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Aramis

A contemporaneidade musical do Século XX chega em 10 CDs

Cada vez mais o mercado de CD amplia-se, fazendo com que a única fábrica de compact disc na América do Sul (Microservice, São Paulo), esteja hoje com a produção total, enquanto as gravadoras vendem seus catálogos mas não podem entregar a mercadoria. Parece até contradição: em época de crise econômica, o CD vende tanto (ou mais) que o convencional, provando que uma ponderável parcela de consumidores consegue manter seus gostos e exigências. Desde a produção mais comercial até lançamentos sofisticados encontram público e prova disto é que a Polygram fez uma edição corajosa: "20th Century Classics", trazendo, em dez CDs, edições originais da Deutsche Grammophon, o que há de mais representativo na chamada música contemporânea, de difícil massificação e que mesmo em suas edições convencionais (elepês) sempre foi exígua no catálogo brasileiro. Leonardo de Barros, competente diretor da área erudita e jazz da Polygram, acredita nas possibilidades desta música contemporânea (embora com alguns autores já falecidos) para ampliar seu universo de consumo, pois "a música do século XX ocupa um lugar especial na história da música ocidental: trata-se de uma nova linguagem que surge no horizonte da arte musical, uma vasta produção que ultrapassa e supera os próprios conceitos de movimentos, escolas, estilos e regionalismos musicais, levando a música a interrogar-se sobre si mesma, suas possibilidades, limites e suas manifestações". Nesta coleção de 10 volumes, com repertório retirado do catálogo da Deutsche Grammophon e reprocessado digitalmente, "a coleção não pretende ser um panorama sistemático da produção musical do século XX, mas antes mostrar uma parcela considerável desta produção através de intérpretes consagrados, cujas execuções, em alguns casos, foram acompanhadas e aprovadas pelos próprios compositores - quando não, estes próprios estavam diante do microfone a conduzi-las", esclarece Barros. Várias destas obras estão sendo lançadas pela primeira vez no Brasil e todos os títulos contém livretos bilíngües (Inglês / Português), escritos por especialistas nas obras em questão, tornando este lançamento um marco na discografia brasileira. Reynaldo Roesls Jr. ("Jornal do Brasil"), lembrou que não há, entre os títulos, obras já praticamente popularizadas, como "Sagração da Primavera" ou "Pierrot Lunaire" (que revolucionariam a música do início do século), mas o gênio de Igor Stravinski (1882-1971) está com "Missa" e "Les Noces", na gravação que foi feita com o coro do Festival Bach da Inglaterra, regido por Leonard Bernstein. Arnoldo Schonberg (1874-1951) - compositor húngaro austríaco, que devido ao nazismo emigrou para os EUA em 1933 e se fixou em Hollywood, um dos mestres da chamada Escola de Viena, pode ser apreciado em dois volumes da coleção. Em "Peças para Piano Solo", Maurizio Pollini, 47 anos, outro pai da música contemporânea, executa as peças com "seu toque límpido, seco e viril, que acentua a estruturação das obras da primeira à última nota" (Roesls Jr.). Já em "Noite Transfigurada", trio de cordas, Opus 45, também de Schonberg, temos execuções do Quarteto La Salle. Anton Werbern (1883-1945) - compositor, regente e musicólogo austríaco que levou às últimas conseqüências as técnicas do serialismo schoenbeguiano, produzindo uma obra ascética e "microscópica" que fascinou a "avant-garde" dos compositores a partir da década de 50, pode ser apreciado na coleção com a Filarmônica de Berlim, sob regência do recém falecido Herbert Von Karajan, com sua "Passacaglia", Opus 1, cinco movimentos para orquestra, Opus 5, mais seis peças para orquestra, Opus 6 e a Sinfonia, Opus 27. Obras maduras de um dos maiores compositores do século - e que morreu num misterioso assassinato (por um soldado americano durante a ocupação de Viena), deixando uma obra desafiadora a executantes e ouvintes. Alban Berg (1885-1935) - também austríaco e tal como Werbern, seu amigo íntimo, foi discípulo de Schoenberg (entre 1904-1910). Seu estilo progrediu de rica tonalidade cromática das primeiras obras para a atonalidade, como no "Concerto de Câmara" (1925). Segundo Luiz Paulo Horta, a música de Berg é formalmente complexa, antecipando às vezes os avanços musicais do pós-guerra. Ao mesmo tempo, sua intensa musicalidade, beirando em certos casos uma expressividade romântica, faz com que ela seja de mais fácil abordagem que a de seus companheiros de dodecafonismo. Na coleção "20th Century Classics", temos o seu concerto de câmara para piano, violino e 13 instrumentos de sopro: Sonata para Piano, Opus 1, e Peças para Clarinete e Piano. Pinchas Zukerman (violino), Anthony Pay (clarinete), Daniel Baremboim (piano), Esemble Intercontemporain, sob a regência de Pierre Boulez, são os intérpretes. Kurt Weill (1900-1950) - tem seu nome muito associado ao dramaturgo Bertold Brecht, com quem musicou suas famosas "Óperas dos Três Vinténs" (1928), "Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny" (1929) e "Os Sete Pecados Mortais de Kleinburger" (1933). Mas sua obra é extensa, com outros autores e desenvolvida também nos EUA (onde se fixou em 1935), inclusive canções para os palcos da Broadway, interpretadas por sua esposa, a cantora Lotte Lenya (1900-1981). Com a London Sinfonietta, sob regência de David Atherton, temos a suíte para orquestra de sopros, Opus 12, com Nona Liddel como solista e, ocupando 22:31", as canções de Mahabonny, interpretadas por solistas como Meriel Dickinson, Mary Thomas, Philip Landridge, Ian Partridge, Benjamin Luxon e Michael Rippon. Olivier Messiaen - 81 anos, compositor e organista francês, é ligado no Brasil ao nome do pianista curitibano (de carreira internacional) Jocy de Oliveira, que, entre nós, tem sido a maior divulgadora de sua difícil obra (no ano passado, a Polygram editou dois álbuns com a íntegra "Les Oiseaux", na execução de Jossy, que permaneciam inéditos há mais de 20 anos). Portanto, é interessante conhecer outras de suas obras, no caso o "Quatuour pour la Fin du Temps" (1941), na execução de Daniel Baremboim, Luben Yordanoff, Albert Tetard e Claude Desurmont. Uma reflexão musical para piano, violino, violoncelo e clarinete, sobre textos do Apocalipse, "que constituem uma chave mestra para penetrar no universo paradoxalmente moderno de um compositor fervorosamente católico", como escreveu Roesls Jr. Benjamin Britten (1913-1976) - compositor e pianista britânico, tem sido mencionado fora dos meios musicais devido a repercussão que alcançou o filme "Um Réquiem de Guerra" (1961), inspirado em uma de suas obras famosas, lançado há poucos meses em Londres. Com Lorin Maazel regendo a Orchestre National, de Paris, temos três momentos especiais de sua obra: a Sinfônica de Chicago, regida por Carlo Maria Giulini, regendo a Serenata para Tenor, Trompa e Cordas (solistas Robert Tear, tenor; Dale Clevenger, trompa); o mesmo Giulini, mas regendo a Orquestra Pilharmonica, com "Les Iluminations", com Tear como solista e as variações e fuga sobre um tema de Purcell ("The Young Person's Guide to the Orchestre), com a Orchestre National, de Paris, regida por Lorin Maazel. Luciano Berio - 64 anos, italiano, maior nome da música contemporânea da Itália e que nos anos 60 impressionou com um trabalho eclético do tipo colagem (chegou até a compor obras para o grupo vocal jazzístico "The Swingle Singers"). Temos aqui o seu "coro", para vozes e instrumentos (1977), na execução do coro de Rádio e Orquestra Sinfônica de Colônia, sob regência do próprio autor. Finalmente, a coleção se encerra com o Quarteto La Salle, formado por Walter Levin (1º violino), Henry Meyer (2º violino), Peter Kammitzer (viola) e Jac Kirstein (violoncelo), executando peças de quatro demolidores autores de vanguarda: o Quarteto de Cordas, obra de 1964, do polonês Witold Lutoslawaki, 76 anos; o Quarteto per Archi, que Krzysztof Penderecki, 56 anos, criou em 1960; o Prelúdio para Quarteto de Cordas, de Toshiro Mayzumi, 60 anos, composta em 1961 e, finalmente, o Quarteto de Cordas em Quatro Partes, que o americano John Cage, 77 anos, elaborou há 39 anos. LEGENDA FOTO 1 - Benjamin Britten. LEGENDA FOTO 2 - Arnold Schonberg. LEGENDA FOTO 3 - Alban Berg.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
16
30/07/1989

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