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Em CD, Leon continua a reviver o que de melhor o Brasil cantou

Assim como o "Jornal do Brasil" apontou há alguns meses alguns "brasileiros de exportação" (entre os quais o curitibano Norton Morozowicz, flautista e regente da Orquestra de Câmera de Blumenau) como exemplos profissionais que honram o nosso país, a Câmara de Curitiba deveria também instituir uma homenagem realmente significativa aos "curitibanos de exportação" - pessoas que contribuem para que nossa cidade ganhe um prestígio fora de nossas fronteiras. Assim como Miran (Osvaldo Miranda Filho), com sua "Gráfica", é hoje um nome internacional, musicalmente aqui vive um recifense de nascimento mas curitibano por adoção (e que, portanto, também merece a cidadania honorária), Leon Barg, 60 anos, faz da "Revivendo" um motivo de orgulho. Em apenas três anos, com 77 elepês de música brasileira, 11 de reedições estrangeiras e 17 CDs, a "Revivendo" ganhou prestígio, credibilidade e admiração pela generosidade de Leon em, sem qualquer estímulo oficial, assumindo todos os riscos, passar para edições do melhor nível técnico (graças a competência do especialista Ayrton Pisco) verdadeiros tesouros de sua fabulosa discoteca que só em 78 rpm passa das 25 mil unidades. Mesmo com restrições de mercado, sabendo que certas produções destinam-se a faixas muito especiais de colecionadores - como o ufanista "Brasil - Canto de Amor", reunindo 23 hinos, marchas e canções patrióticas - Leon Barg não esmorece. Ao contrário, até o final do ano pretende chegar aos 30 CDs e só suspendeu a produção em vinil devido a restrição cada vez maior que esta opção sofre da parte dos lojistas. Nos próximos dias, a "Revivendo" coloca nas lojas três novos indispensáveis CDs documentais do que há de melhor em nossa MPB. Um volume com o grande Silvio Caldas (Rio de Janeiro, 23/05/1908), interpretando 20 de seus maiores sucessos; um álbum em homenagem aos 100 anos de nascimento de Augusto Calheiros (Maceió, 05/06/1891 - Rio de Janeiro, 01/01/1956) - cuja efeméride passou despercebida (*) - e um álbum absolutamente genial com Pixinguinha (Alfredo da Rocha Viana Jr., 1898-1973) e Benedito Lacerda (1903-1958), a pianista Carolina Cardoso de Menezes e Custódio Mesquita (1910-1945) e Orquestra numa remontagem de 23 músicas dos anos 30/40. Estes CDs se somarão aos seis últimos discos em laser que a "Revivendo" distribuiu nos últimos 60 dias - que incluem os três primeiros volumes de "Carnaval - Sua História, Sua Glória", "Brasil - Canto de Amor" e as montagens nas vozes de Francisco Alves /Jorge Fernandes e Gastão Formenti, num volume, e de Orlando Silva, Carmen Barbosa e Aracy de Almeida no outro. Orlando Silva (1915-1978) é, reconhecidamente, a voz mais perfeita da MPB dos anos 30/40 e, pela segunda vez, a "Revivendo" o relança em seu repertório original, como já havia feito em LPs. Leon Barg. Com sua competência e bom gosto selecionou 11 gravações de Orlando que oferecem uma excelente amostragem de um dos mais férteis períodos de nossa música: "Sertaneja" (Renê Bittencourt, 1939); "Não é Proceder" (Assis Valente / Haroldo White, 1935); "Já é de Madrugada" (Assis Valente / Carlos Perry, 1935); "Fui Feliz" (José Maria de Abreu / Francisco Mattoso, 1936); "História Joanina" (Leonel Azevedo / J. Cascata, 1937); "Dama do Cabaret" (Noel Rosa, 1936); "Meu Coração a teus Pés" (Benedito Lacerda / Jorge Faraj, 1938); "Boheiomio" (Ataúlfo Alves / J. Pereira, 1937); "Não Volto Mais" (Ataúlfo Alves / Alcebíades Barcelos, 1936) e "História de Amor" (J. Cascata / Humberto Porto, 1938). Neste mesmo CD, Leon Barg incluiu mais duas grandes vozes. Aracy de Almeida (1914-1988) também comparece com registros da mesma época, igualmente marcantes: "Tens de Compreender" (Antônio Nassara, 1935); "Não te Dou Perdão" (Germano Augusto / José Fernandes); "Palpite Infeliz" (Noel Rosa); "Não Quero Mais" (José Gonçalves / Carlos Moreira da Silva) e "Só Pode Ser Você" (Vadico - Noel Rosa) - uma amostragem da dimensão do talento desta pioneira feminista, cuja imagem caricata ficou de seus últimos anos como jurada no programa dominical de Sílvio Santos - mas deve ser ouvida (e respeitada) de sua fase áurea. Menos famosa do que Aracy, Carmen Barbosa (1912-1942) foi, entretanto, uma das grandes cantoras estilistas nos anos 30, tendo atuado em rádios como a Cruzeiro do Sul (onde começou sua carreira) e Tupi. Como morreu antes de completar 30 anos, a sua obra ficou pouco divulgada, o que faz com que se torne ainda mais importante a preocupação de Leon em procurar incluir registros (dos 14 discos com 27 músicas que deixou na Columbia, RCA e Odeon) em várias de suas produções. Neste CD, podemos apreciá-la em "Quero Sorrir... Quero Mentir" (Nelson Trigueiro), "No Picadeiro da Vida" (Herivelto Martins / Benedito Lacerda); "Carnaval que Passou" (Benedito Lacerda); "Meu Coração a Teus Pés" (Lacerda / Jorge Farajah) e "Sucursal do Céu" (Lacerda / Delcy Oliveira), todos feitos em 1937, período em que era contratada da RCA. xxx Uma das mais válidas preocupações da "Revivendo" é a de alternar nomes consagrados - capazes de garantirem a maior absorção dos ciscos - combinando outros menos populares e mesmo desconhecidos das novas gerações. Esta estratégia funciona no mais recente CD que Barg lançou há duas semanas, reunindo ao Rei da Voz, Francisco Alves, os menos populares Jorge Fernandes e Gastão Formenti. De Francisco Alves (1898-1952) não é preciso falar muito. O maior nome do rádio, disco e shows em sua época deixou 524 discos e 983 gravações que, pouco a pouco vêm sendo reeditados. Após ter inaugurado a série CD com um elepê todo dedicado ao Chico Viola, agora sua presença é dividida com Fernandes Formenti. Francisco Alves está presente com "limelights" como "Na Virada da Montanha", "Valsa do Rio", "Ela Disse Adeus", "Favela", "Durmo Sonhando", "Tua Partida", "Canção do meu Amor". Carioca, de uma família tradicional, Jorge Fernandes (1907-1989) era pintor e escultor, mas em 1928 já estreava na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro - a primeira emissora a funcionar no Brasil e no final de 1929 gravava seu primeiro disco (que só foi lançado em janeiro de 1930), como informa o sempre detalhista Abel Cardoso Jr., com a toada "A Cabocla do Arraiá" e a canção "Amô de Cabocla". O repertório de toda a sua carreira fonográfica (52 78 rpm com, 101 músicas gravadas entre 1929/56) sempre foi predominantemente de música folclórica. Também formado em engenharia, trabalhou no Instituto Geográfico e Geológico de São Paulo, mas fez várias excursões - no Brasil, com o compositor e pianista Waldemar Henrique e, mais tarde, viajando até a União Soviética. Sua voz pode ser apreciada neste CD nas músicas "Eu, o Luar e Você", "Caboclinho", "Caboclo Feliz", "Moreninha", "Silhueta", "Rolete de Cana" e "Adeus da Bahia". Gastão Formenti (1894-1974, filho de pai italiano (seu pai era decorador de mansões e igrejas) também começou na Rádio Sociedade, no ano em que ela foi inaugurada (1927) e foi um dos primeiros contratados da Odeon na fase da gravação elétrica, onde seu primeiro 78 ("Anoitecer" e o "Cabocla Apaixonada") saiu em novembro de 1927. Gravou 153 discos com 299 músicas e neste CD pode ser apreciado e, "De Papo Prô Ar", "Jangadeiro do Norte", "Ouve Amor", "Samba da Saudade", "Zíngara", "Amei uma Só Vez" e a clássica "Maringá", que Joubert de Carvalho (1900-1977) dedicou ao paraibano Ruy Carneiro, chefe de gabinete em 1932 do lendário José Américo de Almeida, ministro da Viação. Pombal e Ingá são cidades da Paraíba e a canção falando em "Maria do Ingá" virou "Maringá" e, em 1948, daria nome a cidade do Norte do Paraná - onde hoje Joubert é nome de rua e busto em praça pública - homenagem que lhe foi prestada em vida - e onde hoje se encontra o piano Steinway no qual Joubert compôs este clássico de nossa MPB.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
29/09/1991

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