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Aramis

O samba de João e o violão de Baden

No sábado, em sua única apresentação em Curitiba dentro do Projeto Brasileirinho (Teatro da Esquina/SESC), o sambista João Nogueira teve uma alegria especial: na lotada platéia, seus amigos Baden Powell e a esposa Silvia. Antes de ir para o "505", encerrar a temporada que ali fez, o nosso maior violonista fez questão de prestigiar o show do amigo - que na noite anterior estava entre os mais entusiásticos espectadores no clube noturno das Mercês. Encerrando uma temporada de 32 espetáculos em 17 cidades, nas quais foi visto por mais de 80 mil espectadores, João Nogueira veio a Curitiba, com um show agradável e temática identificada as raízes negras - a partir do título "Rei Senhor, Rei Zumbi, Rei Nagô, Rei Mulato", apesar de não se prender, no repertório, apenas a esta linha. Com um conjunto no qual estão ao menos três grandes instrumentistas - Mané do Cavaco, Milton Banana (temporariamente apenas na percussão, já que problemas de saúde o afastaram da bateria) e o tecladista José Roberto Bertrami, do conjunto Azymuth - mas que, amigo pessoal de João Nogueira, fez questão de acompanhá-lo nesta tournée. Ferrenho defensor da nossa música popular, idealizador, fundador e residente do Clube do Samba, João Nogueira voltou a gravar, desta vez pelo independente Idéia Livre de Aluízio Falcão (ex-Marcos Pereira, ex-Estúdio Eldorado), com distribuição pela Polygram - que também - está lançando outro excelente compositor-intérprete, Carlinhos Vergueiro (ver registro nesta mesma página). xxx Nas três apresentações que fez no "505" - encerrando o calendário artístico deste ao piano-bar que vem se preocupando em programar bons shows artísticos, Baden Powell, mostrou estar na melhor forma. Com seu violão Yamaha - um modelo fora de série, fabricado especialmente para ele por um luthier japonês apaixonado por sua musicalidade - Baden fez mais do que um simples show recital: desenvolveu, no espaço de 70 minutos, uma verdadeira antologia de nossa melhor música, com colocações originais a partir de choros como "Primeiro Amor" de Patapio Silva (1881-1907) a suas parcerias com Vinicius de Moraes, lembrando com estórias deliciosas. Vivendo novamente no Brasil há pouco mais de um ano, pouco saindo de sua casa na Barra da Tijuca, Baden continua a produzir músicas do mais alto nível - embora permaneçam inéditas em sua grande parte. Sua última gravação foi um elepê com valsas brasileiras, produzido por seu amigo Aluízio Falcão, originalmente destinado a ser lançado como brinde-de-fim-de-ano de uma grande empresa mas que, inteligentemente, o produtor reservou para si o selo - embora ainda sem data de ser colocado no mercado. Afastado da bebida - (hoje um grande consumidor de água mineral), sempre ao lado da grande companheira e apaixonada manager, Silvinha, mãe de seus dois filhos, Philipe e Paulo, nascidos em Paris, quando ali moravam, Baden trocou uma estabilidade econômica em Baden-Baden, onde residia, na República Federal da Alemanha, para retornar ao Brasil - "com um mercado mais difícil e uma casa que precisa ser arrumada", como diz, bem humorado, a respeito dos tempos bicudos que aproveitamos. Mas é que Baden Powell D'Aquino, fluminense do distrito de Varre-e-Sai, Município de Itaperuna, 51 anos - completados no dia 6 de agosto, é um brasileiro para quem a glória, os dólares e o sucesso internacional não se comparam a vivência do Brasil, "com todos os seus problemas". São 44 anos de estrada musical - desde que seu pai o levou a Rádio Nacional, ali conhecendo o mestre Meira (Jaime Tomas Florence, 1909-1982) seu grande professor de violão, iniciando uma carreira que o faria, ainda garoto de calças curtas, com a troupe de Renato Murce, vir pela primeira vez a Curitiba - memória que sempre recorda com alegria. Homem de opiniões sinceras, pessimista com a falta de criatividade e de novos talentos, Baden abre uma exceção quando fala em Rafael Rebello, 27 anos, como ele, também discípulo de meira: - Este menino, sim, é a grande presença do violão brasileiro!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
06/12/1988

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