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Aramis

Patriamada, salve, salve ! ( ufanismo ou oportunismo ? )

Durante o XII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado, em abril do ano passado, a diretora Tizuki Yamazaki, embora integrado o júri oficial, pediu uma discreta "licença" e gazeteou no dia 10.Fez uma rápida viagem ao Rio de Janeiro, voltando no dia seguinte. Por uma razão justificável : estava rodando cenas dos acontecimentos politicos que mobilizavam o Brasil em favor das eleições diretas à presidência da República e o comício da Candelária,no Rio de Janeiro, não poderia deixar de ser documentado. Ao retornar a Gramado, Tizuki falava, emocionada, com entusiasmo,do histórico comício.O clima no Festival era também politico e antes mesmo da projeção de " Jango ", o documentário de Silvio Tendler, houve uma passeata pelas tranquilas ruas da cidade serrana em favor das diretas já. No final, apesar de todos os elogios e emoção que passou ao público " Jango " acabou recebendo apenas uma premiação especial,enquanto que " O Baiano Fantasma ", do Denoy de Oliveira ( que estréia agora no cine Groff ) era escolhido o melhor filme, recebendo ainda os troféus de melhor ator ( José Dumont ) e direção. Este ano, Tizuki voltou a Gramado. Não mais como jurada, mas, sim como concorrente : seu " Patriamada ", que havia sido lançado no Rio e São Paulo, na primeira semanade março,concorreu no festival. E apesar do nível sofrivel da maioria dos filmes que participaram este ano do evento de Gramado, o filme de Tizuki só ficou com um solitário Kikito: melhor som, atribuido a dupla Romeu Quito Jr. e Licio Marcos de Oliveira. OPORTUNISMO - A partir da próxima quinta-feira,18, o público curitibano poderá conhecer "Patriamada" ( Cine São João, 4 sessões ) e ter o seu proprio jugamento sobre este filme que pretende ser um grande painel dos acontecimento politicos dos últimos meses. Uma mistura de realidade com ficção, processo que não é novidade em cinema, mas que chega ao cinema brasileiro num momento de efervescência do País. Talves a doença do presidente Tancredo Neves tenha envelhecido precocemente ao filme de Tizuki - assim como ao documentário " Muda Brasil ", de Osvaldo Caldeira - já exibido ( sem sucesso ) no cinema Groff, há duas semanas, " Jango ", ao ser projetado no cine Embaixador, em Gramado, no ano passado, emocionou o público, provocou lágrimas de muitos espectadores e justificou aplausos ao final " Patriamada ", ao contrário, foi visto por uma platéia silenciosa, que praticamente não se manifestou. Talvez por indiferença, talvez pela angústia de saber o presidente Tancredo Neves - forte e vigoroso nas imagens, gravemente doente naquela semana ( 25 a 31 de março ). O fato é que " Patriamada " não estabeleceu a empatia que se poderia esperar - ao contrário do documentário de Silvio Tendler,ou, especialmente, ao maravilhoso " Cabra Marcado Para Morrer ", de Eduardo Coutinho - premiado no FestRio e escolhido para encerrar o Festival, sábado 31. Mulher inteligente e ardilosa, que se sabe promover seus filmes, Tizuki Yamazaki participou ativamente do festival. Interviu nas três reuniões em que se debateu o futuro do cinema brasileiro na televisão, expôs pontos de vistas bastantes radicais em ralação a critica cinematografica no debate coordenado pelo jornalista Claúdio Bojunga editor da revista " Filme e Cultura " e, em várias oportunista e sem consistência. BRASIL - 84 /85 - " Patriamada " entusiasma a primeira vista. Afinal, não poderia ser mais up to date em seu tema: Débora Bloch é uma repórter petista, Buza Ferraz um cineasta independente, pai solteiro e, naturalmente, sem dinheiro para fazer o filme que pretende e Walmor Chagas ( no papel que Antonio Fagundes não pode fazer ) é um insdústrial progressista e liberal - personagem claramente inspirado no empresário Antônio Erminio de Moraes.Mas a grande atração é o elenco coadjuvante, "que nenhuma produção profissional poderia reunir " como acentuou Edmar Pereira, do " Jornal da Tarde ". Gente como o presidente Figueiredo, o presidente eleito Tancredo Neves, o candidato derrotado Paulo Salim Maluf, Leonel Brizola, Franco Montoro, Dante de Oliveira, Sobral Pinto, Ulisses Guimarães, entre muitos outros. Segundo Edmar, " um registro politico, mas não um filme comprometido com qualquer partid, embora ele respire a mesma ansiedade por novos e mais arejados tempos comum a praticamente toda a população do Pais ". Tizuki Yamazaki nos dizia em Gramado: - " Sei que os tancredistas radicais não gostam do filme porque o acham pouco tancredista e os petistas radicais também não,porque acham que ficou tancredista demais. Também os jornalistas não gostam de se identificar com a personagem Lina ( Débora Bloch ) ou os cineastas não aceitam também o personagem Goiás.Mas cada um, propositalmente, tem a sua personalidade ". O filme foi realizado com um orçamento relativamente reduzido ( especialmente se comparado aos dois primeiros de Tizuki : "Gaijim" e " Parahyba Mulher Macho " - Cr$ 420 milhões, mais Cr$ 250 milhões de lançamento - bancada pela imensa, fabrica de Jeans associada a produção. O roteiro - em parceria com Alcione Araújo foi desenvolvido aos poucos, na proporção que os fatos aconteciam no ano passado. Explica a cineasta : - " A gente começou o filme no maior entusiasmo com o negócio das eleições diretas, o povo na rua. Aí chegou a derrota da emenda de Dante de Oliveira. " O que a gente vai fazer do filme agora ?", nos perguntávamos . Eu já tinha a estrutura dos três personagens, que era a vida pessoal deles. O que conduzia a história era o que estava na cabeça de cada um sobre os acontecimentos políticos, se trancredava, não trancredava, malufava ou era pelas diretas.Tinha a menina que era do PT e era uma coisa a se desenvolver. Esse desenvolvimento, junto com o nosso, era também o que eu estava pensando,o que toda a equipe pensava, Chegamos a pensar em parar: a vitória do Maluf estava ficando meio concreta e deu um medo incrível na gente, um branco ". Felizmente o projeto não foi paralisado. Ao contrário não foi se desenvolvendo quase como um documentário. Com muitas seqüências feitas em Brasilia - como o presidente Figueiredo cumprimentando a Walmor Chagas, por exemplo, na rampa do Palácio Alvorada. Diz Tizuki a respeito : - " Valeu a ida a Brasilia,por que essa é a brincadeira de cinema que pega e dá uma veracidade para a personagem de ficção.Pegar um cara para fazer o personagem do presidente não teria graça nenhuma". UFANISMO - " Patriamada " pretende resgatar o ufanismo, o " porque me orgulho do meu País " - no sentido de Esperança - transmitido numa Nova República. Entretanto não é uma adesão total - e para isto há insistentes diálogos e monólogos, especialmente da reórter Lina, questionando a eleição de Tancredo, " como a única opção ". Há um belo momento emocionante : após a derrota da emenda Danta Oliveira, que restabeleceria as eleições diretas, o Congresso vazio - ouve-se apenas o Hino Nacional, a capella, na voz de Olivia Byghton, sem favor e uma das mais afinadas cantoras brasileiras. Tizuki explica este seu sentido de urbanismo: - " Agora precisamos recuperar o amor à Pátria, perdido nesses 20 anos. Não é preciso que inventem slongans para isso. O Brasileiro tem direito a esse amor, mas ele tem que nascer com o povo sendo rspeitado. Tentei mostrar a perplexidade que há entre o País e o futuro. Não sabemos nada sobre ele, somos frustados diariamente. Eu fiz "Patriamada" pensando em emocionar as pessoas ao perceberem a possibilidade do Patriotismo. É por isso que o Hino Nacional foi incluido na trilha sonora, cantado com amor e não por obrigação. E ai percebemos o quanto é bonito o Hino quando não é cantado apenas por obrigação, mas por amor". " Patriamada" pode resistir ao tempo ? - perguntamos a Tizuki. - Não sei. Não tenho a menor idéia ! Um filme up to date, um documentário com ficção - e que talvez por este imediatismo não tenha a emoção de filmes como " Jango " ou " Cabra Marcado para Morrer " - nos quais o passar dos anos acrescentou maior validade as imagens. A estória de amor entre Rocha Queiroz ( Walmor Chagas ) e Lina ( Debora Bloch ), dividida também com a " amizade colorida " ao cineasta Goiás ( Buza Ferraz ) mais prejudica do que acrescenta ao filme. Lilian Lemertz, como a esposa frustrada do industrial e Ewerson de Castro, como seu filho malufista, são personagens que não possuem sinceridade. Há inclusões apenas representativas de amigos da cineasta - como do clarinetista Paulo Moura ou de Cosme Alves, conservador da Cinemateca do MAM. Enfim, "Patriamada" pretendia ser muito e acaba sendo pouco em seu resultado final. Mas não deixa de representar uma experiência interessante a uma cineasta que em cinco anos conseguiu se destacar como uma das mais fortes presenças do cinema brasileiro: a saga da colonização japonesa em " Gaijim " - Os Caminhos da Liberdade ( o grande premiado no Festival de Gramado, 1980), a feminista valorização da personagem Ancriz em "Parahyba Mulher Macho" (1983 ) e. agora, uma tentativa de fazer um cinema politico, em cima do lance, misturando ficção e realidade. Ao sair do cinema, o espectador tem a sensação : " mas tudo isto eu estou vivendo : Só faltou a doença do Tancredo! " Há um gosto de " Globo Repórter " nas imagens - e para o Exterior, Tizuki vai acrescentar uma legenda final - informando da vitória de Tancredo no Colégio eleitoral a 15 de janeiro - dado que não consta do filme. E, esperamos, que neste texto, também possa constar : "... e após uma enfermidade algumas semanas, Tancredo Neves finalmente assumiu a Presidência do Brasil". Isto fará com que "Patriamada"tenha, realmente, um final, feliz. LEGENDA FOTO 1 - Débora Bloch e Buza Ferraz, em "Patriamada ". LEGENDA FOTO 2 - Tizuka, 3 filmes, muitas polêmicas em festivais. LEGENDA FOTO 3 - Walmor Chagas e Débora Bloch LEGENDA FOTO 4 - Lula personalidade politica que aparece em " Patriamada ".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Claudio
Up-to-date
14/04/1985

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