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Aramis

O som blues chegou ao Brasil

O som está blues, bicho! Na linguagem característica dos músicos, mais do que nunca a múltipla e densa palavra "blues" - em seus inúmeros significados - adquire uma conotação especial. Das mais dolentes canções do amor sofrido - uma que poderia aproximar a ideologia do blue até o tango argentino - as mirabolantes potencialidades instrumentais, em guitarristas iluminados que parecem ter trocado a alma pela genialidade nas cordas - conforme a lenda que cerca Robert Johnson (Mississipi, 1913 - Texas, 1937), e que Walter Hill contou no cinema ("A Encruzilhada", 1986) - o blues, finalmente, chegou ao Brasil. O sucesso do Blues Festival, que cresceu tanto, que teve que deixar o Interior paulista para ser absorvido pela megalópolis - ramificando-se em dezenas de temporadas de bluesmen mais ou menos famosos, com uma produção fonográfica sendo colocada nas lojas, especialmente por etiquetas como a Eldorado, as pequenas Black & White, Bradisc, Movieplay e Imagem - e, eventualmente, em produções mais amplas, multinacionais como a WEA, CBS e Polygram. A Videofilmes, dos irmãos Moreira Sales, ao realizar a série para televisão "América", acabaram se entusiasmando tanto com o segmento musical no delta do Mississipi, Chicago, etc., que produziram um vídeo à parte, "Blues", direção de João Moreira Salles, fotografia do mestre Walter Carvalho e cuja trilha sonora em elepê foi lançada por uma nova etiqueta, a Chorus ("Blues Pain Created to..."). Um documento valioso, justamente por trazer quatorze bluesmen notáveis, mas que não estão entre os objetos de consumo internacionalizados. Mais ou menos seria como fazer um documentário sobre samba, mostrando compositores e intérpretes que permanecem à margem do processo de consumo. Pelas imagens do vídeo "Blues" - e podendo ser ouvidos neste belo elepê - desfilam as vozes negras, fortes e sofridas de Honeyboy Edwards, Big Jack Johnson, Sunyland Slim, Jessie Mae Hemphil, Eugene Powell, Wade Walton, Louis Myers, Bonne Lee, James Son Thomas, Jack Owens, Sam Carr, Willie Dixon, Johnny Billington e dos bateristas Kansas City Red e Lester Davenport. O Blues no Consumo - Embora o blues, em suas raízes puramente jazzísticas, seja curtido por quem acompanha a música negra americana, desde seus tempos heróicos - e as grandes jazz singers sejam também identificadas como cantoras de blues (pela conotação de tristeza introspectiva de suas vozes), o blues, a partir de sua absorção por músicos dos anos 60, de formação no rock, tende a se tornar híbrido e consumido muitas vezes erroneamente. Todo um tratado da genealogia do blues + rock + fussion poderia se estabelecer - mas isto é matéria para ensaios que aqui não cabem. Entretanto, no roteiro das grandes discoteques, alguns bluesmen começaram a se tornar figurinhas conhecidas, carimbando-se ao gosto dos jovens e chegando, assim, a uma faixa maior de consumo. Isto explica o crescimento do mercado para artistas, especialmente guitarristas-cantores, do universo pop, sejam artistas negros, na faixa dos 50/80 anos, ou os brancos, identificados a esta corrente, como o jovem Albert Hammond, cuja presença acontece em Curitiba na danceteria Aeroanta. Em 1968, Hammond surgia com "Little Arrow", logo seguido de outro êxito, "Gimmy Dat Ding". A escalada prosseguiria com "Freedom Come, Freedom Go" (1970), "The Air That I Breath" (1974), "When I Need You" (1977) e, com o tema "Nothing Gonna Stop Us Now" da trilha do filme "Mannequim", entraria entre os "top five" da temporada de 1987. Em 1988, Whitney Houston gravou sua composição "One Moment in Time", catapultada como canção nos Jogos Olímpicos e no mesmo ano Aretha Franklin e Elton John, em duo, gravaram outra de suas músicas "Through the Storm". Com uma carreira pontilhada de trabalhos com grupos (como The Moody Blues, Loggins and Messina, Ten Years After, etc.), Albert Hammond trabalha numa linha sonora bem mais asséptica sonoramente que os bluemen tradicionais, mas com uma grande vitalidade como mostra ao longo das composições reunidas em "Best of Me" (CBS). Uma Sanfona no Blues - Uma curiosidade para tirar o complexo de quem gosta do forró e se envergonha de admitir: o disco "Where There's Smoke, There's Fire" (Island / Polygram), mostra Stanley Buckheat Dural Jr., acordeonista e vocalista de Louisiana e a banda Zydeco, que dá nome também a um ritmo mesclado de rhythm & blues e cajun (mistura de música negra e francesa, característica do som da Louisiana). Primeiro disco de Buckheat a chegar ao Brasil, traz um artista já com mais de 30 anos de carreira e há quatro anos, quando gravou "On a Night Like This", foi destacado como um dos melhores do ano pela crítica do "New York Times". Conta Castilho de Andrade, que o Zydeco é um estilo musical que agrada a quem gosta de blues, rhythm & blues, soul e rockability. Mas "nada tem a ver com a música pop e suas variações". Mostrando as características rítmicas do trabalho de Buckheat, este interessante álbum - já nas lojas há vários meses - e que pode até ser encontrado em balcões de ofertas - mostra as possibilidades de um acordeon quando executado com criatividade - como mestres brasileiros (Gonzagão, Dominguinhos, Borghetinho, etc.) sabem fazer. LEGENDA FOTO - Stanley Dural Jr.: um acordeon no blues.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
24/03/1991

por favor onde posso encontrar o documentario
"BLUES" pain created to heal pain de João moreira salles exibido em 1990 pela tv Manchete
ja procurei muito mas sem sucesso
obrigado Umberto

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