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Aramis

Alô, jovens apaixonados, escutem o jovial Sinatra

"The old blue eyes" não está de volta. Aos 72 anos - completados no dia 12 de dezembro último - o velho Frank Sinatra não anunciou nova aposentadoria - como aquela que fez, bombasticamente, em 13 de junho de 1971 (1), quando sofria no auge da campanha em relação às suas ligações com a Máfia - mas para sair de seu latifúndio na Califórnia, para novas excursões, há que ter muitos - mas muitos mesmo - milhões de dólares na jogada. Seu último álbum - "L. A. Is my Lady" saiu há 5 anos e mesmo o projeto de fazê-lo interpretar um personagem gay na transposição musical de "A Gaiola das Loucas" (2) por US$ 10 milhões não o atraiu. Mas o mito Sinatra continua hoje tão forte quanto há 45 anos, quando no final do ano, o Paramount Theater, em Nova Iorque, assistiu à maior demonstração de fanatismo, com o magríssimo Frank sendo caçado por milhares de fãs que desejavam ardentemente tocar em sua pessoa - nascendo as chamadas "Sintrance", "Swoonheart" ou "Sinatratating", conforme registro no "New York Times" na época. Um fenômeno que só se repetiria - e assim mesmo em proporções diferentes, em 1956, com Elvis Presley no auge de sua carreira e com os Beatles em 1964. Quase meio século depois de seu início de carreira, Sinatra continua a ser o maior nome do "show business". O fato de não ter gravado novos discos e se ausentado das telas desde "O Primeiro Pecado Mortal" (3), não diminui o interesse de milhões de pessoas por sua vida e obra. Se uma jornalista americana, Kitty Kelley, fez um cruel livro procurando levantar apenas os lados negativos de sua complicada vida pessoal e profissional ("His Way", edição brasileira da Record, 560 páginas, Cz$ 800,00), há em compensação, centenas de pesquisadores apaixonados por sua obra - remexendo arquivos, coletando dados, levantando discografias. Por exemplo, o jazzófilo milionário Caetano Cerqueira Rodrigues, 53 anos, vice-presidente do Blue Note Jazz Club, encontra-se há três semanas em Nova Iorque, percorrendo lojas para adquirir toda a sua discografia em laser - além de complementar sua coleção do que há disponível em elepês. O carioca Luís Carlos do Nascimento Silva, bancário aposentado, tem viajado anualmente para Nova Iorque para pesquisar na sede da CBS a discografia de Sinatra, num trabalho que só encontra paralelo com o que desenvolveu um inglês, cirurgião-dentista em Londres e que já publicou três volumes com detalhes de tudo o que Sinatra gravou - ou quase foi gravado, de forma pirata, em quase meio século no qual vem encantando bilhões de pessoas em todo o mundo. Afinal, a discografia de Sinatra é tão ampla e espalhada que mesmo os mais apaixonados "sinatreanos" não podem se dar ao luxo de afirmar que possuem o integral de sua obra. "Integral, nem o próprio Sinatra conhece", diz um de seus maiores fãs, o arquiteto Roberto Fontan, 48 anos - que em sua adolescência, no início dos anos 60, utilizava sua magreza para reforçar uma semelhança com Sinatra - de quem conhecia, na época, todo o repertório - e com isso encantava a "jeunese dorée" da tranqüila Curitiba de 25 anos passados. Alô Jovens Apaixonados! - A obra mais "oficial" de Sinatra - ou seja, os longos períodos em que esteve contratado da CBS, depois na Capitol e, finalmente, com sua própria gravadora, a Reprise Records (hoje pertencente ao grupo Warner), vem aparecendo nos últimos dois anos em edições compact disc. Geralmente em coleções sofisticadas, caríssimas, como "The Columbia Years" (The Voice, 1943-1952), produzida por James Isaacs e Joe McEwen, com um precioso trabalho de restauração sonora de Frank Abbey, e que, no final de 1986, saiu em quatro discos laser, numa caixa - e que ao preço de Cz$ 20 a Cz$ 23 mil é possível encomendar no "Museu do Disco" (São Paulo) ou "Modern Sound" (Rio de Janeiro). Mas como gastar cinco salários mínimos para comprar quatro discos laser de Sinatra é privilégio para milionários, a CBS brasileira graças ao bom gosto de Maurício Quadrio, diretor de projetos especiais, dá uma chance aos fãs de Sinatra que não são tão sofisticados: saiu há uma semana o álbum duplo: "Frank Sinatra / Hello Young Lovers" (preço entre Cz$ 700,00 a Cz$ 900,00), com 25 jóias pescadas de gravações feitas entre 7 de junho de 1943 ("You'll Never Know", Gordon / Warren) a 3 de junho de 1952 ("Azurette / Paris Blues", de Wolf Davis). Síntese dos quatro compact disc da coleção "The Columbia Years", que com 53 faixas não trouxe obviamente, todo o longo período em que Sinatra foi contratado da CBS, nos dois volumes deste "Hello Young Lovers" encontramos uma mostra representativa daquela fase que, para muitos, foi a melhor de Sinatra, em termos canoros. Assim, em 27 de agosto de 1945, com arranjos e regências de Alex Stordahl, Sinatra gravava "I Only Have Eyes for You" (Warren / Dubin), um clássico que ficaria na história da música como "That Old Black Magic" (Harold Arlen / Johnny Mercer), gravado um ano depois, em 10 de março de 1946, também com regência de Axel Stordahl - o maestro que o acompanhou em sua fase na Columbia (só posteriormente, Nelson Riddle, Billie May e Dom Costa viriam a cuidar de seus discos). De 1947, temos nada menos que seis faixas privilegiadíssimas: "I Concentrate on You" (Cole Porter); "We Just Couldn't Say Goodbye" (Woods); "The Music Stopped" (Adamson / McHugh); "You're my Girl" (Sammy Cahn / Jules Styne); "Almost Like Being in Love" (Lerner / Loewe) e "There but for You Go!" (ambas de Lerner / Loewe). De 1948, apenas uma gravação - mas das mais bonitas: "Falling in Love with Love", da dupla Hart & Rodgers, gravada em 8 de agosto. Cinco anos antes, em Nova Iorque, Sinatra havia feito uma experiência curiosa para a época: o arranjo de Alex Wilder para "Sunday, Monday or Always" (Burke / Van Heusen), dispensou os instrumentistas e lhe deu apenas um "background vocals" de 15 vozes. O detalhamento de cada gravação, com os nomes dos músicos participantes, mostra o esmero que Sinatra sempre teve para trabalhar com bons músicos. Em 1951, um jovem trombonista chamado Ray Connif era um dos "side men" na gravação de "Farewell, Farewell to Love" (Sir Ivo / Wolf), com regência de Harry James. Aliás, nesta época, Sinatra já experimentava uma séria crise - advinda de queda nas vendas de seus discos e, principalmente, grandes conflitos com sua então mulher, a atriz Ava Gardner (4). Mas seria em 2 de março de 1951, mesmo com sua estrela então perdendo o brilho, que Sinatra daria um banho de interpretação na extremamente romântica "Hello Young Lovers", que Richard Rodgers (1902-1979) e Oscar Hammerstein II (1895-1960) haviam composto, em 1945, para o musical "State Fear". O romantismo, naturalmente, marcou sempre o repertório de Sinatra, que sabendo, como raros cantores de todos os tempos, escolher as mais belas canções, as transformava em standards imortais. Assim, no final de 1950 - quando estava sem filmar há meses (5), gravava "I Am Loved", uma jóia de Cole Porter (1891-1964), de quem, em abril do mesmo ano, há havia lançado aquela canção que o mundo aprendeu a identificar em sua voz - "You Do Something to Me". De 1951, ainda, é o registro de outra ótima canção de Rodgers e Hammerstein, "We Kiss in a Shadow" - esta pouco conhecida no Brasil. Lançadas originalmente em 78 rpm (nos anos 40) e, a partir de 1950, com o surgimento do long-play em álbuns como "Songs by Sinatra", "That Old Feeling", "Love is a Kick" e "I've Got a Crush on You", para citar apenas alguns exemplos, as canções desta fase dourada do Sinatra entre os 28 aos 37 anos - conservam o frescor, a emoção e, sobretudo, a competência dos arranjos, dos instrumentistas convocados e, naturalmente, a voz única e perfeita de "The Voice" - um cantor, definitivamente, para todas as estações. Especialmente as do amor - que ele embala há quase meio século para os jovens apaixonados deste planeta chamado Terra. Notas (1) Anunciado como um grande evento, a "despedida" de Sinatra do "show business" foi durante um grande espetáculo no Los Angeles Music Center, em 13 de junho de 1971, com a renda em benefício do Fundo de Amparo ao Cinema e Televisão. Na época, a vida de Sinatra era investigada pelo FBI devido as suas ligações com o crime organizado, e, consta, que esta foi a razão de ter se afastado dos espetáculos. Um afastamento de poucos meses, pois logo depois voltaria com força total. (2) "A Gaiola das Loucas", comédia francesa sobre dois velhos homossexuais, já teve três adaptações ao cinema e estimulou um musical na Broadway, que foi anunciado para ser levado as telas com - vejam só! - Sinatra, num dos papéis. O projeto não se consolidou. (3) Tendo estreado no cinema em 1941 ("Caminho do Pecado / Las Vegas Night", 1941, de Ralph Murphy), quando era apenas o vocalista da orquestra de Tommy Dorsey (1905-1956). Sinatra trabalhou em 56 filmes até 1980, quando interpretou um detetive em "O Primeiro Pecado Mortal" (The First Deadly Sin, de Brian Hutton). Posteriormente, só fez participações especiais (como em "Cannhonbal Row", de seu amigo Burt Reynolds) e alguns trabalhos para a televisão. (4) A primeira esposa de Frank foi sua namorada de infância, do bairro de Hoboken, Nova Iorque, Nancy Barbato, com quem se casou em 4 de fevereiro de 1939. Com ela teve 3 filhos. Sua vida amorosa inclui centenas de mulheres, mas a maior paixão foi a atriz Ava Gardner (Gratbown, North Caroline, 24/12/1922), com quem só viria a casar em 7 de novembro de 1951, quando, finalmente, obteve o divórcio de Nancy, de quem estava separado há anos. O casamento foi tumultuado com grandes crises e terminaria em 1956. Posteriormente, Sinatra casou com Mia Farrow, hoje sra. Woody Allen (19 de julho de 1966 a outubro de 1967) e, finalmente, casou com Barbara Marx, divorciada do comediante Zeppo Marx (1901-1979), em 11 de julho de 1976. (5) O início dos anos 50 foi trágico para Sinatra. Entre 1949 ("Um Dia em Nova Iorque / On the Town", de Gene Kelly e Stanley Donen) a 1953, fez apenas dois filmes menores ("Double Dynamite", de Iring Cummings, nunca exibido no Brasil; "Ao Compasso da Vida / Meet Danny Wilson", de Joseph Pevney, ambos de 1951). Seus discos caíram na vendagem e seu casamento com Ava tinha altos e baixos. Finalmente, conquistou o personagem Maggio, na transposição ao cinema do romance "A um Passo da Eternidade", rodado no Hawaí, em 1953, por Fred Zimmermann, que ganhou o Oscar de melhor coadjuvante e reaprumou sua carreira. Apesar das crises com Ava, foi ela sua grande paixão, tanto é que há um mês, quando a hoje velha senhora, sofreu um enfarte em Londres (onde reside há anos) e viajou para os EUA, Sinatra foi esperá-la no aeroporto, lhe dando a maior assistência.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Nenhum
13
10/02/1988

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