre os filmes da empresa. O ÚLTIMO IMPERADOR - Programado para lançamento em Paris somente na próxima semana, "O Último Imperador", de Bernardo Bertolucci, terá um sabor de estréia mundial ao ser mostrado, no dia 28, sábado, encerrando o IV FestRio. Só neste mês de novembro é que as mais prestigiosas revistas de cinema da Europa - como a luxuosa "Studio" e a atuante "Premiére" - trouxeram as belíssimas fotos, em cores, antecipando a beleza do filme que Bertolucci rodou na China Continental, com fotografia de Vittorio Storaro ("Apocalypse Now", entre outros trabalhos que o consagraram), com seqüências feitas inclusive na chamada "Cidade Proibida", que pela primeira vez foi aberta para filmagens - reflexo da nova política cultural chinesa. Bertolucci (uma das personalidades ansiosamente aguardadas para o FestRio) e seu produtor Jeremy Thomas conseguiram a autorização do governo chinês após dois anos de exaustivas negociações. A 4 de agosto de 1986, em Pequim, foram iniciadas as filmagens desta superprodução bancada por bancos ingleses, com elenco gigantesco e cenários exóticos mas que narra a história intimista de Pu Yi (1906-1967). A história, antes de tudo, de um homem único e extraordinário, e da sua viagem de auto-descoberta, que começou, aos 3 anos de idade, como imperador da metade da população mundial para morrer como um simples jardineiro de Pequim. Bertolucci fascinou-se pela vida tumultuada do último imperador da China, que entre 1908/1922 viveu na Cidade Proibida, na qual as únicas pessoas de quem se tornou amigo foram a sra. Wang, sua ama, e sir Reginald Johnston (Peter O'Toole), seu preceptor escocês, que queria fazer dele um verdadeiro cavalheiro. Com 13 anos casou com Wan Jung, l6 anos - e fala-se que o casamento nunca se teria consumado e que Pu Yi sentia mais atração por jovens rapazes. Uma visão do lado da imperatriz Wan Jung, foi visto também no Festival - com a exibição ontem, de "The Last Empress", de Chen Scalin e Sun Quingguo, que representa a China Continental na mostra competitiva. Pu Yi (interpretado por John Lone, ator visto em "O Ano do Dragão", de Michael Cimino) em 1924 foi expulso da Cidade Proibida, que até então jamais havia deixado. Aos l8 anos, o imperador não passava de um desarticulado fantoche. Sonhava em estudar em Oxford, mas Pu Yi instala-se nas concessões ocidentais da costa chinesa. Tornou-se uma espécie de playboy, amante do fox-trot e das boates. Os japoneses terminaram convencendo-o a se tornar o Imperador da Manchúria, província ao Norte da China que eles tinham anexado. Traído, humilhado, forçado a endossar os massacres dos japoneses, Pu Yi afundou-se na depressão. Fugiu da Manchúria, quando esta foi invadida pelos soviéticos. Sua mulher, viciada em ópio morreu em 1945. Capturado pelos soviéticos, Pu Yi foi entregue às Guardas Vermelhas de Mao Tse-Tung e passou nove anos num campo de "reeducação". Os novos dirigentes chineses, conscientes do símbolo que representava o ex-Imperador, pediram a Pu Yi que fizesse a autocrítica de sua vida. Libertado em 1959, tornou-se empregado do jardim botânico de Pequim. Aos 53 anos, e pela primeira vez em sua vida, foi um chinês como os outros. Após escrever sua autobiografia, morreu em 1967, de câncer. Uma personalidade desconhecida no mundo ocidental e que com o filme de Bertoluoci - que terá seu lançamento comercial no Brasil no primeiro semestre de 1988 chegará a um público imenso. Bertolucci diz a respeito de sua história. - "É um personagem que passa da escuridão para a luz ou como a metamorfose de um homem que, como dizem os chineses, passa de dragão à borboleta, de imperador a cidadão." LEGENDA FOTO: A tragetória de Pu Yi, o último imperador da China, reconstituída no primeiro filme ocidental rodado naquele país.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
22/11/1987

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