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Aramis

Caminhos da luz com reis Magos

Uma das preocupações dos cineastas Italianos de esquerda sempre foi a de colocar o povo como personagens importantes nos seus filmes. Acima de heróis - e como já dizia Bertolt Brecht, pobre do Pais que deles necessita - encontra-se numa filmografia política vários exemplos em que o povo, esta massa não identificada e nem sempre corretamente analisada, surge como condutor da história. Sem as filiações comunistas de um arístocrata como Luchino Visconti, um rebeldde como Bernardo Bertolucci ou um angustiado como Pier Paolo Passolini, Ermano Olmi, 54 anos, a presença do povo em seus filmes, a maioria desconhecida no Brasil - mas que se tornou admirado e respeitado por uma obra-prima. "A Árvore dos Tamanco", reprísado ainda há pouco mais de um mês numa das sessões corujas do Groff. E é Ermano Olmi, com sua visão social, um artista que - a exemplo do que Passolini (1922 - 1975), havia feito há 27 anos, em "O Evangelho Segundo São Mateus" ( II Vangello Segundo Matteo, 1964), busca intérpretes não profissionais. Assim havia feito em "A Árvore dos Tamancos"- com resultados extraordinários (aliásVittorio De Sicca, em 1948, já havia proposto esta experiência no antológico "Ladrões de Bicicletas" e o repete neste lírico e suave "Caminha, Caminha" (cine Ritz, em sessões às 14h30mim, 17, 19h30 e 22 horas). Produzido pela RAI, para ser apresentado como minisérie na televisão italiana, "Caminna, Caminna"[Caminha, Caminha] sofre a redução de uma metragem de seis horas para a projeção de 130 minutos. Personagens importantes ficam em sua ação truncada , certos elementos da estória tornam-se e muitas sequências parecem perdidas. Entretanto, nada invalida a beleza das imagens, a semsibilidade com que Olmi reconta uma das mais belas histórias bíblicas: a peregrinação dos Reis Magos a Belém para reverenciar ao nascimento de Cristo. Curiosamente, na ampla produção cinematográfica inspirada nas histórias bíblicas (e que teve, especialmente no cinema americano, um dos mais férteis ciclos) nunca houve, ao que tenhamos conhecimento, nenhuma preocupação em focar figuras de Balthazar, Melchior e Gaspar - os reis que seguindo a Estrela de Belém - (e que os astrônomos afirmam ter sido o Cometa Halley), chegaram ao humilde estábulo, onde o Menino Jesus estava a 6 de janeiro de ao I da era Cristã. Ermano Olmi, ao realizar "Caminna, Caminna" [Caminha, Caminha] procurou despojar o tema de todo aspecto grandiloquente. Assim, não há nada de grandioso na caravana dos Reis, mas, ao contrário, uma preocupação em valorizar os personagens simples - pastores, soldados, mulheres e crianças - e em cenários áridos, longe da imagem de riqueza que certas versões biblicas fazem pensar. Um filme como este "Caminha , Caminha"chega devagar junto ao espectador. Os diálogos - traduzidos, aliás, com muitas referências de gíria - perdem um pouco da beleza, da poesia original, mas são significativos dentro da conduta de uma estória eterna que, ao longo de dois mil anos, é sempre recontada com amor e emoção. Apesar de identificar alguns intérpretes - todos, evidentemente, desconhecidos (Alberto Fumagalli, Antônio Cucciaro, Eligio Montellacio, Campoalo Lombardini, Lucia Peccianti, Vittorino Tricianelli), basicamente foram trabalahados com pessoa simples, entre os moradores da localidade de Volterano, em cuja região a maioria dos Exteriores foram rodadas ( eo filme é basicamente constituido de cenas externas). A trilha sonora de Bruno Nicolai tem um encanto religioso nas poucas intervenções de vozes, mas é a fonografia que cápta a emoção e a beleza. Basicamente um filme introspectivo, com muitas sequências noturnas, "Caminha, Caminha" tem um lançamento apropiadíssimo neste final de ano, mostrando a sensibilidade de Francisco Alves dos Santos, ex-seminarista, coordenador da área de cinema da Fundação Cultural - que, independente dos resultados financeiros desta primeira semana, até o filme em exibição, se possível, até o Dia dos Reis. Importado por F.J. Lucas, sem qualquer material promocional (as fotos e cartazes, precarissimos, são italianos), "Caminna, Caminna" [Caminha, Caminha] teve até agora poucas exibições no Brasil. Curitiba é uma das primeiras cidades a receber este filme espiritual, suave e bonito - que soa como um presente de Natal dentro da programação cinematográfica.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
26/12/1985

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