No dia 4 de junho, no Town Hall de Nova Iorque - um dos mais sofisticados teatros da Big Apple, com programação voltada exclusivamente a música popular (e no qual, em 15 e 16 de março de 1989, houve as apresentações do Som da Gente, patrocinado pelo Bamerindus), Egberto Gismonti abriu sua nova tournée internacional. O mais conhecido e respeitado instrumentista brasileiro está fazendo 59 concertos, percorrendo várias cidades dos EUA, Canadá e Europa. Egberto está acompanhado por Zeca Assumpção (contrabaixo), Nando Carneiro (teclados) e Jacques Morelembaum (violoncelo). A excursão se estenderá até 15 de junho. No ano passado, Egberto reduziu suas apresentações no Exterior - que chegavam até a 200 anualmente, por todo o mundo. Aos 45 anos, completados em 5 de dezembro, este fluminense do Carmo, fronteira com Minas Gerais - o que explica seu sotaque mineirado, repleto de "uais" - Gismonti tem 33 álbuns solos e mais duas dezenas de participações em parcerias, trilhas e projetos especiais, grande parte editada apenas no Exterior. A ECM, prestigiosa etiqueta do alemão Manfred Eicher, o tem entre seus selecionados artistas e o contrato lhe dá direito de fora da República Federal da Alemanha, negociar diretamente seus tapes. Por isto mesmo, sem ter representante há quatro anos no Brasil, o selo ECM saiu no novo disco de Gismonti, "A Dança dos Escravos", lançado pela EMI/Odeon, no final de dezembro do ano passado, a tempo de figurar em nossa relação dos melhores do ano. Simultaneamente, a Kuarup, de seu amigo Mário de Aratanha, lançou em elepê a trilha sonora que compôs para "Kuarup", o filme de Ruy Guerra, o cineasta moçambicano-brasileiro, para o qual já havia criado a música de "A Bela Palomeira", baseado em um conto de Gabriel Garcia Marquez, ainda inédito no circuito brasileiro. Estes dois álbuns, cada um a sua maneira, vieram mostrar novas faces de um talento esplendoroso, que desde que começou sua carreira há 23 anos (em outubro de 1968, no III FIC, se destacava com "O Sonho", defendida pelos Três Moraes) não parou de crescer. Pela grandiosidade, seriedade e, sobretudo, universalidade de sua obra, Gismonti - que só não é o homem dos 7 instrumentos porque toca mais de 12 - há muito merecia ser tema de livros e ensaios de profundidade. Inovador sempre, a cada novo disco tem uma surpresa, uma inovação, sempre para melhor, impedindo que seja carimbado em etiquetas classificatórias, embora nos anos 70, com trabalho como "Academia de Danças" (1974) lembrasse as experiências de fusão pop e clássico dos grupos progressivos, e, já nos anos 80, houvesse quem o tentasse ver como um representante da new age, a corrente instrumental diluente e funcional que recalca a forma musical num discurso sonoro aéreo e até insípido. Gismonti é ele mesmo - brasileiríssimo ao extremo apesar de sua universalidade, que antes de qualquer modismo em torno da defesa das populações indígenas mergulhava no Parque Nacional do Xingu, do que resultaria material para várias obras; ecologista, foi não só o compositor da trilha sonora, mas co-autor de "Sinal de Alerta", um filme de José de Anchieta, abordando os riscos nucleares, infelizmente inédito no circuito comercial. Compositor de uma riqueza imensa, tanto nas faixas de "Dança dos Escravos", como na trilha de "Kuarup", sente-se o autor que dá uma dimensão extraordinária - seja na faixa titulo de "Dança dos Escravos" - ou em "Salvador", que, como observou Luís Antônio Giron, estão ligadas por uma concepção de suíte. Um motivo tocado pela primeira corda em ostinado serve como tema para uma bateria de variações que se estendem por catorze minutos na primeira faixa e quatro na segunda, como se essa fosse a conclusão daquela. Ponteiros sincopados se entrelaçam ao jogo pontilhista de harmônicos, com Gismonti demonstrando uma capacidade orquestral no violão. LEGENDA FOTO - Gismonti: dois novos elepês na praça - "Dança dos Escravos" e a trilha sonora de "Kuarup".

Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:

Veiculo: Estado do Paraná

Caderno ou Suplemento: Almanaque

Coluna ou Seção: Música

Página: 24

Data: 13/05/1990

Enviar por e-mail

Obrigado por se interessar e divulgar os artigos de Aramis MIllarch.

OBS.: Nós solicitamos apenas seu endereço de e-mail para que a pessoa saiba de quem está recebendo. Nós não guardamos estes e-mails.

Seu Email: *

Seu Nome: *

Enviar Para: *

Insira múltiplos emails separados em cada linha OU separados entre virgulas.

Assunto da Mensagem: (Seu Nome) has sent you a message from tabloide digital

Mensagem: (Seu Nome) thought you would like to see the tabloide digital web site.

Sua Mensagem Pessoal: