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Aramis

Carnaval ganha imagens e letra de forma

Apesar de o Brasil ter ganho a adjetivação de o País do Carnaval a partir do romance que Jorge Amado publicou em 1931, o fato é que a maior festa popular não tem inspirado uma bibliografia e filmografia à altura. Seria difícil, inclusive, montar uma programação de filmes relacionados ao Carnaval - pois embora possam ser identificadas algumas dezenas de títulos que, direta ou indiretamente, focaram o Carnaval, poucos teriam cópias à disposição de exibição. Isto explica porque os únicos eventos em termos de exibição restringiram-se ao média metragem (41 minutos) "Carnaval, o aval da carne", de Carlos Marques e Ralph Justino (Cinemateca, hoje e amanhã, 20h30) e, em cópia em vídeo, "Aviso aos Navegantes", 1951, de Watson Macedo (mostrado ontem, no auditório Brasílio Itiberê). "Carnaval, o aval da carne", realizado por Carlos Marques e Justino em 1983, partiu de uma proposta original: registrar o lado mais cruel da festa, nos prontos-socorros e na polícia que atuar enquanto milhões de foliões se divertem. Jornalista de vivência internacional, ligado também à área de produção musical (participou de projetos com Fagner), Carlos Marques levou seu média metragem a vários festivais de cinema e, posteriormente, voltou-se a documentar em vídeos temas políticos - inclusive desenvolvendo um corajoso documentário-denúncia em torno do assassinato de um jornalista alemão em Copacabana, Rio de Janeiro, há alguns anos - por razões muito suspeitas - e que, oficialmente, foi dado como vítima de assaltantes. xxx Em termos de publicações, o Carnaval não tem motivado autores de forma regular. A bibliografia básica da festa maior, mesmo incluindo trabalhos acadêmicos, não chega sequer a meia centena de títulos - e, para consumo de leitores menos exigentes, mas em busca de informações precisas, ainda os referenciais básicos são a "História do Carnaval Carioca", de Eneida de Moraes, reeditado pela Record há dois anos, ampliado e prefaciado por Haroldo Costa, e "O Carnaval Carioca Através da Música", em 2 volumes, que Edigar de Alencar lançou em 1965 - atualizando-o posteriormente para as novas edições pela Francisco Alves. Sérgio Cabral, após anos de promessas, em 1974 publicou "As Escolas de Samba - o quê, quem, como quando e por quê", obra que também está exigindo uma atualização, pois nos últimos 16 anos muita coisa mudou. Quatro anos após Sérgio Cabral ter publicado pela Fontana sua história das escolas cariocas, Wilson Rodrigues Moraes fez trabalho semelhante sobre as "Escolas de Samba de São Paulo", numa edição da Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia de São Paulo. O veterano Jota Efegê (João Ferreria Gomes, 1902-1987), graças ao entusiasmo de Hermínio Bello de Carvalho, quando diretor da Divisão de Música Popular da Funarte, teve reunido seus artigos e crônicas publicados ao longo de mais de 60 anos de atividades na imprensa carioca, do qual resultou, entre outros, o volume "Figuras e Coisas do Carnaval Carioca" (1982). Trabalhos sociológicos têm abordado aspectos diversos - como o fenômeno dos trios elétricos ("O País do Carnaval Elétrico", de Fred Goes, editora Corrupio, 1982), a Escola de Samba Estação Primeira da Mangueira ("O Palácio do Samba", de Maria Júlia Goldwasser, Zahar, 1975) ou "Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro" de Roberto da Matta (Zahar, 1978), para só ficar em três exemplos. xxx Obviamente, há outros estudos publicados, alguns mesmo de cunho regional. Em 1973, coordenamos, "Nem que me Mordas", edição da Fundação Cultural, reunindo reportagens e textos diversos sobre o Carnaval curitibano - a partir de trabalhos que Jorge Narozniack e Roberto Martin publicaram no extinto "Diário do Paraná", acrescidos a outros textos, inclusive alguns originalmente aqui mesmo de O Estado do Paraná. Em forma de livro, sobre o Carnaval curitibano, cremos ser este o único existente. Um pequeno - mas muito referencial e oportuno - livro sobre a festa - e que ao contrário a maioria das obras acima citadas pode ser encontrado nas livrarias - é "Carnaval, Carnavais", de José Carlos Sebe, 50 anos, livre-docente e professor do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Volume 65 da série Princípios, da editora Ática, lançado em 1986, em suas 95 páginas, José Carlos Sebe, paulista de Taubaté, desenvolve um estudo histórico do Carnaval, com informações objetivas e precisas. Professor com uma linguagem clara, vários cursos no Exterior (atualmente desenvolve um estudo sobre o franquismo na Espanha), autor de um livro sobre "Os Jesuítas" (edição Brasiliense, 1985), Sebe em "Carnaval, Carnavais" parte de uma reflexão sobre a origem do Carnaval, aborda as celebrações mitológicas da Antiguidade clássica e acompanha sua trajetória histórica até nossos dias. Naturalmente, o Carnaval brasileiro merece um destaque especial e Sebe estuda especialmente a festa carioca, os carnavais cariocas, o carnaval indigenizado - além de, como historiador, voltar-se às origens da festa. xxx Curiosa é a informação que Sebe reuniu sobre os "papas carnavalescos", a partir do século XV, quando o Papa Paulo II incorporou a festa no calendário cristão. "Não apenas o Carnaval popular foi organizado pelos papas - informa o professor José Carlos. Paulo IV promoveu, numa terça-feira gorda, um lauto jantar onde compareceu o sacro colégio romano e o festim regado a vinho pôde ser considerado uma das primitivas celebrações em salão fechado. "Convém lembrar também que mesmo nos espaços populares o Carnaval evoluiu muito, a tal ponto que Inocêncio II, levando em conta o abuso da utilização das máscaras e disfarces, proibiu que padres e freiras os usassem, e também vetou as comemorações no interior das igrejas e conventos".
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
24/02/1990

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