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Aramis

A nostálgica polêmica dos patrulheiros da madrugada

Três depoimentos que estão fazendo falta no projeto Memória História do Paraná: o ex-governador Moyses Lupion e os escritores Walfrido Pilotto e Temístocles Linhares. Três paranaenses que terão muito a contar, pois estão entre os homens que mais de perto acompanharam significativos fatos na área política, econômica e cultural. Por diversas razões, até agora não foi possível conseguir convencê-los a colaborar com este meritório projeto, desenvolvido com patrocínio do Bamerindus e que vem perpetuando em imagens e sons, a presença dos homens e mulheres que participaram de nosso Estado nesse século. Para o futuro, em modernas bibliotecas e centros de pesquisas, as gravações que a moderna tecnologia permitirá que se tenha um precioso filão de informações narradas pelas pessoas que direta ou indiretamente, participaram dos acontecimentos. xxx No caso de Oswaldo Pilotto e Temístocles Linhares, a importância de seus depoimentos refletirá em vários aspectos de nossa vida intelectual - sem descartar outros setores, já que ambos foram atuantes na vida econômica (Temístocles Linhares) e da segurança do Estado (Pilotto). Num livro recém editado ("Relíquias de uma Polêmica entre Amigos", José Olympio Editora /Secretaria da Cultura do Paraná, 173 páginas), Temístocles Linhares reuniu textos deliciosos publicados há 46 anos na "Gazeta do Povo", no qual quatro jovens intelectuais da época - Bento Munhoz da Rocha Neto, Caio Machado, Milton Carneiro - os três já falecidos - e Temístocles, discutiram questões relacionadas à Rússia e ao comunismo. Após a intervenção de um delegado de ordem política e social junto ao diretor da "Gazeta do Povo", Acyr Guimarães, a polêmica teve que eliminar as referências diretas à Rússia e ao comunismo, passando a falar da pessoa humana. O tomista Munhoz da Rocha Neto propôs a distinção famosa (de Maritain) entre indivíduo e pessoa. Discutiu-se Filosofia. Foi uma segunda fase da polêmica. xxx Há mais de um ano, quando fomos o primeiro a registrar que o professor Temístocles Linhares preparava esta edição, publicamos o nome do delegado de polícia que interditou a primeira etapa da polêmica: Walfrido Pilotto. Agora, ao sair o livro, na sua introdução, Linhares omitiu o nome de Pilotto ("aparecera uma noite na Redação um delegado de polícia da Ordem Política e Social, para determinar a suspensão da discussão"). Em face desta intervenção policial, "o diretor do jornal, Acyr Guimarães, foi o primeiro a sentir a truculência do ato, ao expô-lo aos seus companheiros de "patrulha", pois o debate despertava o maior interesse nos leitores, comprovado pelo aumento da venda do jornal. Obrigados a acatar a determinação policial de censura, a polêmica precisava continuar, porém, de outra forma e, de acordo com as sugestões apresentadas, decidiu-se tratar do assunto indiretamente, em torno de temas abstratos. Foi então que surgiu a idéia da pessoa humana e suas motivações, sem qualquer referência direta ao comunismo, falando-se então de determinismo, cultura européia e cultura americana, de planificação e de projeto, etc. Foi o que aconteceu, alcançando assim a polêmica o seu segundo estágio". A inteligência driblava a truculência e a censura, como, mais tarde, nos anos da ditadura militar, voltaria a acontecer na imprensa nacional. O episódio, restrito às amarelecidas páginas do arquivo do professor Temístocles, ressurgiu agora num livro que vale no mínimo como documento histórico - embora, infelizmente, falte nos diversos textos, as datas (dia e mês) em que foram publicadas originalmente - embora sabendo-se que toda a polêmica foi travada em 1943, ano em que a II Guerra Mundial alcançava seus pontos maiores e mesmo com a Rússia ao lado dos Aliados, no Brasil (que não havia ainda entrado na Guerra), uma grande simpatia pelos países do Eixo - e um anticomunismo feroz e idiota, ao ponto de impedir que mesmo uma polêmica intelectual, travada na província, preocupasse autoridades policiais. xxx Por certo que Walfrido Pilotto, ao lado de sua longa carreira de advogado e delegado de polícia (chegou a ocupar as mais importantes funções na área), teria muito a dizer se concordasse em gravar uma entrevista para a história. Infelizmente, até agora, alegando motivos pessoais tem se recusado a conceder este depoimento. Por outro lado, Linhares também tem evitado a gravação, alegando que o que teria a dizer já está em sua obra. Que embora caudalosa e importante, não diz de toda a sua importância dentro de nossa vida intelectual e publica. LEGENDA FOTO - Temístocles Linhares: um depoimento que faz falta para a nossa história.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
21/05/1989

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