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Jacob do Bandolim ganhou praça num sábado de choro

Ontem mesmo, tão logo recebeu das mãos do secretário Cleto de Assis, da Comunicação Social, a carta que a sra. Adilia Bittencourt, lhe enviou, através de Hermínio Bello de Carvalho, poeta, parceiro e um dos maiores amigos de Jacob do Bandolim, agradecendo o fato de Curitiba ter sido a primeira cidade do Brasil a dar o nome de seu marido a uma praça, o governador Ney Braga dirigiu também uma resposta àquela senhora, lamentando inclusive não ter comparecido à sua inauguração, mas lhe assegurando de que com a homenagem que a cidade de Curitiba prestou ao grande instrumentista e compositor, se fez apenas um "gesto de homenagem e amor" ao autor de "Noites Cariocas". No sábado, às 10h30min da manhã, no Jardim Schaffer, próximo à Cidade da Comunicação - no novo e elegante bairro onde todas as ruas tem nomes de compositores eruditos - a inauguração da Praça Jacob do Bandolim foi um acontecimento bonito. Especialmente convidados pelo prefeito Jaime Lerner vieram do Rio, além de Hermínio - consultor de projetos especiais da Funarte e que no ano passado colocou letras em 2 dos mais belos choros de Jacob ("Noites Cariocas" e "Doce de Côco"), Joel do Nascimento (bandolim) e, Maurício Carrilho (violão), integrantes da Camerata Carioca - grupo que nasceu em Curitiba, a 11 de agosto de 1979, quando, no Teatro Guaíra, houve a estréia nacional de "Tributo à Jacob do Bandolim", comemorativa aos 10 anos da morte do autor de "Vibrações". A praça é pequena, quase um play-ground e apenas uma pequena pedra, com uma placa onde se lê o nome do homenageado, não há citação das datas de nascimento (14-2-1918) e morte (13-8-69) e, sem indicação do nome do autor, seu filho, Sergio Bittencourt (1938-1979), parte da estrofe de "Naquela Mesa": "...a saudade dele está doendo em nós". Poderia, se tivesse havido tempo ou disposição, ser levantado um pedestal maior e, sobre ele, ser colocado um bandolim estilizado, que um de nossos escultores que trabalham em ferro - como os talentosos Renato Pedroso, Cleuza Salomão, Renato Good Camargo ou Jefferson Cesar, entre outros, por certo, fariam com imensa satisfação, independente de objetivos financeiros. A idéia foi levada, aliás, ao prefeito de Curitiba, mas, por razões que desconhecemos, a mesma não foi aceita. De qualquer forma, há, entre ruas com nomes de compositores como Wagner, Vivaldi, Bach, Beethoven etc. a "Praça Jacob do Bandolim". Ali, pela voz embargada de emoção de Hermínio, se ouviram as palavras que Adilia Bittencourt, transmitiu ao governador Ney Braga, em sua carta: "Ao dar a uma praça da Capital o nome de Jacob do Bandolim, pratica a municipalidade de Curitiba um ato que se ajusta perfeitamente à vocação de amor às coisas da arte que marca o homem paranaense e que se expressa concretamente na linha de ação dos que governam o Estado de apoiar as manifestações artísticas brasileiras. Impossibilitada de comparecer, por impedimento insuperável, faço meus representantes o poeta e amigo Hermínio Bello de Carvalho, a quem Jacob dedicava especial carinho, e os jovens músicos Joel Nascimento e Maurício Carrilho, integrantes da Camerata Carioca, conjunto cuja primeira apresentação teve os auspícios de entidades culturais paranaenses". Ao prefeito Lerner, Adilia Bittencourt também dirigiu uma carta, lamentando, "mais do que ninguém, que um problema familiar inquietante impeça minha ida para a inauguração da praça em Curitiba, amorosamente, fez construir com o nome do meu marido" e concluindo com a esperança de "que a Praça Jacob do Bandolim seja um local de encontro de todos aqueles que, como ele, tinham a música como religião". xxx Após a inauguração da praça, num almoço informal no Guilhobel, Joel do Nascimento e Hermínio Bello de Carvalho falaram ao prefeito Lerner, quase que por acaso, a idéia de criar em Curitiba, um Conservatório de Música Popular. Entusiasta como sempre à certas idéias, Lerner não só ali mesmo assinou a ata simbólica de fundação desta entidade, como, horas depois, após um verdadeiro sarau improvisado, com Joel e Maurício tocando músicas de Jacob. Pixinguinha e tantos outros mestres, antes de deixá-los no hotel, foi mostrar uma das casas históricas da cidade, que poderá servir para sede deste "Conservatório". Como em tantas vezes que se apaixona por uma idéia. Lerner aceitou a sugestão - que teve o secretário Cleto de Assis como testemunha, e, se não ficar, como tantos outros projetos, apenas num papel e numa boa intenção, pela falta de gente capaz para realizá-la, o sábado, 12 de abril, terá um significado histórico. A emoção do bandolim de Joel, 42 anos, herdeiro musical de Jacob e o violão perfeito de Maurício, 23 anos, ao qual se acrescentou a bela voz de Tina Camargo, fez com que o almoço se prolongasse por várias horas e que no habitualmente movimentado e barulhento restaurante do Guilhobel, repleto de nomes-notícias, se fizesse silêncio e se ouvissem muitos aplausos - de mesas onde estavam pessoas como o deputado Norton Macedo (para muitos, o nome que Golbery do Couto e Silva tem no bolso de seu colete para levar ao presidente Figueiredo, na eventualidade de Eduardo Portela deixar o Ministério da Educação e Cultura) e o advogado Aldo Almeida, diretor executivo da Fundação Teatro Guaíra, e um dos braços direitos do secretário Luiz Roberto Soares, na área da cultura. O musical, emocionante e inesquecível sábado em que Curitiba ganhou a Praça Jacob Pick Bittencourt seria perfeito, se não houvesse um triste evento: exatamente, quando o flautista Altamiro Carrilho e Waldir Azevedo - que não compareceram à inauguração da praça embora convidados (consta que, de um lado, por terem exigido Cr$ 90 mil, de outro, porque o convite não lhes foi formulado da maneira adequada) - apresentavam no Teatro Guaíra, um espetáculo produzido por Avelar Amorim, o Brasil todo recebia a notícia da morte de Abel Ferreira (Coromandel, MG, 15-2-1915). Ao saber da morte do grande amigo, clarinetista e chorão, Hermínio, Maurício, Joel e Antonio Telésforo (amigo de Bello de Carvalho e que também veio a Curitiba) não contiveram as lágrimas. E, entre a dor de saber que mais um amigo havia, ironicamente, naquele mesmo dia, deixado menor o nosso pequeno mundo musical, choraram sua ausência, da forma com que as pessoas muito humanas e grandiosas, o fazem - de New Orleans ao mundo: ouvindo em disco o som de sua clarineta, que, tal como o bandolim de Jacob, sempre será ouvido enquanto existirem pessoas de sensibilidade e amor às coisas de nossa MPB.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
8
15/04/1980

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