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Aramis

A Cidade & O Tempo

Senhoras que apreciam preparar um bom bolo com o legítimo polvilho da Lapa, fazei suas últimas compras nos armazéns Hilário e Contim. Pois, estes dois armazéns de secos & molhados, últimos remanescentes de uma espécie de comércio a varejo característica da Curitiba do passado, cerram suas portas nas próximas semanas. Como os armazéns Alex (Rua Carlos de Carvalho) ou Amadeu (Rua Dr. Murici), estes dois armazéns identificados pelos nomes de seus proprietários, fizeram parte da vida da cidade nas últimas décadas, mas, hoje, estabelecidas novas formas de mercadologia - com a época dos supermercados, não resistiram e, tão logo acabem os estoques, cerrarão suas portas definitivamente. Com seus balcões de madeira, prateleiras com sortimentos dos mais diversificados, fregueses tradicionais - que mereciam a confiança do caderno do "deve", pagos a cada final de mês, os armazéns de secos & molhados foram desaparecendo do centro da cidade, a proporção que a mesma foi crescendo. Alguns resistiram bravamente mas acabaram curvando-se ao tempo. O Armazen Hilário (Rua Mateus Leme/ esquina com a Senador Xavier da Silva), inaugurado em 1937 pelo comerciante Hilário Manoel Moro (1905-1973), teve algumas mudanças de endereço mas sem nunca sair do bairro a que servia. A morte do sr. Hilário, aumentou o trabalho de dona Rosalina Gasparim, sua esposa e que sempre o auxiliou no "negócio". Agora, finalmente, seus 3 filhos a convenceram a descansar. E com isso o armazém cerrará suas portas dentro de algumas semanas. Já o sr. Américo Contim, 57 anos, desde 1936 proprietário do Armazém Contim (Avenida Batel, 1448), também decidiu aposentar-se e no dia 15 de abril fecha a sua casa, inaugurada na década de 20 pelos irmãos Burguell, cujos filhos são ainda proprietários do imóvel. De simples armazém de secos & molhados, os irmãos Samuel, Fernando e Américo Contim transformaram a casa com uma linha mais diversificada - o que tem garantido a sua sobrevivência, apesar das proximidades dos supermercados, responsáveis pelo desaparecimento deste tipo de comércio. O prédio do armazém será transformado em uma sofisticada casa de carnes e frutas, com outro arrendatário. Em fevereiro de 1975, o jovem pesquisador Raphael Valdomiro Grecca de Macedo, publicou uma pesquisa sobre os armazéns de secos & molhados de Curitiba ("Freguês de Caderno") lançada paralelamente a uma exposição de fotografias de Jack Pires, na Casa Romário Martins. Foi motivada pelo centenário do armazém Weigert, na Rua Mateus Leme, que se dedicava principalmente ao comércio de cereais. Poucos meses depois, o sr. Alfredo Weigert fechava aquele estabelecimento. Ainda restam alguns armazéns, com características dos estabelecimentos de secos & molhados, embora já procurando diversificar a sua linha de comércio: é o caso do "Roque", na Rua São Francisco e o Engelhardt (Rua Trajano Reis/ esquina 13 de Maio), anexo à Padaria América. Uma ameaça paira sobre a continuidade desta padaria: moradores de um edifício vizinho reclamaram na Prefeitura contra o forno a lenha, que há quase 50 anos garante a fabricação dos deliciosos pães, segredo de Bruda Engelhardt. Na Avenida Anita Garibaldi, já distante do centro da cidade, podem ser localizados armazéns em decadência, embora ainda sobrevivendo com uma freguesia fiel: o Fávaro, o Brasil e o Doraci, enquanto na Rua Desembargador Hugo Simas existem o Balim, o Scandelari e o Sckruck. Na Rua Mateus Leme, após o fechamento dos armazéns Weigert e, agora, Hilário, só resta o Cukanis, sem a tradição dos outros dois, mas assim mesmo oferecendo o polvilho da Lapa e o açúcar preto, "ideal para fazer pé de moleque", como diz o seu proprietário. Com o fechamento dos armazéns, de secos & molhados, com seu atendimento pessoal, do proprietário & familiares, a simplicidade de suas instalações, desaparece muito do calor humano. E os frios supermercados, com regras inflexíveis de marketing, atendimento massificante ao consumidor, crescendo cada vez mais.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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15/03/1977

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