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Aramis

Curitiba na memória de Walbach

O projeto de resgate da memória paranaense que, em tão boa hora, o Bamerindus decidiu promover, através da gravação em vídeo-tape de entrevistas de pessoas ligadas a diferentes setores, está possibilitando a armazenagem de preciosas informações. De maneira informal, captando a essência do que cada entrevistado tem a dizer, o ciclo vem sendo enriquecido com depoimentos, coordenado por um dos mais experientes e estimados jornalistas do Paraná, João de Deus Freitas Neto, e sempre com a participação de vários profissionais. xxx Ao lado dos depoimentos de políticos como Ney Braga (que já gravou duas sessões), e Saul Raiz, há também uma diversificação na escolha dos entrevistados. Por exemplo, na tarde de quarta-feira, quem falou longamente sobre a Curitiba dos anos 20 a 70, da medicina e de uma vivência muito grande em Blumenau dos anos da II Guerra Mundial, foi o médico Rubens Walbach, 72 anos, a serem completados no próximo dia 24 de agosto. Curitibano da Rua João Negrão, 2, "nasci no meio da rua, pois o velho casarão no qual vim ao mundo caiu com o alargamento", Rubens Walbach viveu uma Curitiba de amplos espaços. Por exemplo, sua infância foi feita nos amplos descampados que existiam onde hoje estão a Universidade Federal do Paraná e o Teatro Guaíra, "na época um banhadão da cidade". Rubens Walbach assistiu a inauguração da Praça Santos Andrade, em 7 de setembro de 1922, ouviu as primeiras transmissões da Rádio Clube Paranaense cinco anos depois e aprendeu a gostar de cinema "assistindo os far-west com Tom Mix nas sessões do Smart e Mignon". - "Uma tarde, um garoto chato, que insistia em perturbar na sessão, me irritou tanto que lhe dei umas bolachas. Só depois soube que era o filho do governador Caetano Munhoz da Rocha, o Gastão". No vestibular de 1934, os calouros da Universidade saíram às ruas em desfiles satirizando os planos da colonização inglesa no Norte do Paraná que pretendia trazer nômades iraquianos para aquela região: "O Pedro Cerqueira Leite saiu como árabe. Eu, desfilei nu, dentro de uma banheira" - recorda Rubens Walbach, para quem os trotes dos anos 30 tinham um sabor de crítica social, "diferente da brutalidade que os caracteriza atualmente". Formado em Medicina em 1939, após alguns anos no Rio de Janeiro, residiu em Blumenau entre 1943/48. Foram anos pesados, no final e pós-guerra, no qual aquela comunidade basicamente germânica sofria total intolerância. - "Houve muita violência, aproveitando interesses pessoais dos alemães. Uma caça às bruxas, um dedurismo assustador - que lembrei quando, no ano passado, surgiu a síndrome dos "fiscais do Sarney". Isto sempre é muito perigoso". xxx Com bom humor, Walbach lembrou uma curiosa estória: José Carlos Ubiratam da Silva Jatay Filho, filho de um cearense, nasceu na Alemanha, formou-se em engenharia na Inglaterra, e por mais de 20 anos residiu em Hanôver, onde chegou a ser cônsul honorário do Brasil. Com a II Guerra Mundial, foi obrigado a voltar para o Brasil e aqui trabalhar numa firma multinacional que o fazia viajar a Santa Catarina. Só que cada vez que chegava a um hotel nas cidades daquele Estado e com seu sotaque carregado, ninguém acreditava que fosse mesmo brasileiro. Resultado: poucos minutos depois acabava no xadrez. Pouco a pouco, alguns delegados foram entendendo que ele realmente não era um espião alemão, mas numa de suas prisões em Florianópolis, a autoridade que o deteve, após receber orientação para liberá-lo, disse ao seu colega Timóteo Braz Moreira, delegado de Blumenau: - "Olha, eu liberei o tal de Jatay, mas continuo convencido: para mim, ele é um Fritz disfarçado". xxx Como médico radiologista, dono de uma das pioneiras e maiores clínicas especializadas em Curitiba, Rubens Walbach fez revelações sérias. Por exemplo, há 25 anos que o governo do Estado não adquire equipamentos radiológicos, o que significa que nesta área os poucos que resistiram estão em difícil situação. A última aquisição de aparelhos radiológicos foram quatro aparelhos, da Siemens, em 1962, destinados a hospitais de Jaguariaíva, Portão e no bairro da Lapa, em Curitiba. Depois disto, nada mais se comprou. Não existe um único aparelho de exame ecográfico do Estado e, a rigor, e enquanto há uma sofisticação cada vez maior nesta linha de instrumental, a Saúde Pública do Paraná vive em compasso de espera. Indagado sobre qual foi o governador que mais se preocupou com a saúde pública, a opinião de Walbach foi sincera: - "Caetano Munhoz da Rocha. Em sua administração se construíram o leprosário São Roque, hospitais de isolamento e outras unidades que, até hoje, continuam a ser os poucos que atendem à população carente. LEGENDA FOTO - Freitas: gravando o passado
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
29/07/1987

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