O bom discípulo
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 27 de novembro de 1977
Alfred Hitchcook, 78 anos, 56 de cinema, pode descansar tranqüilo, embora, demonstrando extraordinária vitalidade, continue em ação: já há um substituto (quase) à altura para seu gênero favorito - o suspense. Chama-se Brian De Palma, tem pouco mais de trinta anos, e desde que fez uma versão musical - pop de "O Fantasma da Ópera", vem crescendo tanto em termos de bilheteria como reconhecimento crítico. De Palma curte Hitchcook adoidado. Tanto é que em "Trágica Obsessão" (Cine Astor, 5 sessões diárias) não dispensou sequer a colaboração musical de Bernard Hermann (1916-1975), o compositor de trilhas sonoras preferido por Orson Welles e Hitchcook. E mais: deliberadamente, o roteiro de Brian De Palma e Paul Schrader lembra um dos clássicos do velho Hitch, para muitos o seu melhor filme: "Um Corpo Que Cai" (Vertigo, 1958).
Como Hitchcook, Brian De Palma é um cineasta extremamente caprichoso. Cada (seqüência( de "Obsession" é pensada, planejada, desenhada. Um requinte que somado a competência de Vilmos Szigmond, sem dúvida hoje o melhor fotógrafo do cinema internacional, tornam as imagens deste filme um espetáculo a parte. Quase que cenas, que, tomadas independentes, poderiam ser colocadas num salão de exposições. Um filme nervoso - e nisso a trilha de Hermann funciona maravilhosamente bem, da "Valse Lente", na abertura, aos momentos mais trágicos. Como todo filme de suspense, o final é o fundamental. E, talvez aí - como em "Carrie, a Estranha" (onde Palma já mostrava boa segurança técnica) - é que o diretor comete um pequeno pecado; naquela fita, era a brincadeira boba, apenas para "dar aquele susto" no espectador. Agora, o final feliz, artificial. A tragédia grega que o espectador imagina que vá ocorrer nos últimos 60 segundos de projeção seria brutal, sem dúvida, mas daria muito maior dimensão ao filme. Enfim, ninguém é prefeito e assim como o velho Hitch, durante tantos anos, procurou "happy end" para seus thrillings, natural que o bom discípulo também não queira decepcionar o público classe média, que depois de sustos e especulações visuais, também quer ir para casa tranqüilo, vendo que tudo acabou bem. Cliff Robertson, ex-galã que poucas vezes teve chances à altura de seu talento - e que quando as teve, mostrou que não dorme em serviço (em 1968, Oscar de melhor ator por "Charlie/Os Dois Mundos de Charlie", de Ralph Nelson) está seguro, e admirável, enquanto Geneviève Bujold não só enfeita a tela, como é boa atriz. "Tragica Obsessão" é um filme que pode ser visto. É um Hitchcook revisitado, bem melhor do que as últimas fitas que o velho mestre inglês anda fazendo. Afinal, encontrou um discípulo talentoso.
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