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Aramis

Estes bregas do Norte que encantam o grande público

Sempre que é possível gostamos de abrir espaço para registrar, sem qualquer preconceito, a chamada produção brega. Afinal, na transformação sócio-econômica do País, com a música sertaneja aculturando-se a urbanização crescente (com todos os seus problemas econômicos e surgindo um novo gênero, o rurbano), a música brega reúne elementos da simplicidade sertaneja mas no choque cultural com informações urbanas - e o natural sonho de ascensão social de seus intérpretes. Os temas são sempre os mesmos - amores frustrados, traições, infidelidades, promessas de víngança ou, então, reflexos de uma vida mais espontânea, deixada no Interior. O mapa do brega distribui-se nacionalmente, com artistas regionais que alcançam vendagens extraordinárias. Um Amado Batista, goiano, após ser um dos maiores campeões de vendagens da Continental está hoje no elenco da RCA, cujo presidente Manolo investe tanto em superstars (como Chico Buarque, recém-contratado) como também em artistas de popularidade brega. A Polygram, astutamente, não despreza esta faixa e assim faz com que Julia Graciela, argentina radicada em São Paulo, após ter vendido milhares de cópias de um compacto falando em defesa das secretárias que são utilizadas sexualmente pelos patrões (que virou até tema para um filme, igualmente brega) chegue agora ao seu segundo lp ("Apaixonada"), na qual entre chorosos dramalhões - todos de sua autoria, em parceria com Gabino Corrêa - inclui até uma música ("Virgem do Trigo") que chegou a finalista na 5ª Coxilha Nativista do Rio Grande do Sul. Se Graciela dá um tom aparentemente erótico as suas músicas - cantando como se estivesse tendo forçados orgasmos, há os tipos galãs como Maurício Reis ("Estou Aqui"), de popularidade na região amazônica, cantando músicas como "Tudo Deu em Nada", "Amor Ingrato" e até uma versão ("Cai A Neve"). Na mesma faixa ataca Nunes Filho ("O Romântico", selo Tropical), que ao lado de suas próprias composições reforça o repertório com um brega consagrado - Waldick Soriano ("Tortura de Amor"), enquanto Edson Vieira em "Riviver" (Tropical/distribuição Fonobrás) é o exemplo do brega-pop: não só pelo traje de jeans, chapéu a sinatra anos 50 e abrindo o disco com uma versão dele próprio para "Nikita" de Elton John, seguida de músicas como "Revivendo Os Anos 60", "Para Viver Esse Amor" e "No Calor dos Teus Abraços". AMAZÔNIA BREGA O Norte do Brasil, especialmente Belém do Pará, é hoje um centro gerador da música brega. Do carimbó que o astuto Pinduca soube industrializar e que teve até na cantora Eliana Pittman uma das que mais aproveitou o estilo, a música da região, com suas fortes características populares espalhou-se por dezenas de intérpretes e compositores assumidamente numa linguagem brega. Só um dos compositores-intérpretes, Carlos Santos, é hoje um dos homens mais ricos do Pará, ao ponto de dispor de moderníssimo estúdio de gravação, uma rede de lojas e um contrato privilegiado com a Fonobrás, que somente distribui seus discos para o Sul, Centro-Oeste e Sudeste. No Norte/Nordeste, o Carlos Santos é nome desconhecido por aqui, mas popularíssimo em muitos Estados, nos quais surgem outros artistas, muitos dos quais gravado nos próprios estúdios de Carlos Santos. Por exemplo, Abílio Martins canta a sua região ("Amazonense - Machão"), entre lamúrias amorosas ("Pombinha", "Falsa Senhora") num disco no qual, astutamente, também colocou sucessos de Roberto-Erasmo Carlos ("Deixe-me outro dia, menos hoje"), Nelson Ned/Claudio Fontana ("Eu vou sair para buscar você"). Outro brega que busca o romantismo é Marcelo Clayton ("Ela disse que não dá", selo Tropical), no qual é autor das 12 faixas, cujos títulos já definem o espírito da coisa: "Paz Universal", "O Vulcão", "A Despedida de um Boêmio" e "O Preço do Erro". A busca de uma identidade urbana faz com que muitos intérpretes bregas desprezem qualquer analogia com a origem rural. É o caso do garotão Tato Júnior ("Pic-Nic", Tropical), que faz questão de aparecer na foto de contracapa ao lado de seu reluzente automóvel, símbolo de status social. Mesmo gravando uma "Lambada de Belém", Tato Júnior quer é mostrar seu lado romântico, com músicas como "Maria Helena", "Tire o Batom", "Me Abrace Forte" e "Vem Aliviar Minha Saudade". FORRÓ 7 INSTRUMENTOS O brega confunde-se com o forró, em termos de consumo embora representem estilos diferentes. Une-os a simplicidade do público-alvo. Por exemplo, buscando o público que faz de Marinês e sua gente, um grupo de sucesso há anos no Nordeste, aparece agora uma certa (Memória discos, distribuição Fonobrás) que a partir da prórpia música que dá título ao disco - "Enxugue o Rato" (Luiz Moreno), com a participação do acordeonista Abdias, sedimenta sua linha no forró incrementtado, pitadas de humor e malícia - como em "A Gata Comeu", "Carro Velho é Bronca", "Tesouro de Maria" e "Aquilo Que Você Queria". Abdias, músico convidado do lp de Marinalva, é um dos instrumentistas mais populares do brega-forró, que tem no acordeon, justamente, o seu instrumento forte. Por exemplo, Arlindo dos 8 Baixos em "Merengue Dela" (Memória/Fonobrás), liderando um grupo de dez músicos - incluindo a participação de Marinalva no triângulo - acrescenta uma outra influência musical: o merengue, a partir da faixa título, acrescentando-se ao "Forró Pauleira", "Forró Ferrado" e "Forró Pimenta", neste disco no mínimo curioso em termos instrumentais. Outro acordeonista-bregue, Camarão, apoia-se num grupo de seis cantores (Azulão de Caruaru, Walmir Silva, Joana Angelica, Martins do Pandeiro, Gill e Robson) para dar o maior balanço ao disco com seu grupo Mandacarú, como a maioria das produções bregue, acumulando a autoria de todas as faixas. Acordeonista e cantor, Maurício Farés, de Belém do Pará, em seu elepê (Gravasom/Fonobrás), explora o mesmo universo temático de tantos outros artistas do gênero: "Rainha do Meu Ser", "Minha Mãe Querida", "Quero Ser O Seu Marido". Entretanto, nem só de acordeon vive o brega - e há também instrumentistas que buscam outros recursos. Por exemplo, "Chico Cajú e seu Super Sax" (Gravarsom/fonobrás), traz 12 temas próprios, numa curiosa mostra da sonoridade de metais em canções extremamente pobres. Já Nonato do Cavaquinho é outro músico do Norte que não resistiu as influências do Caribe e apresenta nada menos que 12 temas de sonoridade mista em "Cumbia Exportação" (Tropical/Fonobrás), onde apesar dos títulos identificando outros rítmos ("Xote a Moda Antiga", "Carimbó com Cuíca"), sente-se aquela miscelânea sonora. POBRES ÍNDIOS Na dança comercial até os índios são atingidos. Se há duas notáveis musicistas - e Piscila - preocupadas em desenvolverem pesquisas sérias dos rítmos de nossas tribos, surgem também explorações naturais em torno de índios aculturados. um exemplo disto é Frankito Lopes, apresentado, como "O Índio Apaixonado", e que nas 12 faixas de seu elepê "Chorei: (Gravarsom/Fonobrás), mostra de como os veículos de comunicação, especialmente a televisão, interferiram na cultura indígena. Frankito Lopes nos lembra o caso de uma pobre garota indígena, que, anos atrás, explorada por um empresário inescrupuloso, percorria as cidades do interior, apresentada como "cantora indígena" mas tendo que cantar um repertório de influências roqueiras. Este Frankito Lopes contribui, em termos de Kitsch da música brasileira, com um disco cuja capa/contracapa, merece figurar naquela sonhada mostra do grafismo nas capas de discos, que Elifas Andreato promete organizar um dia. Nada mais característico para mostrar o colonialismo cultural.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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27/07/1986

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