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Aramis

Fernanda & Bertha, o teatro e 2 mulheres

Depois de apresentação da << Preservation Hall Jazz Band >>, ontem à noite, e entre o concerto do grupo << I Solisti Del Barocco >>, às 16h30min, de amanhã, três opções das mais atraentes na cidade: << É >>, de Millor Fernandes, em 4 únicas apresentações no Guaíra, << Divirta-se com Bertha Loran >> no auditório do sesi e, aos que apreciam a música nordestina, a Banda de pau e Corda, no Teatro do paiol. Independente dos registros no << Fim de Semana >>, estes eventos merecem também destaque em nossa coluna, já que confirmam, mais uma vez, que não é por falta de bons espetáculos que a pessoa de bom gosto deve ficar em casa. Bertha Loran é uma atriz das mais respeitadas por quem, conhece um pouco de nossa vida artística: começou ainda garota e assim tem atravessado, sem concessões pessoais e ética, várias fases da vida artística brasileira. Seu currículo é imenso em peças, filmes, espetáculos diversos, etc., mas, ironicamente, foi pela televisão, no << Planeta dos Homens >>, que se tornou mais conhecida. Comediante como poucas, Bertha decidiu mostrar longe das câmaras, um pouco mais de seu talento e assim investiu Cr$ 700 mil numa produção desponjada mas altamente comunicativa, que está levando a várias cidades. Mulher que se mantém atualizada do que existe de melhor no teatro mundial - com férias anuais em Nova Iorque, Londres e París, para assistir aos grandes espetáculos, não pensa em luxo e riqueza, tal como a Amélia da música popular: prefere a vida cultural, os espetáculos inteligentes e sonha, em 1981, montar um grande texto, numa produção digna da Broadway. Conhecendo-se Bertha e entende melhor uma grande embora de certa forma, esquecida - mulher de nosso teatro. Aliás, << A Mulher no Teatro Brasileiro >> não é apenas o título de um excelente ensaio de Luíza Barreto Leite, ela própria vem de uma das mais matriarcais famílias da vida artística nacional. A mulher tem uma presença intensa em nossos palcos e, entre tantas que se destacaram, Fernanda Montenegro ocupa um lugar único. Uma atriz da maior sensibilidade que encontrou em Fernando Torres o marido e companheiro de trabalho perfeito, sua carreira é pontilhada de êxitos: dos mais dramáticos textos até comédias sociais, Fernanda e Fernando estão no primeiro time do teatro brasileiro. << É >>, uma comédia que Millor Fernandes escreveu há 4 anos, sem maiores pretensões - e que já lhe rendeu em direitos autorais o suficiente para a compra de um triplex de cobertura na avenida Vieira Souto, Rio - está entre os melhores textos apresentados nos palcos brasileiros nestes últimos anos. << É >>, uma comédia mais é também uma peça de grande significado social e humano pela contemporaneidade do tema que aborda: os encontros e desencontros do casamento. Autor e tradutor com uma obra respeitabílissima - que a L&PM, de Porto Alegre, vem lançando numa preciosa coleção - Millor, o ex-Vão Gôgo, cujas 2 páginas na revista << Veja >> (como no passado o << Pif-Paf >> da época de ouro de << O Cruzeiro >>) tem o maior índice de leitura, é um homem de seu tempo. Nada em Millor é gratuito: quando traduzia << Os Filhos de Kennedy >>, de Robert Patrick, imaginou << Os Órfãos de Jânio >>, que estreou há 2 semanas, no Teatro dos Quatros, direção de Sérgio Brito, no Rio de Janeiro. Quando Aloysio de Oliveira lhe encomendou uma atualização de << Deus lhe Pague >>, transformado em musical ao estilo da Broadway, com canção de Vinícius de Moraes/Edu Lobo - e que estreou a 13 de novembro de 1976, no Canecão - Millor conseguiu praticamente recriar o texto de Joracy Camargo que Procópio Ferreira representou por mais de 40 anos. << É >> poderia ser apenas uma comediota ao estilo << vaudeville >> como tantas besteiras que assolam nossos palcos, a exemplo de << Camas Redondas, Casais Quadrados >>, de João Bethencourt, ainda na semana passada apresentada em Curitiba. Mas Millor soube dar ao seu texto uma dimensão que faz o espectador rir mas também refletir. Quase o riso pela dor, ao verificar que as situações de um << swingle >> matrimonial, de uma troca de casais, vai muito mais do que à simples diversão: é questionada toda uma falta de comunicação, diferenças de visão do mundo e, aquilo que é mais importante em nossos dias, na solidão de todos nós: o constitucional direito de cada um procurar a sua felicidade. Com uma curta temporada (hoje e amanhã, 21 horas; domingo, 18 e 21h30min.), << É >> poderá ser visto por mais de 8 mil pessoas, já que tem temporada no grande auditório. E os ingressos vão de Cr$ 50,00 (balcão) a Cr$ 300,00 (platéia central), de forma que não há descupa de preço para se deixar de assistir esta peça que há 3 anos lota teatros no Rio e São Paulo. Fernanda e Fernando, naturalmente cansados, pretendem tirar férias a partir de segunda-feira. De princípio não pensam em nova temporada de << É >>, embora dificilmente algum outro casal vá conseguir dar o mesmo clima, a mesma emoção, o mesmo humor inteligente que conseguiram transmitir neste espetáculo, dirigido por Paulo José - mas que obviamente, ao longo de 36 meses de interruptas encenações acabou tendo uma << carpintaria >>, um acabamento do próprio casal. Do elenco de apoio houve substituições naturalmente, mas sempre ajustadas: Betty Erthal, Betina Vianny (a bela filha do crítico e historiador Alex Viany) e Fernando de Souza estão já há tempos na peça, que, neste fim de semana, é um programa indispensável. *** Há 8 anos, quando o Quinteto Violado começava a aparecer nacionalmente com uma música nordestina revistada (e até certo ponto sofisticada) e distensões de Ariano Suassuna entre a área musical de Recife provocava a separação da orquestra Armonial, regência de Cussy Almeida, do grupo Armorial - quinteto de influências musicais ibéricas, surgia outra opção musical vinda de Pernambuco: a Banda de Pau e Corda. Criada pelos irmãos Roberto e Waltinho Andrade, a banda teve três substituições neste período e gravou 5 elepês na RCA. Mas manteve o mesmo espírito musical, de forma que nacionalisticamente é importante ouvir o seu som - com músicas especialmente de seu último Lp (<< Pelas Ruas do Recife >>), no espetáculo que de hoje a domingo estará apresentando no Paiol. E segunda-feira, a << Parceria >> não será impossível, mas, sem dúvida, estará entre os melhores momentos ali já acontecidos: o poeta, produtor e admirável agitador cultural Hermínio Bello de Carvalho traz o grande Nelson Sargento, compositor da velha guarda e a Camerata Cariocam, num espetáculo de papo e som, que será uma espécie de << trailer >>, do grande evento de junho, no Guaíra: << Vivaldi & Pixinguinha >>. Mas sobre isto falaremos domingo, com mais vagas. Aqui apenas fica a observação: - Quem for, verá!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
23/05/1980

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