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Aramis

De como desperdiçar a chance para preservar imagem urbana

O professor e arquiteto Manoel Coelho, 50 anos, reconduzido por unanimidade à direção do curso de Arquitetura da Universidade Federal do Paraná - da qual é mestre há 20 anos, fez, nos dois anos que integrou a equipe do prefeito Jaime Lerner, a melhor administração na Secretaria do Desenvolvimento Municipal nos últimos anos. Intelectualmente e tecnicamente um dos mais bem preparados profissionais do Paraná, com um curriculum em que se destacam mais de 50 obras executadas em várias cidades, Coelho não é apenas um consagrado arquiteto. Designer com trabalhos desenvolvidos em várias cidades, para grande corporações - como o City Bank - tem merecido seguidas menções em publicações nacionais, como temos sempre aqui registrado. De formação humanista, preocupa-se com uma integração homem-cidade e pela sua sensibilidade artística, colecionador de obras de arte, dono de uma selecionada biblioteca e discoteca, apreciador do bom cinema, Coelho sempre mostrou-se sensível a projetos ligados a preservação da memória de nosso país e, especialmente de nossa cidade. Esta visão é que fez com que Manoel tornasse lei uma sugestão que, há mais de dez anos era feita ao prefeito Jaime Lerner - que, infelizmente, mesmo com todo o marketing que publicitariamente o identifica à ecologia e cultura, deixa muitas vezes de apoiar boas idéias quando, politicamente, não o interessam imediatamente. Empenhando-se, pessoalmente, na defesa da necessidade de ao menos visualmente se preservar a imagem arquitetônica de Curitiba - e amparado em sólidos argumentos - o então secretário Manoel Coelho conseguiu a aprovação do decreto lei nº 52 de 7 de dezembro de 1990. Por este documento legal, a partir daquela data qualquer solicitação de demolição de imóveis da cidade, encaminhada à Secretaria do Desenvolvimento Urbano - antigo Departamento de Urbanismo - deveria, obrigatoriamente, ser acompanhada de fotos, documentando o prédio a ser desmanchado. Afinal, é uma forma econômica e prática de se ampliar o acervo histórico da Casa da Memória / Fundação Cultural de Curitiba com imagens que guardem ao menos a Curitiba de hoje. Imagine-se se, uma lei como esta, estivesse em vigor há algumas décadas, especialmente a partir dos anos 50? Teríamos um imenso arquivo capaz de mostrar a "fisionomia" da cidade, que se transformou rapidamente, com demolições de antigas construções - residências, prédios comerciais e residenciais, pavilhões, etc. A cidade necessita ter, oficialmente, uma documentação de sua transformação urbana, acessível a historiadores, pesquisadores e a finalidades artísticas - documentação para publicações, informações para cenários de peças, filmes, vídeos. Com o desenvolvimento de novas tecnologias, esta documentação poderia inclusive ampliar-se para filmagens em vídeo, pois numa fita VHS, de duas horas, que custa menos de Cr$ 2 mil, se poderia documentar rápidos aspectos exteriores e interiores de dezenas de imóveis, a custo mínimo. Entretanto, o decreto-lei municipal foi modesto: obriga apenas a documentação fotográfica, fornecida pelo próprio interessado. Infelizmente, algumas semanas após ter conseguido, finalmente, convencer o prefeito Lerner na importância deste decreto, o professor Manoel Coelho, por razões particulares (as quais, elegantemente reservou para si, para não fazer críticas à atual administração), renunciou ao cargo. Voltou ao seu movimentado escritório de arquitetura no edifício Arthur Hauer, reassumiu a coordenação do curso de Arquitetura na UFPR e assinou contratos de projetos em Quito, no Equador. Infelizmente, o seu sucessor, arquiteto Luiz Massaru Hayakawa, parece que não tem o mesmo amor pela cidade. Prova disto é que o decreto nº 52 está virando mais "uma lei que não pegou", unicamente pela inépcia municipal. Consultado por este repórter, a Secretaria do Desenvolvimento Urbano, após muita demora, informou que a lei existe e deveria ser cobrada pelo Departamento de Controle de Edificações, dirigida pelo Sr. Solano Glock. Só que "não está sendo exigida a documentação fotográfica", diz, ao telefone, uma das assessoras do secretário Hayakawa. Por que? A moça solícita mas desinformada, disse que não tinha a menor idéia a respeito. xxx Assim, enquanto existe um decreto-lei que poderia fazer com que diariamente o arquivo de imagens do Departamento de Patrimônio Histórico da onerosa Fundação Cultural de Curitiba fosse enriquecido, as construções de Curitiba vão sendo demolidas, sem deixar imagens para a posteridade. Ninguém pretende, em absoluto, que se faça tombamentos e preserve-se todos os prédios antigos, pois o progresso é inexorável em seus passos. Mas o que custaria à Prefeitura que tanto alardeia preocupações com o passado e está gigoloteando politicamente os próximos 300 anos de Curitiba, cumprir ao menos a sua própria legislação? Gostaríamos muito de ter uma resposta que informasse que a lei criada na administração de Manoel Coelho não é apenas uma letra morta nos arquivos da incompetência e burocracia da administração de Lerner.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
26/04/1991

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