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Gonzaguinha no grande canto de amor a Luiz

Gonzaguinha (Luiz Gonzaga do Nascimento Jr., RJ, 22/9/1945) é um compositor-intérprete que está, há tempos, merecendo uma tese de profundidade. Se o seu pais, o grande Luiz Gonzaga do Nascimento (Exu, PE, 13/12/1912-Recife, 2/8/1989) já tem quatro livros a seu respeito - o último dos quais lançado há poucas semanas - Gonzaguinha também tem uma obra musical que o faz merecedor da atenção que vá além do simples registro jornalístico. Em seus 23 anos de carreira ativa - considerando-se como ponto de partida suas primeiras composições ("Lembranças de Primavera" e "Festa From U. S. of Piauí", gravadas por seu pai, em 1967), Gonzaguinha tem mostrado uma das mais fortes personalidades de nossa MPB. Aluno da Faculdade de Ciências Políticas Cândido Mendes do Rio de Janeiro (onde chegou a se formar em Economia), no tumultuado 1968 - o "Ano que não Acabou" como diz o jornalista Zuenir Ventura em seu berst-seller - Gonzaguinha espantava no I Festival Universitário de MPB com seu "Pobreza, pobreza". No ano seguinte venceria o mesmo festival com "O Trem" e, em 1969 com Ivan Lins, César Costa Filho, Aldir Blanc e outros formava o MAU - Movimento Artístico Universitário. A partir de então, sua presença só cresceria. Quem esperava, no início, como um herdeiro do Rei do Baião, amargou decepções. Criado por um padrinho, o violonista Xavier Pinheiro, sua identidade musical foi sempre mais carioca do que o Nordeste - e durante alguns anos a distância artística com o seu pai - e especialmente sua música - chegou a chocar a muitos. Mas era apenas uma fase. Vivia-se a época mais dura da repressão e Gonzaguinha formou, ao lado de Chico Buarque, Ivan, Aldir Blanc, João Bosco e alguns outros o símbolo da resistência ao regime ditatorial. Canções amargas, brabas, que não conseguiam, entretanto, esconder a sua imensa sensibilidade, o seu romantismo - com uma clara influência do bolero - e que explodiriam em algumas das mais belas canções dos anos 70, catipultuadas [catapultadas] nas vozes de nossas melhores cantoras. Absolutamente consciente da força das palavras, sem fazer concessões, a obra de Gonzaguinha é tão digna, honesta e coerente quanto a de Chico Buarque - para dar um exemplo maior. Havia o momento do protesto, da crítica, como houve o romantismo - sempre consciente, sem gorduras pegajosas ("Começaria Tudo Outra Vez", "Não Dá Mais Pra Segurar/Explode Coração", "Diga Lá, Coração" etc.). Houve, naturalmente, a aproximação com o pai - em discos, shows e uma afetividade que agora se transforma no grande Projeto Asa Branca, que Gonzaguinha fez questão de detalhar num release especialmente para acompanhar seu novo elepê ("Luizinho de "Gonzaga", WEA) que, por sua importância nos permitimos transcrever em parte nesta página. Parte deste projeto, é o próprio álbum com produção executiva de Roberto Sant'Ana - um baiano a quem a MPB deve a revelação de muitos talentos - e do tecladista J. Moraes, há muitos anos companheiro fiel de Gonzaguinha. Gravado em novembro de 1989, este álbum de Gonzaguinha foi concebido como uma grande homenagem ao pai - na releitura de alguns de seus momentos maiores - "Baião", "Imbalança", "Vida do Viajante" e "Respeita Januário", com citações de "Vassouras", "Mangaratiba" e "De Teresinha a São Luiz", sem falar no clássico "Asa Branca", este num grande Coral dos Amigos. Em outro Potpourri, com a participação das filhas Fernanda, Amora e Mariana, Gonzaguinha "Olha Pro Céu" e, de uma forma tão brasileira faz citações de "Noites Brasileiras", "São João na Roça", "São João de Arraiá" e "Pagode Russo", entre tantas canções que Gonzagão deixou para o nosso cancioneiro. O Gonzaguinha compositor, capaz de sempre fazer pensar, é a presença em "Humanos", lembrando que "Nós não somos bichos/Nós não somos animais/Nós não somos feras selvagens/Nós não somos bestas selvagens/Nós não somos animais selvagens/somos não". A poesia um tanto onírica, meio surrealista de "Borboleta Prateada", não deixa de ser um momento de romantismo, quando diz "Eu quis pegar a Borboleta Prateada/E ela roubou meu coração/São os mistérios dessas coisas encantadas/As armadilhas da paixão". E o romantismo explícito, desbregadamente sensual explode em "Uma Vez Por Semana", na qual se mostra como fazer um canto erótico com bom gosto, elegância e tesão. Chama-me amor! Abraça-me! Mata-me, sem pressa, com muito carinho! Beija meu corpo inteiro Enquanto tira a minha roupa Dá-me assim, lento o prazer da paixão! "Avassaladora", é outro canto erótico, excitante e marcante, desta fase de romantismo explícito em que Gonzaguinha diz "Lambe o pescoço/Morde a orelha/Enfia a língua/por entre dentes/Tomando toda a sua boca". Entre a afetividade a figura paterna - e a maior prova de quanto o velho Gonzagão era amado está no superelenco reunido para "Asa Branca" (Elba Ramalho, Fagner, Marinês, Elisete Cardoso, Joana, Alcione, Carmen Costa, Beth Carvalho, Rosana, Herbert Viana, Marlene, Erasmo Carlos e até Xuxa entre outros superstars) - e ao romântico-erotismo das canções novas, o álbum de Gonzaguinha é, claramente, um disco para pensar & provocar. Provocar paixões, admirações - mostrando um artista maior, intérprete de seu tempo, da vida, dos sentimentos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
25
17/06/1990

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