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Aramis

Festival de Gramado ( VII )

Em casa de ferreiro, espeto de pau. Nos 13 anos que o festival do Cinema Brasileiro de Gramado vem sendo realizado, ainda não se produziu um bom curta metragem sobre esse evento, cuja documentação está em algumas dezenas de laatas com negativos rodados pelos cineastas Antonio de Jesus Pfeil e Clóvis Mezzomo, mas a espera de recursos para montagem e edição. Outro cineasta gaúcho. Carlos Cadalsso, hoje nos EUA , chegou a fazer um curta-metragem, mas que permanece inédito. Por sentirem esta ausência cinematográfica, um grupo de jovens e idealistas gaúchos, a maioria vindo do super 8, passaram todo o Festival rodando senas de um semificção intitulado " O Bicão de Gramado ", O roterista e diretor é Flávio Braga, mais o mais entusiasta da equipe é o diretor de fotografia, Mauro Ferreira, 25 anos, que no ano passado fez a fotografria de "O Retirante ", premiado curta de David Quintans que, entrentanto, omitiu seu nome dos créditos. Razão pela qual Mauro, quando o filme foi projetado, desafiou o cineasta luso-gaúcho ( radicado há 15 anos em Porto Alegre ) a " sair no braço ". David não aceitou o desafio mas Masuro pôs a boca no tranbone, denunciando-o publicamente. xxx Para rodar o filme durante o festival - e aproveitando as inúmeras personalidades ali presentes ( entre outros, aparecerão em pontas Tizuka Yamasaki, Beth Mendes, o músico Tavinho Moura etc. ) - Mauro usou negativos em 16mm, adquiridos com muitas dificuldades. Existe, entretanto, a boa vontade do secretáriado de turismo Luciano Peccin em auxiliar a jovem equipe, financiando o projeto. O vice-prefeito Enoir Zorzanello, consiciente da importância de Gramado preservar, históricamente, o Festival , já estuda a criação de um espaço físico - num imóvel de interesse histórico a ser tombado - para o " Museu do Festival ", embrião de uma futura cinemateca. Ao menos cópias de dois longa-metragens rodados em Gramados poderiam ali serem depositados : " Gaudêncio, O Centauro dos Pampas ", de Fernando Amaral e " As Filhas do Fogo ", de Walter Hugo Khouri. " Gaudêncio " foi rodado em 1972, com base nun roteiro de Damasceno Ferreira e tendo três nomes nacionais no elenco : os gaúchos José Lewgoy e Paulo José e Dina Sfat. Exibido no Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, " Gaudêncio " acabou inédito no resto do Brasil. Damasceno Ferreira, que já participou de mais de 20 filmes entre longas e curtas - inclusive fazendo assitência de filmes de Teixeirinha ("Sete Porvas ", Motorista Sem Limites " ) não guarda boas recordações de "Gaudêncio ". Seu roteiro foi adulterado e teve inúmeros problemas. Hoje, apesar de continuar acompanhando o Festival, se dedica apenas ás aulas de cinema do curso de comunicação de Universidade Católica, em Porto Alegre. Já " As Filhas do Fogo " , foi uma produção sofisticada e elaboradissima de Walter Hugo Khouri, rodado no belissimo cenário do Parque Knorr - uma das alterações turisticas de Gramado. Com belas mulheres - atrizes e um tema, como sempre, encucadissimo, foi lançado em 1978. Walter Khouri e um frequentador habitual dos festivais de Gramado, tendo este ano presidido o juri que julgou os curta-metragem. xxx A propósito, se entre os longa-metragens a comissão de seleção não teve dificuldades em selecionar os seis concorrentes ( já que apenas 8 foram inscritos ), entre os curtas houve um nível de qualidade bem mais elevado. No ano passado, os realizadores de curtas e medias- metragens protestaram pelo fato de seus filmes serem exibidos a tarde - quando é menor o público. Este ano, com apenas seis longas em comteição, foi possível programar quatro curtas em cada noite, dando assim um tratamento de maior realce a este gênero de cinema dos mais criativos e que enfrenta inúmeras dificuldades - especialmente a falta de um mercado especifico que os absorva. Dez curtas concorrrem na categoria nacional - merecidamente vencida por " A Longa Viagem ", de Chico Botelho ( diretor de ) " Janete ", rodado em 1983 em Curitiba e Piraquara ), que com fotografia do competente Adrian Cooper, se constitui num ensaio documental sobre a geração que sonhou um dia jamais envelhecer - os hipíes, seus hábitos, ídeais, sonhos e desencantos. Colhendo depoimentos dos integrantes da geração dos anos 70, intercalando até dois filmes comerciais que exploram a imagem jovem ( da Pepsi Cola e de uma marca de jeans ), " A Longa Viagem " é emocionante e foi planejado para ocupar um espaço na televisão. Diante a da boa repercussão - e de sua premiação - Botelho pensa em fazer uma redução para lançá-lo no circuito comercial. Na votação do público, o filme vencedor foi " O Bom Pastor ", intelligente aproveitamento de um personagem ( o diabo ) de uma peça do grupo Cem Modos, de Porto Alegre, com incrível capacidade de manipulação de bonecos, Roberto Carvalho, dono de um dos mais atuantes estudios de som do Rio de Janeiro - dos filmes em competição, oito haviam sido por ele sonorizados - decidiu tentar também fazer cinema e estreou de forma auspiciosa, com um filme de 8 minutos que tem plenas condições de agradar nas telas. Autor do filme mais hermético e com complexo apresentado no Festival, o média-metragem " O Som Ou Tratado de Hermonia " ( 16 minutos ), Arthur Omar foi premiado como melhor diretor. Assumindo um cinema extremamente pessoal - patente no curta " Barroco Mineiro " e no longa " Tristes Tropicos ". Arthur propõe um filme sobre a experiência sonora - o que é ouvir, o que é som, o que é experimentar um som. Imagens impressionantes - corte do aparelho auditivo de um cadáver - e utilizando depoimento de músicos e musicoterapeutas, para mostrar a diversidade com que cada um capta o som, este documentário foi levado ao último festival de Berlim, onde mereceu longa apreciação critica. " O que não obtive, pois ninguém se preocupa em analisar os curtas-metragens " reclamava Omar, no debate com os críticos e jornalistas na manhã de sábado. Em compensação, seu filme - apesar dos méritos - dificilmente terá comercialização já que pela linguagem empregada, só atinge a uma platéia altamente informada. xxx Não poderiam faltar curtas de tema politico : a atriz ( e agora diretora ) Marlene França fez um emocionante documentário sobre o frei Tito de Alencar Lima ( 1945 / 1974 ), que só no ano passado foi liberado pela Censura. Já o gaúcho João Guilherme Reis da Silva, em " Cone Sul ", reconstituindo - com fatos e depoimento - o sequestro do casal urugauio Lilian Celibert e Gumercindo Diaz, venceu na categoria regional - dividindo com " Os Cobras ", animação de Otto Guerra Neto, José Maia e Lancast Mota, sobre criações de humorista Luis Fernando Verissímo. Outra curta com temática politica foi " Eclipse ", animação de Antonio Moreira que como " Frei Tito " mereceu apenas menção especial do Juri pela " sua integridade ". Dois curtas sobre interessantes figuras : a pioneira aviadora paulista Ada Rogato. Que nos anos 40 pilotava um precário teco-teco, reverenciada em " Folguedos no Firmamento ", direção de Regina Rheda, e que deu a José Rodolfo Eliezer o prêmio de melhor fotografia ; já o ducomentário sobre Febrônio Indio do Brasil, primeiro preso brasileiro a ser encarcerado em um manicômio judiciário, onde ficou por mais de 58 anos saindo somente para morrer, aos 90 anos, em 1984, em " O Principe do Fogo ", direção de Silvio Da-Rin, deu a Ainda Marques o " Kikito " de melhor montagem. xxx Com os curta-metragens exibidos em Gramado - como em tantos outros festivais - ocorre o grande problema de permanecerem praticamente restritos a mostras especiais. Em Curitiba, graças ao relacionamento de Francisco Alves dos Santos programador da área de cinema da Fundação Cultural, muitos curtas tem sido exibidos na Cinemateca do Museu Guido Viaro. Agora, com dois cinemas no circuito ( e, em breve um terceiro, o luz ), o bom Chico pretende estender também no Groff e Ritz a chance de se assistir estes filmes realizados com dificuldades e amor, premiados em festivais ( na Bahia, Guido Araujo, promove anualmente uma jornada só de curtas e médias-metragens ) mas normalmente sem distribuição comercial. LEGENDA FOTO - Chico Botelho, autor do melhor curta - " A Longa Viagem ", recebeu o seu Kikito das mãos de Débora Bloch.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
05/04/1985

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