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Aramis

Mesmo na pobreza, haverá 22º Festival de Brasília

Nos últimos 26 anos o Festival de Cinema Brasileiro de Brasília tem uma longa história de dificuldades em sua sobrevivência. Na época mais difícil da ditadura militar, a resistência democrática que representava aquele evento irritava setores do governo que, por alguns anos, chegaram a suspendê-lo. Nos últimos anos, dificuldades financeiras e, por último, em 1988, divergências entre a presidência da Fundação Cultural do Distrito Federal - ocupada pelo Maestro Marlos Nobre - com as pessoas que o organizavam, também levaram a ter edições praticamente improvisadas. Este ano, até há três semanas passadas não havia ainda se viabilizado a organização do Festival. Mas como seria lamentável que o mais antigo das mostras competitivas do país fosse cancelada justamente no ano em que se cristaliza o retorno da democracia com as eleições presidenciais, houve um tour-de-force para, superando conflitos pessoais, falta de recursos e mesmo estrutura administrativa, o evento voltasse a acontecer. xxx Marco Aurélio, pesquisador e animador cultural dos mais sérios - e a quem se deve alguma das melhores edições do Festival - voltou a coordenação executiva. A Secretaria da Cultura do Distrito Federal assumiu o Festival que, este ano, não terá nenhuma ligação com a Fundação Cultural. A Embrafilme também deu braço forte para que de 1º a 7 de novembro aconteça o 22º Festival do Cinema Brasileiro de Brasília. Além das dificuldades econômicas e administrativas, uma questão maior: obter filmes inéditos (isto é, que não tenham disputado outros festivais) para concorrerem aos troféus "Candango". A produção cinematográfica está tão reduzida que os poucos filmes em condições de competição ou já foram levados aos festivais de Gramado e Natal ou não estão finalizados. Por exemplo, "Círculo de Fogo", de Geraldo Moraes, mineiro radicado em Brasília, não pode ser concluído a tempo para concorrer e assim, até ontem, pensava-se na inclusão de "Jardim de Alah", de David Neves (que já obteve prêmios especiais do júri em Gramado e Natal), completar o quadro dos filmes na competição. xxx O nível dos longas e curtas que estarão concorrendo em Brasília promete bastante. Há três filmes totalmente inéditos - isto é, não exibidos até agora em sessões públicas - que concorrem: "Os Sermões", que o inovador Júlio Bressane realizou, livremente a partir da obra do jesuíta Vieira; "Barrela", produção na qual a Cinédia associou-se, direção do estreante Marco Antônio Curi, com base na peça de Plínio Marcos que permaneceu proibida durante anos e "Minas Texas", do mineiro Carlos Alberto Prates - que com "Cabaré Mineiro" conquistou premiações em vários festivais. Dois documentários de longa-metragem estarão entre os mais fortes concorrentes: o emocionante "Que Bom te Ver Viva", da jornalista Lúcia Murat - apresentado hors concours nos festivais de Gramado e RioCine e "Uma Avenida Chamada Brasil", de Octávio Bezerra - exibido hors concours no último RioCine e já lançado no circuito comercial do Rio de Janeiro - mas inédito no resto do Brasil. "Que Bom te Ver Viva" é um filme altamente pessoal de Lúcia Murat, jornalista que foi presa e torturada, viveu no exílio e que, com tremenda garra reuniu depoimentos de 8 ex-prisioneiras políticas, todas torturadas, em depoimentos emocionantes. Irene Ravache, numa personagem ficcional (mas com muitos traços da própria Lúcia), serve de ponto de ligação entre os depoimentos, numa interpretação tão forte que, independente dos outros filmes em competição, deverá sair de Brasília com o Candango de melhor atriz. "Uma Avenida Chamada Brasil", de Octávio Bezerra - carioca de origens pernambucanas, curtametragista que chegou ao longa em "Memória Viva" (que representou o Brasil no IV FestRio), é um documentário sobre as favelas que margeiam a Avenida Brasil. Se em "Memória Viva" - filme até hoje inédito em Curitiba (e em várias outras capitais), Bezerra fez um corte visceral na questão cultural brasileira, agora levando suas câmaras a periferia do Rio de Janeiro fez outro documento contundente, que também deverá provocar muita polêmica. xxx Seis curta-metragens, inéditos em festivais, estarão também concorrendo: "Dia de Visita", de Reinaldo Pinheiro e Umberto Martins; "Pós Modernidade", de Mirella Martinelli; "Canal Click", de Sandra Werneck; "O Amor nos Anos 90", criação coletiva dos alunos do curso de cinema da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; "Musika", de Rafael Conde e "Mamãe Parabólica", de Ricardo Favilla. xxx Na noite de encerramento do Festival, 7 de novembro, será apresentado, em sua primeira exibição pública, "Brasília, Última Utopia". Produzido graças a iniciativa de José Aparecido, quando governador do Distrito Federal - hoje Ministro da Cultura - este filme reúne seis diferentes visões de Brasília, em episódios dirigidos por cineastas radicados no Distrito Federal. São eles: o paraibano Vladimir Carvalho com "A Paisagem Natural"; o cearense Pedro Jorge de Castro com "O Sinal da Cruz"; o mineiro Geraldo Moraes com "A Capital dos Brasis"; o baiano Roberto Pires com "A Volta de Chico Candango"; Pedro Anísio com "Além do Cinema do Além" e o mineiro Moacyr Oliveira com "Suíte Brasileira". Moacyr Oliveira é o atual presidente da Embrafilme. xxx Uma mostra informativa será realizada a tarde, também no Cine Brasília, com os filmes "Lua Cheia", de Alain Fresnot (premiado com melhor filme no I Festival do Cinema Brasileiro de Curitiba); "Ori" de Raquel Gerber; "Corpo em Delito", de Nuno Leal; "1º de Abril, Brasil", de Maria Letícia (premiada como melhor diretora no Festival de Curitiba) e "A Festa", de Ugo Giorgetti (melhor filme no XVII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado). Além dos troféus Candango, haverá premiações em dinheiro variando de NCz$ 8 a NCz$ 1 mil para as diferentes categorias. Os prêmios maiores (NCz$ 8 mil) serão para os longa-metragem escolhidos como os melhores do festival - nas votações dos júris oficial e popular. LEGENDA FOTO - Raquel Gerber, diretora de "Ori", um dos concorrentes no Festival de Cinema de Brasília.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
20/10/1989

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