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No festival de cinema, debates sobre rádio e tevê

Rio de Janeiro - Experiente freqüentadora de festivais, Walkíria Barbosa, diretora do Centro Cultural Rio Cine desde sua criação, há seis anos, foi prática: como os debates matinais raramente têm interessados, "já que o pessoal prefere a piscina ou a praia do que rediscutir velhas questões do nosso cinema", as manhãs ficaram livres, embora alguns curtametragistas, com o natural entusiasmo de quem agora se inicia nos caminhos do cinema, ansiassem em "expor e debater" suas propostas. Cineastas como Geraldo de Moraes, gaúcho radicado em Brasília e diretor de "O Círculo de Fogo" - um dos filmes apresentados na mostra internacional - se diz cansado de ouvir lamúrias e críticas em relação aos tempos duros que o cinema brasileiro enfrenta. Assim, o fórum de debates foi, apropriadamente, transformado num seminário de três dias intitulado "O Ar" - para abranger questões ligadas à televisão e o rádio, abordando especialmente a questão da democratização destes veículos de comunicação através da revisão do Código Nacional de Telecomunicações. O eixo das discussões evoluiu para a necessidade de se batalhar pela criação de rádios e televisões independentes, de potências limitadas, mas que servindo suas comunidades e regionalizando a produção cultural evitem que continue a pasteurização que caracteriza há mais de 15 anos o império das redes nacionais de televisão e a programação colonizada culturalmente, sem valorizar os artistas e talentos regionais. Na última semana de janeiro, na cidade de Macaé, Estado do Rio, haverá o I Encontro pela Democratização dos Meios de Comunicação, anunciado oficialmente pelo jovem secretário municipal de Cultura, Aldo Mussi Teixeira, adiantando que representantes de rádios piratas de vários Estados - inclusive do Paraná - estarão presentes nesta corajosa reunião. O prefeito de Macaé não só teve a audácia de patrocinar este encontro como defende com unhas e dentes a Rádio Tam-Tan canal pirata que em seu município faz uma programação culturalmente aberta aos talentos locais dando cobertura a compositores e músicos locais. O escritor José Louzeiro, autor de vários roteiros (telenovelas e também reportagens, romances) da maior coragem, inclusive "Pixote", filmado por Hector Babenco, na condução dos trabalhos da segunda sessão do Seminário foi incisivo: mostrou os malefícios culturais e políticos da concentração de canais de rádio e televisão nas mãos de grupos políticos - e o legítimo direito de se reivindicar, organizadamente, a concessão de espaços para televisão e rádios independentes, servindo basicamente a comunidades ou mesmo instituições, como sindicatos de classe. Experiências desenvolvidas por algumas estações alternativas foram relatadas por produtores ligados à TV Alternativa/TV Viva, de Recife; TV Pirata/TV Cubo; TV Maxambomba, de Belfort Roxo, e da TV Búzios, que embora funcione como retransmissora da TV Educativa, também tem acolhido uma programação voltada especialmente a produções independentes. A deputada Beth Mendes (PT-São Paulo), presente na segunda sessão do seminário, foi brilhante em sua intervenção: apontou a necessidade de ser regulamentado o Conselho de Comunicação Social previsto na Constituição de 1988, objeto de projeto-de-lei que apresentou somando à iniciativa semelhante da deputada Lídice da Matta (como ela, também não reeleita), "de uma forma que se possa torna realidade o que prevê o artigo 211, capítulo 5, da Constituição: 1) - Dar preferência às finalidades educativa, artística, cultural e informativa; 2) - Promoção da cultura nacional e regional e estimular a produção independente que objetive sua divulgação e 3) - Regionalizar a produção cultural, artística e jornalística com forma percentual estabelecida em Lei. Entre a letra fria da Constituição e a realidade falta o espaço da regulamentação - e nisso afloram os grandes interesses contrários a que se modifique o Código Nacional de Telecomunicações, motivo pelo qual 65 instituições e personalidades ligadas à produção cultural, sindicatos etc. formaram no Rio de Janeiro um comitê ativíssimo para estabelecer a estratégia de ação em 1991, quando o novo Parlamento deverá referendar a legislação. Para não dizer que o cinema não era lembrado neste debate, com bom humor, foi citada uma frase do imortal Glauber Rocha: "No Brasil, o que a lei dá, o parágrafo tira".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
24
23/11/1990

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