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Aramis

Compositores Interpretes

Se Mário Reis foi uma espécie de Dom Pedro I na música brasileira, ao dar um grito de independência, 50 anos passados, de que um cantor não precisa ter voz de barítono para gravar (e fazer sucesso), ao poeta Vinícius de Moraes - ao qual a MPB tanto deve - por ser creditado o diretor do autor ser também o intérprete de suas músicas. Pois embora, antes de Vinícius, houvesse casos de composições "dizerem" suas músicas foi a partir da libertação do poeta (que estreou cantando a faixa "Pela Luz dos Olhos Teus", no lp "Bossa Nova Mesmo", 1960, reeditado no ano passado pela Philips) que muitos outros autores se acorajaram a interpretar suas músicas - mesmo não tendo a voz desejável. E hoje, todos os compositores que têm condições mínimas (ou nem tanto), não abrem mão de lançarem suas obras. Há compositores que, por delicidade, têm também vozes previlegiadas, como o multitalentoso Paulinho da viola ou Cesar Costa Filho (que sexta-feira, dia 27, estréia no Paiol). E há os que só podem ser aceitos com muito boa vontade, por "documentarem" seus trabalhos. Cesar Costa Filho, para nós uma das vozes mais especiais da MPB dos anos 70, tem um novo lp na praça ("Bazar", RCA Victor, 1030196, abril/77), o terceiro que faz, produção de Durval Ferreira e com um aspecto muito significativo: todas as letras são do curitibano Heitor Gurgel do Amaral Valente, 29 anos, que sucede assim a ilustres parceiros de Cesinha - como Aldir Blanc, Walter Queirós e Jesus Rocha. Heitorzinho, ex-assessor de imprensa da UFP, com momentos de poesia mas, principalmente, muito crítico em suas letras, é um autor de formação, consciente e preocupado em apresentar múltiplas faces. E aspectos é que faz de "Bazar" um algum interessante - com canções que vão do humor como "Consumatum Est" (incluída na trilha sonora de "As Locomotivas"), "Ve Se Te Enxerga" e "Mantenha Distante"), o romantismo desiludido )"Mata Borrão, "Par ou Impar") até uma deliciosa marcha-rancho )"As Pastoras"). Problemas de produção, influíram para que o disco não saísse como Cesinha de Heitor o desejavam (inclusive lamentável a falta de uma ficha técnica na contracapa), havendo também corte de algumas das melhores músicas da parceria, como "Fecho Eclair". Cosar Costa Filho, que estreou com um dos melhores lps da década ("...E Os Sambas Viverão", 1971), é um compositor de amplos recursos e uma vez tão agradável, que o faz, constantemente, ser requisitado para especiais de televisão. A parceria com Heitorzinho é promissora - e deverá render ainda muitos bons frutos no futuro. Acumulado as funções de compositor e letrista - e com uma linha de absoluta coerência e sem fazer concessões, Luiz Gonzaga Júnior é ainda um autor maldito, e que pese sua penetração junto a uma faixa do público universitário. Em seu quinto lp ("Moleque Gonzaguinha", Odeon, EMCB 7022, abril/77) preocupa-se mais uma vez em tentar maior abertura - embora suas letras continuem longas, o que faz o autor com poucos intérpretes (afinal não é mole decorar as suas palavras). Trabalho esmerado, com excelente instrumentistas acompanhando-o (além da voz deliciosa de Miúcha, na faixa "O Que Importa?"), o disco de Gonzaguinha exige que se escute com as letras na mão (oferecidas num encarte, intercaladas de fotos de amigos e familiares), pois assim a compensação torna-se mais fácil. Gonzaguinha é um compositor para ficar - hoje ainda não absorvido na dimensão que merece, mas que felizmente encontra na Odeon condições de registrar seu trabalho. Todas as faixas deste lp são marcantes, santo e Silva", "Teatro de Revistas" ("Moleques", "Caminho da Roça", e "Meu Aboio".........Gonzaguinha é um compositor que há 10 anos, desde que surgiu no grupo MAU (ao lado de Ivam Lins, Aldir, Cesar Costa Filho etc), se impõe pela inteligência e consciência. E, assim, o sucesso popular demora a chegar mas, em compensação, pode-se orgulhar de toda sua obra - da maior honestidade. A mesma Odeon, que dá condições a Gonzaguinha de continuar um trabalho tão consciente, tem, graças a abertura cultural de seu diretor artístico Milon Miranda, investido em compositores jovens, igualmente não comerciais, dentro dos critérios de marketing que, infelizmente, dominam o grosso das produções das gravações. E assim, aparecem discos como o da dupla Burnier & Cartir - um dos melhores lançamentos do ano passado, e agora este gaúcho chamado Fernando Ribeiro ("Em Mar Aberto", EMCB 7018, abril/77). De todo o badalado grupo de novos compositores-intérpretes baianos, Ribeiro - contratado há quase 2 anos pela Odeon, mas só agora sendo lançado nos parece um dos mais sólidos, com uma criatividade harmônica excelente e que tem nos parceiro Arnaldo Sissoni, a complementação para dar o seu recado. Como no caso de Cesar-Heitor, Ribeiro-Sisson também são múltiplos no enfoque, nos temas abordados - e resultado são 12 canções que exigem atenção, para serem melhor compreendidas. Os próprios cuidados de produção, com jovens e integrados instrumentistas participando das diferentes faixas, bom acabamento do lp (encarte, com todas as letras), comprovam a importância com que Milton Miranda soube dar a esta estréia de Fernando Ribeiro, nome que, neste 1977, pode ser, desde já considerado como a grande revelação - ao lado de seu letrista Arnaldo Sisson. Das mais agradáveis revelações é também o paulista Roberto Riberti, que já admirávamos de seus trabalho, em parceria com Eduardo Gudim, para a trilha sonora de "À Flor da Pele"(1975, de Francisco Ramalho Filho, até agora melhor lançamento nacional do ano). Além do autor de 10 das 14 faixas deste lp de estréia (Chantecler, 2-08-404-083, maio/77), Roberto teve a chance de incluir músicas como "Ruas que Sonhei", de Paulinho da Villa (que o acompanha no violão e tamborim) e uma adaptação sobre "Mestiça" de Gonçalves Crespo. O amigo é parceiro Eduardo Gudim, o acompanha em 12 faixas, ao lado de outros instrumentistas da maior brasilidade - como o flautista Carlos Poyares, o trombonista Felpudo, o baterista Milton Banana etc. Também Riberti oscila em vários temas - do melhor samba a um tango ("Em Pedaços"), com a presença do bandoneon de Oldimar Caceres. Arranjos divididos entre Magro e José Briamonte, participação do MPB-4 numa faixa das mais críticas ("Apenas Mais Um"), a inclusão de uma das músicas para fazer com que também este novo nome da MPB, seja saudado com nota máxima - e anotado, desde já, para a recessão dos melhores do ano. Há também os grandes talentos que retornam. Como o baiano Fernando Lona, há 11 anos lançado nacionalmente, como parceiro de Vandré em "Porta Estandarte" (na interpretação de Tuca, vencedora do Festival de MPB em São Paulo), mas que voltou a Salvador, ali trabalhando em jingles, para os estúdios JS - só retornando poucas vezes s São Paulo - trabalhando então, em trilhas sonoras de filmes didáticos de Rosa Jonas ou fazendo músicas para telenovelas ("Céu Amarelo", da Tupi, editada em lp pela Copacabana). Mas Lona não parou de compor. Junto com parceiros diversos - como Carlos Pita, Cid Seixas, C. Ubaldo ou João Augusto (diretor do Teatro Vila Velha, em Salvador), tem muitas músicas, 12 das quais mostras agora em seu interessante retorno, em "Cidadão do Mundo"(Tapecar, X-43, abril/77), um dos mais auspiciosos lançamentos da gravadora Manolo - nos últimos meses com seus suplementos restritos a linha "Black Rio". Lona canta bonito, suas músicas são agradáveis e seu reaparecimento é, por todos os motivos, auspiciosos. Outro retorno: Orlandivo Honório de Souza, Rio de Janeiro, 5 de agosto de 1937). Lançando por Nilo Sérgio, da Musidisc, como cantor-compositor, em 1961, com "Samba Tqff", "Sambadinho", "Tamanco no Samba", e outras músicas que tiveram relativo sucesso, Orlam Divo, após 2 lps ("A Chave do Sucesso" e "Orlam Divo"), acabou afastando-se da atividade cantor, limitando-se a instrumentista e produtor de elepês. Reaparece (Copacabana, 120088, abril/77), com 11 músicas - tendo por parceiros Durval Ferreira ("- Tudo Jóia", "Um Abraço no Bengil", "Gueri-Gueri")< Chico Anísio (e Durval) "(Juazeiro", "Disse Me Disse"), Ed Lincoln ("Palladium"), Helton Menezes ("Tamanco no Samba") e Adilson Azevedo ("Bolinha de Sabão", seu maior sucesso na década de 60) e Roberto Jorge ("Onde Anda o Meu Amor"). Para completar, Orlandivo encerra com uma homenagem a Tom/Vinícius, gravando o clássico "A Felicidade". No acompanhamento, músicos importantes dos anos 60: Durval e José Menezes na guitarra, Sivuca no acordeon. Copinha e Geraldo nas flautas, João Donato nos teclados e, na percussão, entre outros, Chico Bateria e Helcio Milito. E por último, um disco que tem que ser ouvido sob o prisma do humor: "Proversos" de Silvio Brito. Paulista, irreverente, numa linha aberta por Raul Seixas (com o qual tenta provocar uma polêmica), Silvio faz muitos shows, tem o seu público e vem merecendo da Chantecler um grande investimento. Tanto é que este seu terceiro lp, tem capa dupla, contou com bons músicos e acompanhado de amplo material de promoção, incluindo fotos e adesivos num encarte especial. Como acentuou o lúcido Luís Augusto Xavier, Silvio tem que ser ouvido informalmente, como um compositor irreverente e de bom humor. Neste prisma, suas músicas podem passa - numa linguagem jovem. Ouçam sem compromissos suas novas músicas, ao lado de versões ("-Balada Para Um Louco" de Piazzola/Ferrer e "Nasci Para Chorar") e prestem atenção em "Quero Todo Mundo Entendendo O Que Digo": neste a parceira é com Jean Garfunkel, neto querido de um dos casais mais conhecido em Curitiba - madame Helena / pintor Paul Garfunkel. E sobrinho do hoje poderosíssimo Karlos Rischbietter, presidente do Banco do Brasil.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Jornal da Música
1
22/05/1977

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