Censura japonesa
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 29 de agosto de 1987
As orelhas do cônsul-geral do Japão, em São Paulo, devem ter ficado vermelhas no entardecer da quinta-feira passada, quando o cineasta Mitsuo Yanagimachi, 43 anos, disse cobras e lagartos em relação à tentativa que o diplomata nipônico fez para censurar a exibição de "Festival de Fogo", um dos 14 longa-metragens que o Instituto Japão / Fundação Cinemateca Brasileira trouxe ao Brasil na mostra do Novo Cinema Japonês.
Aquilo que os organizadores da mostra (inclusive em Curitiba) estavam tentando ocultar, acabou sendo revelado pelo próprio Mitsuo, ao responder uma das perguntas que lhe foram feitas na palestra no Cine Luz: realmente, o cônsul do Japão, em São Paulo, não queria que "Himatsuri" ("Festival de Fogo") fosse visto e polemizado no Brasil. Vigoroso filme sobre os conflitos ecológicos numa aldeia japonesa, baseado em fatos reais ocorridos há apenas 7 anos, este filme já foi levado a vários festivais internacionais. Inicialmente, não estava previsto para ser mostrado em Curitiba, mas acabou tendo duas projeções há uma semana: as 16 e 22 horas, com a sala superlotada. No intermezzo, a palestra de Mitsuo Yanagimachi e a projeção de seu filme anterior, "Adeus, Terra Adorada", realizado em 1982.
xxx
Falando em japonês - com uma eficiente tradutora ao lado, Mitsuo revelou alguns fatos que devem servir de consolo aos cineastas brasileiros que tanto lutam para fazerem seus filmes. Apesar de todo o progresso e riqueza daquele país, não é fácil chegar ao longa-metragem. Uma produção média custa ao redor de um milhão de dólares e não existe nenhuma EMBRAFILME para dar dinheiro a fundo perdido para produções audaciosas. Resultado: a produção vem se mediocrizando cada vez mais e os cinemas de Tóquio - cujo centro é hoje a área urbana mais valorizada do mundo (o metro quadrado custa dez vezes a mais do que em Nova Iorque) só exibem filmes de apelo popular, capazes de terem grandes bilheterias. Para filmes de arte, complexos e difíceis, não há espaço - disse Mitsuo Yanagimachi, que repetiu em Curitiba o tom sincero de suas entrevistas no Rio e São Paulo, cidades em que esteve anteriormente. Ele mesmo admitiu que só conseguiu realizar seu longa "Adeus, Terra Adorada", porque teve a sorte do roteiro agradar o presidente de um poderoso grupo empresarial, a Seibu Saison.
xxx
Apesar das dificuldades, a produção cinematográfica do Japão é igual a do Brasil: 100 a 200 longa-metragens por ano. A entrada no cinema custa caro: 1.500 yens - ou seja, perto de US$ 10 dólares. E o vídeo é, em sua opinião, "uma ameaça tanto à criatividade como ao futuro do cinema".
Tags:
Enviar novo comentário