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Inédito e malpago! A denúncia de Felício

FELÍCIO Raitani Neto é um dos mais respeitados escritores paranaenses. Discreto, ausente das rodinhas supostamente intelectuais, prefere desenvolver um trabalho sólido, profundo, com poucos mas importantes livros que tem publicado às suas expensas. Não o conhecemos pessoalmente mas admiramos sua obra e suas posições. Por isto, o belo e corajoso artigo que acaba de publicar no "Jornal do Livro" (outubro/novembro/84 no 5), que a Criar Edições vem lançamento regularmente, merece ser transcrito. Em seu texto cristalino, Raitani Neto denuncia, mais uma vez, a [demagógica] promoção do governo do Estado, que a guisa de estimular os autores paranaenses na [verdade] que r é explorá-los. Mais um entre tantos escândalos ocorridos na área cultural nos últimos dois anos e que, através de opiniões insuspeitas como o de Felício Raitani Neto, mostram que não se trata de críticas pessoais - mas sim, aquilo que toda a comunidade intelectualmente não comprometida com o descalabro que se implantou na tristemente famosa Secretaria da Cultura e Esportes (sic) vem sentindo desde março de 1983. Com a palavra, portanto, Raitani Neto - que intitulou seu texto de "Inédito e Mal Pago". xxx "A Secretaria de Estado da Cultura e do Esporte, através do Conselho Estadual de Editoração, bolou um programa editorial denominado Chamada Geral, pelo qual se propõe incentivar e divulgar a produção literária paranaense, selecionando e editando as obras de teatro, prosa de ficção, poesia, ensaio literário e literatura infantil que lhe forem encaminhadas por autores nascidos ou radicados no Paraná. As obras a serem editadas, pelo óbvio, deverão ser inéditas, pois o propósito é também de revelar novos autores. E de como tenha do termo inédito um conceito elástico, apressa-se a esclarecer: "Entende-se por texto já editado ou inédito o trabalho que não tenha sido publicado em forma de livro, salvo edição do autor". A boa nova, de início ouvida através das emissoras de rádio e televisão, produziu certa euforia nos meios intelectuais. Todos se puseram expectatenses, no aguardo do regulamento. No entretempo foram tratando de retirar os originais da gaveta. Veio em seguida o regulamento de 13 dispositivos, em volantes impressos e espalhados pela Capital e principais cidades do Interior, também estampado no Diário Oficial do Estado - com a mais ampla divulgação na imprensa. Tudo nos conformes e no prometido. Todos esperançados, nem era para menos, ante o aceno do volante em letras garrafais: "O BRASIL VAI CONHECER OS ESCRITORES DO PARANÁ". Todavia, a uma simples inspeção ocular pelos treze itens do regulamento - que azar! Houve até, aqueles que, em estado de euforia plena, haviam acudido sem mais detença à Chamada Geral e acabaram por retirar, desiludidos e revoltados, os originais cancelando a inscrição. Entretanto o prazo de inscrição em 30 de agosto p/passado, não excedeu de umas três dezenas os originais entregues, a maioria ou totalidade provindos das cidades interioranas, gênero poesia, segundo revelaram. Qual a razão do desencanto? A pedra do tropeço está neste dispositivo: "10 - Os direitos autorais da 1a edição dos trabalhos selecionados, para publicação em livro, revista ou qualquer outra adaptação e veiculação, no Brasil e exterior, pertencerão à Secretaria de Estado da Cultura e do Esporte, nos termos da legislação vigente". Que decepção! À sombra desse paternalismo padrasto supõe-se estar bem amparados o escritor paranaense. Que falta de respeito aos direitos do autor, sob a falaz invocação: "nos termos da legislação vigente", a qual desconhecemos e ninguém viu. Em que engodo caiu aquele que, esperançoso e crente de ter sua obra editada e divulgada no Brasil e possivelmente no exterior, se inscreveu, implicando a inscrição "na aceitação, por parte do interessado", de todas as exigências deste Regulamento", pena de exclusão da obra de seleção. Com mais esta agravante: o Conselho Estadual de Editoração tem noventa dias após o enceramento ([prorrogáveis] naturalmente) para julgar e divulgar os resultados, mais o prazo de um ano a contar da data de divulgação dos resultados para publicação da obra selecionada. Por todo esse tempo o autor ficará sem poder divulgar a sua obra, na expectativa da publicação que poderá ficar para as calendas. Pior, ainda: publicada em livro, revista ou qualquer outra adaptação e veiculação, aqui e para além mar, sem receber nada a título de direito autoral, sequer compensado com exemplares de sua obra, nos termos da lei estadual vigente, ao que parece sancionada com presente regulamento, derrogadora da recém-promulgada Lei do Direito Autoral. O autor paranaense é um escritor inédito, única verdade admitida no regulamento. Embora tendo publicado, à sua custa, uma dezena de livros, os quais não conseguem colocação no mercado porque as livrarias relutam em aceitá-los até em consignação; que não vendem, porque não tem distribuição, ou porque jazem empoeirados lá no fundo do estabelecimento, nos desvãos de [alguma] prateleira antes batizada solenemente de "ESTANTE PARANAENSE". Então o autor paranaense - generoso, despreendido que é - oferta seus livros aos amigos (mesmo porque, se não os dá, sentem-se magoados) e aos estranhos, inclusive às bibliotecas públicas, apesar destas se omitirem em relação aos de casa sob alegação de falta de verba, que não falta para best-sellers inexpressivos. A maioria recebe o livro desconfiado, pois se lhe é dado de graça, é sinal que não presta. E não lê. O autor paranaense é um escritor inédito. Ilustre desconhecido, morre inédito".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
20
19/12/1984

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