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Aramis

Um pouco do Paraná nos cadernos do MIS

Há 17 anos, quando a Fundação Cultural de Curitiba foi criada na primeira administração de Jaime Lerner, uma das primeiras iniciativas foi a edição de uma série de fascículos através da Casa Romário Martins, primeira das unidades voltadas a preservação da história de nossa cidade. A série - que teria uma continuidade marcante - mas sendo desativada na administração de Marés de Souza na Fucucu (e que, agora, apesar do retorno de Lerner, ainda não foi devidamente reativada), foi inaugurada pela criatividade de Valêncio Xavier, múltiplo agitador cultural, com o original "Desembrulhando as Balas Zequinhas", primeira tentativa de pesquisa de um dos aspectos mais curiosos da cultura popular autenticamente curitibana (algum tempo depois, o personagem que marcou várias gerações seria transformado em garoto-propaganda de uma campanha de arrecadação de impostos, produzida pela PAZ, dos premiados Zeno Otto e Nilson Mueller). xxx O tempo passou e a criatividade de Valêncio Xavier continua. Assumindo a direção do Museu da Imagem e do Som há menos de dois anos, está conseguindo desenterrar a "caveira-de-burro" que parece(ia) existir na instituição criada em 1968, graças a bibliotecária Nancy Westphalen Correa, quando diretora da BPP. Driblando a falta de recursos com imaginação, e conseguindo, finalmente, uma sede condigna (e, se espera, definitiva para o Museu, no antigo Palácio do Governo, na Rua Barão do Rio Branco), Valêncio lembrou-se também que uma forma prática, econômica e objetiva de marcar a atuação do MIS-PR seria a edição xerocada de textos referenciais. Ao invés de caras (e dispensáveis) publicações, que comprometem recursos oficiais, a coleção "Cadernos do MIS", com um custo baratíssimo, ágil, com uma circulação dirigida, procura divulgar diferentes aspectos culturais - seja um estudo sobre o tropeirismo (que inaugurou a coleção), depoimentos (Alceu Chichorro, Bento Munhoz da Rocha Neto, Helena Kolody), duas antologias de críticas de cinema ("Ci(S)ne", de Lelio Sotto Maior Jr. e "Filmes Vistos e Anotados", de Francisco Bettega Netto) ou volumes biográficos - como os dedicados ao fotógrafo Rodolfo Guerke e a Tadeu Morozowicz, pioneiro da dança no Paraná, o próximo a ser lançado. Uma das virtudes dos " Cadernos do MIS" está em sua simplicidade. Sem preocupações de oferecer obras definitivas - mas entendendo a importância de se preservar (e registrar) diferentes aspectos de nossa vida cultural, Valêncio tem sabido buscar trabalhos que, normalmente, jamais entusiasmariam empertigados (e incompetentes) consultores editoriais que se agarram as tetas do Estado, mais atrapalhando do que ajudando. Exemplos disto são os volumes "O Caderno de Dona Selmira" - lançado ainda no ano passado - e "O Caderno de Dona Isaura" (número 11, outubro/90, mas ainda não distribuído oficialmente). De anotações modestas, que senhoras idosas fizeram de seu dia-a-dia, sem qualquer preocupação de ordem literária, Valêncio Xavier, com sua sensibilidade de homem de comunicação - mais de 25 (de seus 53) anos na televisão, escritor, cineasta, etc. - soube ver a beleza e importância de depoimentos da maior importância. Tanto "O Caderno de Dona Selmira" como, agora, "O Caderno de Dona Isaura", são textos simples, que justamente encantam pela espontaneidade com que suas autoras, mulheres, mães e esposas que, vivendo num Paraná de outra época, souberam fazer em apontamentos que se perderiam se não fosse a iniciativa de Xavier. "O Caderno de Dona Isaura" deverá ter seu lançamento na cidade da Lapa, cidade em que nasceu e viveu toda sua vida a Sra. Isaura Borges Abrift (11-07-1903/31-12-1989). Filha de Joaquim Borges da Silveira, carroceira de profissão e que marcou a memória de velhos lapeanos, Isaura casou com o comerciante Ladislau Abrift (1893-1987) e teve cinco filhos, que lhe deram 13 netos e 16 bisnetos. Falando de seus antepassados, dos tipos inesquecíveis que marcaram sua vida, do dia-a-dia, as anotações de Dona Isaura tem o sabor memorialístico tão delicioso - de uma cidade que teve a felicidade de ter outros escritores, como os irmãos Teresa e Francisco Brito de Lacerda, para citar apenas dois exemplos. Falecida no último dia do ano passado, dona Isaura viveu a alegria de ver ao menos as provas deste seu "Cadernos", que agora, com uma tiragem de mil exemplares, será lançado com o prefeito Sérgio Leone, da Lapa - cidade que ganha, assim mais uma contribuição a sua memória humana. xxx Assim, com a publicação do "O Caderno de Dona Isaura", o MIS dá prosseguimento a um projeto de abrir espaço editorial a trabalhos simples e originais, capazes de enriquecerem o referencial memorialístico do Paraná. Quem tiver textos relacionados a alguma área que justifique sua publicação, pode procurar o MIS, pois, como diz Valêncio Xavier, "vamos editar, mais e mais, para que não se perca pela falta de publicações as estórias deste Paraná".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
04/04/1990

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