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Aramis

Leon, um garimpeiro das músicas perdidas

Se a revista Gráfica de Miran fez com que Curitiba se tornasse uma cidade referencial junto aos que se interessam em conhecer uma das mais importantes publicações internacionais na área da criação visual, todos aqueles que amam a música brasileira da época de ouro também passaram a ter um endereço paranaense. É que há mais de um ano que um idealista apaixonado pela nossa MPB, dono de um dos mais preciosos acervos em 78 rpm e lps do país, Leon Barg, vem fazendo da Revivendo uma etiqueta para colecionadores - que cresce a cada mês. Retornando do Rio de Janeiro, Leon confirma que apesar da crise constante e da retração do mercado não vai esmorecer: se no primeiro ano a Revivendo colocou mais de 20 elepês na praça, "este ano penso em triplicar". Material não falta: só em sua notável coleção, formada ao longo de quase 40 de seus 60 anos, Leon dispõe de preciosidades que provocam a inveja junto a meia-dúzia de outros apaixonados pela era dos discos de 78 rpm. Generoso, Leon decidiu dividir o seu tesouro: escolhe entre as raridades musicais só existentes nos frágeis 78 rpm, momentos marcantes das carreiras de tantos nomes da nossa música, entrega as fitas para Ayrton Pisco, no Rio de Janeiro - único especialista no Brasil em limpar ruídos das precárias gravações, faz a remixagem e, em prensagens cuidadas, bonitas capas, coloca os volumes em pontos específicos de venda, atendendo também a pedidos pelo correio (Rua Barão do Rio Branco, 28/6, 1º andar, Curitiba). Hoje, cada lançamento da Revivendo tem espaço nobre - páginas inteiras no caderno 2 do Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, Revista de Domingo e outras publicações. Nem por isto, as vendas são fáceis: as reedições que Barg promove não ficam apenas nos nomes mais famosos, consagrados, como costumam fazer alguns outros produtores de reedições - como José Costa Manso, da Collector's ou o Xico, da Moto Discos, ambos do Rio de Janeiro. Leon, com seus conhecimentos profundos de nossa música e, especialmente, possuindo gravações raríssimas, tem "revelado" cantoras e cantores que, tendo feito curtíssimas carreiras, não chegando sequer à fase do elepê, acabaram sendo esquecidas. Por exemplo, quem sabia de cantoras como Iolanda Osório, Laura Suarez, Sônia Carvalho, Laís Marival, Stefânia de Macedo, Abigail A. Paredes ou Helena Pinto Carvalho, que mesmo tendo gravado em 78 rpm, nos anos 30/40, acabaram esquecidas? xxx No novo pacote de lançamentos, Leon faz marcante garimpagem: com o título de "Grandes Duplas", traz gravações raríssimas da antiga Columbia (hoje Continental), no período de 1931/40, com intérpretes que em suas épocas tiveram popularidade mas, na maioria dos casos acabaram esquecidos. Por exemplo, interpretando um samba pouco conhecido de Noel Rosa ("Você Foi Meu Azar"), Arthur Costa (parceiro de Noel) faz duo com Neneo das Neves, numa gravação lançada em janeiro de 1932. Yolanda Visconti e Silvio Pinto? Existiu uma dupla formada por estes dois cantores, que no Carnaval de 1934 gravou a marchinha "Quem Criou o Caso?" Januário França e Henrique Costa, acompanhados por um "Grupo do Veneno", em novembro de 1931, gravaram "Bambas da Barra Funda". Neneo das Neves e Ildefonso Norat, em abril de 1933, registraram o cateretê "A Florzinha Que Te Dei", outra das curiosidades deste elepê-documento, no qual temos ainda outras duplas esquecidas: Murillo Caldas e Lolita França ("O Papai e a Filhinha", agosto/40); Dupla Verde-Amarela (?) ("Receita Médica", março/37); Zeilah Fonseca e Nilton Paz ("Você Gosta de Mim?", julho/40) e Irmãs Vidal ("Quando Bate a Ave Maria", novembro/37). xxx Mas há também duplas mais conhecidas. Por exemplo, Haroldo e Paulo Tapajós ("Eu Não Fiz Nada", de Heitor dos Prazeres, janeiro/33) e Joel e Gaúcho ("O Chapéu Também Diz", fevereiro/35). xxx Francisco Alves (1898-1952), o mais famoso cantor de sua época - e também o que mais gravou - já apareceu em três discos da Revivendo, e, neste mês, ganha mais um álbum de registros inéditos. Para as próximas semanas, aliás, estão previstos discos reunindo faixas inéditas (em elepês) de cantores como Orlando Silva (1915-1978), Roberto Paiva (Helin Silveira Neves, RJ, 8/2/1921), Augusto Calheiros (1891-1956), João Petra de Barros (1914-1947), entre outras vozes que encantaram nossos pais e avós - mas que são ignoradas hoje não só por desinteresse dos jovens, mas pelo simples fato de que seus discos inexistem no mercado. Embora contando com a colaboração de um dedicado pesquisador, Abel Cardoso Júnior, o maior especialista na obra de Carmen Miranda, uma das dificuldades de Leon é encontrar fotos de muitos artistas, desconhecidos, para as capas de seus discos, o que faz com que sua filha, a talentosa Laís, designer e assessora da Revivendo, tenha que usar toda a criatividade. Vozes de intérpretes como Paraguassu (Roque Ricciardi, 1894-1976) ou Vicente Celestino (1894-1968), dois cantores que mereceram recentes edições da Revivendo, com seleções das mais bem cuidadas, seria apenas nomes frios na bibliografia sobre o nosso cancioneiro se não fosse a iniciativa de Barg, que por seu trabalho sério e dedicado, merece todo o apoio. LEGENDA FOTO - Laís Barg: pesquisando fotos das cantoras esquecidas.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
07/04/1989

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