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"Causos" assustadores que Almirante contava

Há uma semana, em Curitiba, jantando com amigos, Paulo Tapajós lembrou deliciosas - e inéditas - histórias relacionadas a época de ouro do rádio brasileiro, especialmente da Nacional - em sua fase de mais importante veículo de comunicação no Brasil (com a força que as cadeias nacionais de televisão como a Globo e SBT possuem hoje), e na qual, por quase 40 anos, exerceu as mais diferentes funcões - especialmente a de diretor musical. Ali, entre outros colegas notáveis, conviveu com Almirante - pseudônimo de Henrique Foreis Domingues (1908-1980), que foi, como bem disse Sérgio Cabral, um gigante na comunicação brasileira: "Não há quem se compare com ele no rádio, mas também ninguém que tenha contribuído mais para a história de nossa MPB". Foi um excelente cantor - integrante do bando dos Tangarás, ao lado de Noel Rosa (1910-1937) e de seu cunhado, João de Barro (o Braguinha), trabalhou em várias rádios, criou programas notáveis e sobretudo organizou o primeiro arquivo da música brasileira, adquirido em 1965 pelo governador Carlos Lacerda, para o MIS, e que ele administrou até sua morte, no dia 22 de dezembro de 1980. xxx De todos os programas que criou em rádios como a Nacional e Tupi, se destacaria aquele que seria seu maior sucesso nacional: "Incrível! Fantástico! Extraordinário!", iniciado no dia 16 de setembro de 1946 e ao qual se dedicou até o final de sua atividade radiofônica. Estava a caminho da rádio Tupi no dia 11 de janeiro de 1958, para gravar mais um programa da imensa série, quando sofreu, em plena Avenida Rio Branco, o derrame cerebral que iria afastá-lo do rádio e modificar inteiramente a sua vida (dali em diante passou a dedicar-se apenas ao seu arquivo). Em "Incrível! Fantástico! Extraordinário!", Almirante se propôs a relatar todo o tipo de experiências inexplicáveis ocorridas com pessoas das mais diversas partes do país. Para isso, formou uma equipe que procurava verificar os fatos relatados, cartas checadas, nomes completos exigidos e testemunhas solicitadas. Radiofonizadas com perfeição, o programa apresentado na Rádio Tupi do Rio de Janeiro (quintas-feiras, 21h30), com um trabalho fantástico de radioteatro e sonoplastia, tudo ao vivo, sem qualquer recurso especial, eletrizavam (e assustavam) milhões de famílias que, por todo o país, ouviam as suas radiofonizações. Partia de idéias simples, de um tipo de relato que há séculos excita a alma nacional, os contadores de "causos" e se utilizava da técnica do rádio (que na época dominava as comunicações, pois a televisão só chegaria ao Brasil em 1950). Almirante produziu dezenas de programas que foram precursores do terror que hoje, grosseiro e explícito, inunda os cinemas - mas que no rádio, provocava emoção (medo, para ser mais preciso) nos ouvintes que não perdiam uma audição. Em 1951, no auge do sucesso da série, Almirante transferiu para um livro 70 dos casos narrados no rádio (edição "O Cruzeiro", esgotada), que, agora tem seqüência com uma seleção de mais 45 casos, selecionados e preparados por Clelia Regina Ramos, em edição autorizada por sua viúva, Ilka Braga Fortes (editora Francisco Alves, 204 páginas, prefácio de Sergio Cabral). Neste volume procurou-se mostrar o valor histórico do trabalho de Almirante, dada a impossibilidade de recriar o clima que verdadeiramente envolvia os ouvintes de rádio. A seleção dos casos seguiu um critério básico: tentar montar um mostruário do programa, buscando um representante de cada tipo de história contada. A seleção não se pretendeu definitiva - haja visto a quantidade de casos recolhidos. Foram lidos todos os programas da série e, após a seleção, feita uma adaptação do texto (originalmente em forma de roteiro para o rádio), para a narrativa literária. Dado o tempo decorrido das cartas endereçadas a Almirante, a editora optou pela exclusão dos nomes completos e endereços dos missivistas e/ou personagens das tramas. Originalmente, muitas estórias aproveitadas por Almirante foram enviadas por ouvintes do Paraná, inclusive uma delas - de grande repercussão - que teria ocorrido na antiga ponte sobre o Rio Iguaçu, na divisa dos municípios de Curitiba com São José dos Pinhais. xxx A Collector Editora Ltda. (Rua Visconde de Pirajá, 550, subsolo 112, CEP 22.410, Ipanema, Rio de Janeiro), que vem há quatro anos editando a coleção de fitas cassete "Assim era o Rádio" (160 volumes já lançados, NCz$ 45,00 a unidade mais despesas postais) já editou sete programas da série "Incrível! Fantástico! Extraordinário!", que possiblitam aos que não o conheceram nos anos 40/50, terem documentos originais, de como a produção radiofônica era perfeita na realização destes clássicos do terror.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
02/12/1989

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