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Aramis

Cantoras

As mulheres chegaram. Definitivamente. Chegaram e vão ficar, cada vez mais presentes na música brasileira. Os espaços dedicados a MPB já podem guardar centimetros exclusivos para o (outrora) chamado sexo fragil, hoje, ao menos em presença vocal, cada vez mais independente e presente. No amplo sentido da palavra. Enquanto não sai o novo álbum de Maria Bethania, que renovou com a Polygram e ao lado de Gal (Costa) e Fafá (de Belém) constitui um tripé feminino que garante amplo faturamento, a RCA lembrou-se do óbvio. Em 1965/6, logo após chegar de salvador, para substituir a Nara Leão no Show "Opinião" (ao lado de Zé Ketti/João do Valle), Maria Bethania, a exemplo de outros jovens baianos (Caetano, Gil, etc) foi contratada daquela fábrica, fazendo além de compactos, dois elepes, um dos quais interpretando exclusivamente músicas de Noel Rosa Na época, o grande sucesso de Bathania era "Carcará", que pegava, matava e comia... O elepe reúne faixas dos dois lps de Bethania na RCA e de alguns compactos avulsos, lançados entre junho/dezembro/66. Reaparecendo 15 anos depois, num álbum de capa dupla, com excelente texto de Sílvio Lancelotti, valem como importante documento para os inúmeros fàs de Bethania. Que canta músicas do mano Caetano ("De manhã", "Sol Negro"), Caymmi ("Nunca Mais"), Carlos Lyra/Gianfrancisco Guarnieri ("Missa Agrária"), Edu/Guarnieri ("Eu Vivo Num Tempo de Guerra"), Gil/José Carlos Capinam ("Viramundo" as três dos musicais "Arena Conta Zumbi" e "Arena Conta Bahia"), Batatinha ("Só Eu Sei"), João do Vale/José Cândido ("Carcará") e uma seleção de Noel Rosa (1910-1937) que já antecipa uma homenagem às comemorações do 70o aniversário de nascimento do Poeta da Vila, em outubro próximo: "Último Desejo", Silêncio de Um Minuto", "Pierrô Apaixonado" ( parceria com Heitor dos Prazeres), "Meu Barracão", "Três Apitos" e "Pra Que Mentir" (parceria com Valdico). Se os novos discos atuais de Bethania e Gal Costa, assim como de Simone, só sairão no final de novembro, temos, já os álbuns de Elis Regina e nana Caymmi, ambos candidatas certas a entrarem na lista dos melhores de 80. De Elis, a WEA editou numa caixa luxuosa, com album de 14 folhas, a integram do espetáculo "Saudade do Brasil", que durante meses lotou o Canecão, garantindo a Elis um faturamento de mais de Cr$ 10 milhões. Como a álbum teve uma tiragem de apenas 25 mil exemplares, e pelo seu alto custo ficaria, naturalmente, restrito a uma faixa privilegiada de consumidores, a WEA selecionou as 12 faixas mais expressivas desta produção de Guti e Cesar Camargo Mariano, e os editou num elepe simples, comn a mesma capa (bela criação de Carlos Vergara/Ruth Freihof). Elis, com sua garra e emoção, acompanhada por excelentes músicos, interpreta "Maria Maria" (Milton/Fernando Brant), "Agora Tá" (Tunai/Sergio Natureza), "Alô Alô Marciano" (Rita Lee/Roberto Carvalho), "Canção da América"(Milton Nascimento/Fernando Brandt), "O Primeiro Jornal" (Sueli Costa/Abel Silva), "Marambaia" (Henricão/Rubens Campos), "Onze Fitas, "Menino" (Milton/Ronaldo Bastos"), "Aos Nossos Filhos" (Ivan/Victor), "O Que Foi Feito Deverá" (Milton/Brant); "Redescobrir" (Gonzaguinha) e "Moda de Sangue", de uma nova dupla de compositores gaúchos, Jerônimo Jardim (que fez um ótimo lp na extinta ISAEC, passando totalmente desapercebido) e Ivaldo Roque. Quando Elis se prepara para fazer um elepe destinado ao mercado americano, com produção do compositor Johny Mandell, é oportuno ouvi-la neste seu disco-documento, de um dos mais belos shows montados no Brasil em todos os tempos. De "Mudança dos Ventos" (Odeon, 31C064422. 866, junho/80), o minimo que se pode dizer é que se trata de um dos mais perfeitos álbuns já gravados por uma cantora no Brasil. Nana Caymmi é hoje, para nós, a vocalista que maior carga de emoção transmite. Cantando por todos os poros, com uma imensa carga energética, Nana consegue fazer de cada música que inclui em seu repertório, um momento único. Neste elepe, produzido ao longo de muitas brigas de amor com o mano, arranjador e produtor Dory caymmi, Nana estava particularmente iluminada. Só isso para explicar tanta emoçào presente nas 12 faixas deste disco, absolutamente perfeito. Seja recriando "Canção da Manhã Feliz" (Haroldo Barbosa/Luís Reis) - lançada por Elizeth Cardoso e depois gravada por Maysa, ou dando a "Mistérios", uma leitura diferente da que Joyce colocou em seu lp ("Feminina"), Nana deita e rola com um repertório especialíssimo. Todas as faixas são perfeitas, mas, particularmente, destacaria duas: "Rama de Nuvens", onde Hermínio Bello de Carvalho fez uma das mais perfeitas letras para a melodia de danilo Caymmi e ""Fantasia" (Minha Realidade), que revela em Stella, 17 anos, filha de Nana, uma compositora maior, fazendo a música que, em nosso entender, é a mais bela já aparecida este ano.E há ainda Iva Lins/Vitor Martins ("Mudança dos Ventos"), Djavan ("Meu Bem Querê", com a participação especial do Boca Livre), Sueli Costa/Abel Silva ("Pérola"), Dori Caymmi /Paulo César Pinheiro ("Estrela da Terra"), Gonzaguinha ("De Volta Ao Começo"), Rosa Passos/Fernando de Oliveira ("Essas Tardes Assim") e duas músicas dos meninos do Boca Livre, "A Mó do Tempo" (José Renato/Juca Filho) e "Meu Silêncio", de Cláudio Nucci (que Aliás deixou o grupo, e é o novo marido de Nana) e Luís Fernando Gonçalves. "Mudança dos Ventos" é um disco perfeito. O mínimo que se pode dizer. Xxx O ÁLBUM DO ANO - Se "Mudança dos Ventos" é o melhor disco de uma cantora lançado até agora no Brasil, em 1980. O segundo álbum de Fátima Guedes deve valer a Elifas Andreato as premiações internacionais em matéria de criação visual. Realmente, se Fátima não fosse um encanto de compositora, sensível intérprete, este seu álbum (Odeon, 31C064422864D) já valeria o que custa pela sua apresentação. Aliás, é impressionante que a fabrica tenha bancado com a proposta vísual de Elifas: são oito folhas duras, juntadas através de um espiral, num formato de um juvenil caderno escolar. Decalques, desenhos e todos os textos manuscritos pela própria Fátima, fazem com qur já se emocione frente à presença do álbum . Numa tiragem especial, para a imprensa, o álbum traz algumas declarações de Fátima, também manuscritas, onde explica o seu trabalho de compositora. Quando diz que continua seguindo "um caminho muito literário (...) Gosto de cantar de tudo mas há uma linha em que realmente me sinto mais confortável que é samba-canção, bolero, canção, as coisas mais suaves. Mas eu sinto necessidade de ser mais versátil". As músicas de Fátima trazem personagens de muita força. Que ela explica a origem: Da vida, dos fatos e do comportamento das pessoas. Do meu próprio comportamento também, dos livros, dos jornais, tudo isso é idéia". E como muita gente se impressiona pelo fato de Fátima, aos 21 anos, colocar tanto realismo em suas músicas, ela explica: a origem: "Da vida, dos fatos e do comportamento das pessoas. Do meu próprio comportamento também, dos livros, dos jornais, tudo isso é idéia". E como muita gente se impressiona pelo fato de Fátima, aos 21 anos, colocar tanto realismo em suas músicas, ela explica: - Posso não ter passado literalmente pelas situações que descrevo mas os sentimentos existem em mim. A fonte do meu trabalho é a outra pessoa e ela também sente, e se identifica ou gosta ou reage. São dez novas músicas, onde Fátima esbanja toda sua sensibilidade: "Mais uma Boca", "Aldeia Modelo", "Traste", "O Bloco das Mimosas Borboletas", "Paladara", "Cheiro de Mato", "Tanto que Aprendi de Amor", "Dor Medonha", "Condenados" (que Simone havia lançado no ano passado) e "Dancing Cassino", onde, como música incidental, temos o clássico dos clássicos: "Laura" (Raskin/Johnny Mercer). Outra jovem presença das mais salutares na MPB é de Olivia. Há mais de um ano, pela Continental, saía o elepe de estréia desta jovem interprete, ligada ao grupo A Barca do Sol, conjunto, que, por sua vez, tem suas origens no último festival internacional de música, realizado em Curitiba, quando se entusiasmaram com o trabalho de Egberto Gismonti. E Olívia é uma cantora que está à frente de muitas outras, num trabalho de interpretação (e composição, como "Anjo Vadio", parceria com Geraldo Carneiro e "Lua Branca", parceria com Charles), que exige especial atenção. Em "Anjo Vadio" ( Sigla/Som Livre), Olívia esbanja esse seu talento forte, juvenil e até sensual (como sugere as fotos de capa e contracapa). O repertório não poderia ser melhor: de Assis Valente, regravou "Uva de Caminhão"; com letras de Geraldinho Carneiro, há várias faixas: "Mais Clara, mais Crua" (Gismonti), "Olha a Lua" (John Neshling) e "Nossa Senhora dos Aflitos" (NandoCarneiro). De Sueli Costa/Abel Silva, "Primeiro Jornal"; da dupla Luli e Lucinha. "Dengo Tengo" e de Luiz Melodia, "Onde o Sol bate e se firma". Ouvindo-se os álbuns de Bethania, Elis, Nana, Fátima e Olívia, se ob serva que a música brasileira não poderia estar em melhores vozes. Nem mais belas. LEGENDA FOTO 1 - Bethania. .
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Jornal da Música
31
24/08/1980

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