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Aramis

A negritude presente nas telas do FestRio

A ausência de "Cry Freedom" na sessão de abertura do FestRio não impediu que esta quarta edição fosse marcada pela solidariedade a África do Sul, com homenagens ao casal Mandela. Entretanto, foi lamentável que a Universal Picture e os produtores desta superprodução tivessem poucos dias antes da abertura da mostra, vetado a vinda de "Cry Freedom" para abrir o Festival. Baseado em uma história real, desenvolvida pelo escritor Donald Woods em dois livros - "Diko" e "Asking For Trouble", "Cry Freedom" é a nova realização de Richard Attenborough que espera repetir o feito de "Gandhi": lançado dia 6 de novembro em Los Angeles e algumas outras cidades americanas, esta superprodução condenando o racismo na África do Sul deve aparecer em várias nominations ao Oscar-88. No elenco, não há nomes famosos: Kevin Kline já fez alguns filmes mas ainda é pouco conhecido no Brasil e de Penélope Wilton e Denzel Washington, até agora ninguém ainda ouvia falar. A trilha sonora é de George Fenton e Jonas Gwangwa e só na semana passada o disco com a sound track foi para as lojas americanas. Se "Cry Freedom" não pode ser exibido - substituído pelo emocionante "Au Revoir, Les Enfants", no qual Louis Malle denuncia também o racismo, ao voltar sua memória a um episódio de sua infância, na França ocupada pelos alemães - nem por isto o FestRio deixou de "arregaçar as mangas e lançar sua contribuição nas lutas travadas em todo mundo pela igualdade racial", como nos dizia, antes da cerimônia de abertura, o diretor-geral Ney Sroulevich. Assim, antecipando-se ao ano em que se comemorará o centenário da abolição da escravatura no Brasil, o FestRio teve além da homenagem ao casal Mandela, na cerimônia de abertura - com a entrega do "Tucano de Paz" - uma série de produções para vídeo que tratam da questão. De saída, a homenagem à Winnie a Nelson Mandela prestada por músicos do peso do norte-americano Paul Simon, dos africanos Hugh Masekella, Mirian Makeba e o coral Ladysmith Black Manbazo, no mundialmente divulgado Concerto de Graceland. O mesmo casal Mandela, símbolo da luta do povo negro sul-africano contra a política de segregação racial naquele país, foi motivo para a realização de um documentário produzido pela ONU que relata a vida dos dois desde antes do casamento, e constrói um painel dos principais acontecimentos políticos e sociais da África do Sul nos últimos anos, através de imagens de época, algumas exclusivas, e de depoimentos de quem viveu esses acontecimentos. O vídeo norte-americano "Bophal" trata, também dos problemas causados pelo apartheid, só que parte de um outro ponto-de-vista: traçando um paralelo entre os aspectos da realidade sul-africana e seqüências de uma peça de teatro ("Bophal!"), que narra a relação entre um policial negro e seu filho, um ativista anti-racismo. Narrado por Sidney Poitier, este vídeo foi um dos premiados com o Tucano de Prata. Dos Estados Unidos veio, ainda, "1954-1965, os anos de Liberdade", documentário em seis episódios sobre a história dos direitos civis norte-americanos. Produzido pela Blackside, "Eyes of the Prize", título original da série e referência à música do mesmo nome sempre cantada nas manifestações àquela época, revela, através de imagens históricas, a luta e a conquista pelos negros norte-americanos da igualdade de direitos, numa sociedade racista, principalmente no sul do país. Moçambique, país do Terceiro Mundo, ex-colônia de Portugal. Não bastasse a qualidade de "Moçambique-Atualidades" (exibido numa das mostras especiais de vídeo), coletânea com dezesseis dos melhores documentários de curta duração produzidos pelo canal Zero, TV estatal daquele país - as semelhanças históricas entre o país africano e o Brasil fizeram desse um dos vídeos de maior impacto do FestRio. Ele engloba matérias que vão da escolarização e reintegração de crianças órfãs de guerra a novas famílias aos depoimentos de cidadãos no dia seguinte ao da morte do presidente Samora Machel, passando pela modernização dos métodos de higiene visando a redução dos índices de mortalidade, pelos efeitos da seca e da guerra na nova geração de moçambicanos, pela situação da mulher na tradicional sociedade africana, e, até, pelo depoimento patético de um pacato cidadão, vítima de bandidos que lhe cortaram as orelhas. LEGENDA FOTO: Louis Malle (ao lado de Jean Gabriel Albicoco) apresentou seu "Au Revoir Les Enfants" na abertura do FestRio: "É o meu filme mais pessoal e uma contribuição contra a intolerância racial".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
04/12/1987

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