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Aramis

"A Família" continua e o retorno de "Malpertuis"

Interessante como certas salas ficam comprometidas com um determinado tipo de público. Por exemplo, o Palace-Itália (6º andar do Centro Comercial Itália), a princípio destinado a ter uma freqüência classe "a", concorrendo com o Astor, foi tão mal-tratada em sua programação, quase que exclusiva dos filmes da Paris Filmes, que em pouco tempo firmou uma clientela classe "c" e "d", que busca apenas filmes de violência e terror explícito. Assim, quando o nervoso Alex Adamiu, poderoso dono da Paris Filmes (e sócio da Famano Cine Itália) decidiu lançar no Palace-Itália, em estréia nacional, "A Família", de Ettore Scola, seu gerente local, Antoninho, já havia previsto: o público tradicional não iria aceitar este belíssimo filme e, os espectadores de melhor nível intelectual, demorariam a "descobrir" que, excepcionalmente, ali estava sendo exibido um filme de categoria. Não deu outra. A renda de "La Famiglia" foi tão pequena que na segunda-feira, 22, Adamiu já havia decidido retirar o filme de cartaz e exigir a cópia de retorno a São Paulo. Felizmente, prevaleceu o bom senso: no Cine Itália, 5 pisos abaixo do mesmo prédio, haverá chance de "A Família" fazer uma renda melhor - pois o elogio de boca-a-boca, a recomendação, fará com que esta nova obra prima de Ecola possa repertir o sucesso de "O Baile". E assim, felizmente, continua em cartaz - e se espera que o público apareça. Caso contrário, mais uma vez teremos a confirmação de que, realmente, os curitibanos não sabem apreciar bons filmes - quando os mesmo aqui tem lançamento nacional. Imagens do Inconsciente No Luz, desde ontem, está sendo exibida a segunda parte do documentário "Imagens do Inconsciente", de Leon Hirzmann (1937-1987), também seguramente, um dos 10 melhores filmes deste ano. Realizado entre 1983/87, documentando parte do trabalho realizado pela psiquiatra Nise da Silveira no Museu do Inconsciente, ligado ao Centro Psiquiátrico Pedro II, no bairro carioca do Engenho de Dentro, "Imagens do Inconsciente" focalizou os pacientes Fernando Diniz ("Em Busca do Espaço Cotidiano". exibido na semana passada), Adelina Gomes ("No Reino das Mães", agora em exibição) e Carlos Pertuis ( "A Barca do Sol", programado para a próxima semana) que construíram uma obra definida pelo crítico Mário Pedrosa como "patrimônio cultural da nação brasileira". Hirzmann fez um trabalho admirável, amparado no roteiro da própria psiquiatra Nise da Silveira, que fundou o Museu do Inconsciente em 1953 (e que desenvolve um trabalho de terapia pela arte desde 1946), com narração da atriz Vanda Lacerda e do poeta (e crítico de arte) Ferreira Gullar. A trilha sonora (de Edu Lobo) é perfeira, ajustando-se as imagens de Lúis Carlos Saldanha (também montador) que, basicamente com as obras dos internos-artistas, (re)contam seu aprendizado e permitem um entendimento de todo o universo da loucura x imaginação. Destinado a platéias especiais, "Imagens do Inconsciente" deve ser visto obrigatoriamente por atistas plásticos, professores da área de psicologia e psiquiatria, psiquiatras, terapeutas, etc. O episódio intermediário, agora em exibição, "No Reino das Mães" é sobre Adelina Gomes, mestiça, filha de camponeses, que se apaixonou aos 18 anos, mas teve o casamento proibido pela mãe. Revoltada, Adelina estrangula a gata da família e é internada. No Museu do Inconsciente, a paciente agressiva e fechada, dá lugar a uma artista que se expressa através de mulheres em forma de flor, mães com o coração fora do peito e gato - todas estas formas muitas vezes fundidas com plantas e outros vegetais. Ação, muita ação! Dois filmes de ação e aventuras estão em exibição e talvez passem de uma semana em cartaz. No Plaza, "Na Rota do Oriente"("High Road To Chine"), ambientado no Oriente, com Tom Selleck, Bess Armstrong, Jack Neston e Robert Morley. O diretor, Brian G. Huttonm, 53 anos, após uma promissora estréia - "Vítima de um Pecado" ("The Wild Seed", 65), precursor da chamada linha road-movies, tem uma filmografia das mais irregulares, embora correto artesanalmente, Cine Plaza desde ontem. "Atirando Para Matar" ("Deadly Persuit"), de Roger Spottiswood, reúne um agente especial do FBI, Warren Stantin (Sidney Poitier) a um expert em trilhas montanhosas, Jonathan Knox (Tom Berenger), para perseguir o assassino que havia seqüestrado Sarah (Kristie Alley), namorada de Jonathan. Conflitos entre o agente negro e o guia branco - resquícios ainda de preconceitos (e que, há 30 anos, faziam de "Acorrentados", de Stanley Kramer, um filme precursor no aspecto social) explodem ao longo deste thriller, com muitas seqüências exteriores e uma movimentada trilha de John Scott. Para verificar por quem disponha de tempo livre. Cine Astor. Outras opções Excluíndo-se os filmes que permanecem em cartaz - como "Crocodilo Dundee II", de Paul Hogan (Condor) e "Rambo III" (São João) a semana tem opções diversas. Aos fãs de rock, uma biografia de Chuck Berry ("O Mito do Rock" de Taylor Hackford), em exibição no Lido II - e que reúne gente conhecida como Eric Clapton, Robert Gray (de quem a WEA acaba de lançar um novo lp de Blues), Etta James, Julian Lennon, Keith Richards, Linda Rostadt. A trilha sonora foi editada pela WEA e a garotada poderá curtir o som elétrico - como uma compensação por não poder assistir, ao vivo, o Free Fazz Festival, que inicia dia 1º no Hotel Nacional, RJ). Os fanáticos por filme de terror tem uma nova dose: "A Maldição dos Mortos Vivos" ("The Serpent and the Rainbow"), de Wes Craven (que fez fama com a primeira parte de "A Hora do Pesadelo"), em cujo elenco estão Bill Pulman e Cathy Tyson. Em exibição no Lido I. "O Império dos Sentidos", de Nagisa Oshima, cencedor da Palma de Ouro-Cannes 77, e que foi um escândalo na época, por ser o primeiro filme de arte a mostrar cenas de sexo explícito, volta ao cartaz - agora no Palace Itália. Um filme belíssimo, que ao ser lançado no Brasil, há 8 anos, enriqueceu tanto ao distribuidor Álvaro Pacheco, que pode se aposentar e ficar dedicando-se apenas as suas poesias (hoje já é "Imortal" da Academia Brasileira de Letras). Cult-Movie é uma expressão que vem se popularizando cada vez mais no Brasil para identificar os fiilmes modestos, que passam despercebidamente, geralmente chegando sem maior promoção e onde acabam tornando-se clássicos. Exemplo disto é "Malpertius", co-produção Belga-Franco-Alemã, realizada em 1971 por um cineasta desconhecido, Harry Kumel, que mesmo em São Paulo demorou para ser "descoberto" pelos cinéfilos. Ao ser lançado no Groff, no ano passado, quando começava a fazer uma boa carreira, houve a estupidez de retirá-lo de cartaz - frustrando centenas de espectadores que informados por amigos ou pelos jornais (inclusive aqui chamamos a atenção na época para sua importância) desejavam assistí-lo. Felizmente, como Chico Alves decidiu cuidar pessoalmente da programação do circuito da Fucucu - que estava indo para o brejo devido a incompetência de seu "assessor" que aprontou bastante no período em que andava mandando e desmandando na mesma - , "Malpertuis" volta a ser exibido - e caso a ganância da direção financeira da Fucucu não exija "rendimentos altos" em uma semana, é possível que desta vez permaneça mais tempo em cartaz. É só saber esperar, pois interesse existe. A grande atração de "Malpertuis" é a presença magnífica de Orson Welles (1915-1985) como o personagem Cassavius, que apesar de uma curta atuação tem a gradiosidade dos grandes personagens. Filme-puzzle, oferecendo múltiplas leituras em seus aspectos simbólicos, "Malpertuis" desafia o espectador e justifica mais de uma visão. No elenco internacional, Kumel reuniu Susan Hampshire (na interpretação de três personagens: Euryale/Alice/Nancy), Mathie Carriere (Yann), Michael Bouquet (Didellon), Jean Pierre Cassel (Lampernis), Sylvie Vartan (Bets), Dorovan Der Groen (Sylvia Dideloo), entre outros. O roteiro é de Jean Ferry (originalmente com os diálogos em flamengo) baseado em romance de Jean Ray. Música de Georfes DelRue e fotografia dividida entre três profissionais - Gerry Fischer, Peter Anger e Yetty Faes. Um filme importantíssimo, sem dúvida a melhor programação (reprise) nesta semana. Que, tem ainda - quase esquecíamos - o melancólico "Quincas Borba", último filme de Roberto Santos (Cine Ritz) e uma comédia, aparentemente atrevida, nas sessões noturnas do Bristol: "Rita, Sue e Bob Nu", de Alain Clarke. LEGENDA FOTO - Sidney Poitier em "Atirando Para Matar": um policial movimentado em exibição no Astor.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Seção de Cinema
8
26/08/1988

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