Login do usuário

Aramis

Assim é a Vida

"Povo gosta de luxo. Intelectual é que aprecia miséria". (Joãozinho Trinta, carnavalesco do G.R.E.S. Beija-Flor, Rio de Janeiro) A primeira seqüência é em um moderno hospital. Gillian Fairchild (Julie Andrews), cantora famosa, submete-se a um exame para a verificação se sofre de câncer. O exame é mostrado em detalhes, que podem, no primeiro momento, sugerir um desenvolvimento na linha de cinema-hospital - como esteve em moda há alguns anos. Harvey Fairchild (Jack Lemmon), às vésperas da festa de seu 60º aniversário, está irascível, nervoso. Hipocondríaco crônico, sofre toda série de aborrecimentos. Está com os nervos à flor-da-pele. Reclama por tudo e com todos. Nada o satisfaz. Gillian, sua esposa, não demonstra o drama que vive - 24 horas decisivas para saber os resultados do exame. Ao contrário, segura a barra, é a mulher compreensiva, a mãe dedicada, a grande companheira. A ação de "Assim é a Vida" (Cinema I, 5 sessões) se passa ao longo de pouco mais de 24 horas. Praticamente, o cenário básico é a magnífica mansão dos Fairchild - na realidade a própria casa do diretor Black Edwards. O elenco com ligações familiares: Julie é esposa de Black e estrela de quase todos os seus últimos filmes. Jack Lemmon, também grande amigo de Black, trouxe o filho, Chris Lemmon e a esposa, Felicia Farr, atriz de relativo sucesso nos anos 50 - mas que após de casamento com Jack preferiu abandonar o cinema. O que é uma pena, pois aparecendo apenas em duas seqüências praticamente "rouba" o filme. Como a cigana Madame Carrie, capaz de ter métodos fascinantes para solucionar qualquer dúvida de impotência, é responsável por cenas engraçadíssimas. Tudo em "That's Life" parece funcionar de acordo com que o público aprecia: roteiro inteligente, humor saudável e fascinante, elenco ajustadíssimo, e, especialmente, cenários bonitos. A mansão dos Fairchild é maravilhosa, a costa do Pacífico, nas cercanias de Los Angeles é um ambiente paradisíaco, a mansão que Harvey está construindo para a bilionária Janice Kern (Cynthis Sikes) - e causa de sua primeira crise sexual - não poderia ser localizada num espaço mais belo. A fotografia de Anthony Richmond capta o que há de mais belo na paisagem e nos cenários, e a trilha sonora, de Henry Mancini, naturalmente, é daquelas que ganha cinco estrelas - sem falar na canção-tema que Tony Bennett canta na seqüência final (e que valeu indicação ao Oscar). Comercial? Pode ser. Mas um senhor filme comercial, feito com toda a categoria que uma obra cinematográfica deve ter para conquistar o público. O desenvolvimento da trama - com os problemas paralelos dos personagens coadjuvantes, como a filha Kate Emme Walton), vinda de Nova Iorque, onde estuda saxofone e brigou com seu namorado, Steve Larwin (Rob Kenepper); sua irmã, Megan (Jennifer Edwards - filha do diretor Black) experimenta os problemas do sétimo mês de gravidez e o afastamento do marido, Larry (Matt Lattanzi), mais interessado na atriz Fanny Ward (Dana Sparks), que o seu irmão, Josh (Chris Lemmon), ator de séries de televisão, trouxe para passar a festa de aniversário com a família. Harvey, angustiado com os seus 60 anos, irritado, procura até a Igreja - reencontrando um amigo da juventude, o padre Baragone (Roberto Loggid), em outra das seqüências hilariantes do filme - quando o religioso convida o velho amigo para ler uma passagem da bíblia sobre a fidelidade conjugal. Um filme como "Assim é a Vida" tinha que dar certo pela própria identidade da equipe que o produziu. Lemmon e Edwards, amigos desde 1953, quando começaram, praticamente, sua carreira em Hollywood, fazem "Assim é a Vida" fluir naturalmente. As seqüências se sucedem de forma tão natural e espontânea que o espectador mergulha no universo - propositalmente de fantasia, riquíssimo, distante de qualquer realidade do terceiro mundo (a não ser para uma minoria privilegiada) mas que tem aquela empatia que levava Joãozinho Trinta a justificar, anos atrás, o luxo e a riqueza das fantasias e carros da Beija-Flor. Já premiado duas vezes com o Oscar (melhor coadjuvante, 1955, por "Mister Roberts", de Meryn Leroy; 1973, melhor ator por "Sonhos do Passado / Save the Tiger", de John G. Avildsen), Jack Lemmon demonstra porque, aos 62 anos, é um dos grandes atores do cinema americano. Sua interpretação é perfeita - reconhecida no Festival de Cinema da Bélgica e que, no II FestRio (novembro/1986), na qual "That's Life" concorreu pelos EUA, também quase lhe valeu o prêmio maior. Só o preconceito contra o fato de ser um filme comercial, pode ter feito com que a Gaivota de melhor ator não fosse pousar em suas mãos. Por certo, há inúmeros filmes mais importantes do que "Assim é a Vida". Entretanto, dificilmente, se encontra uma comédia tão agradável, suave e enternecedora como esta - discutindo, justamente com humor, um tema que chega a todos: a velhice. LEGENDA FOTO - Jack Lemmon e Julie Andrews: "Assim é a Vida" (Cinema I), uma comédia excelente.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
27/09/1987

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br