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Aramis

Luciano e seu grande amor pela nossa MPB

Na segunda-feira, 13, Luciano Lacerda pediu a um de seus filhos que fosse a loja da FUNARTE para adquirir os livros sobre João de Barro ("Yes, Nós Temos Braguinha", de Jairo Severiano), Capitão Furtado (de autoria de J. L. Ferreti) e Custódio Mesquita (de Bruno Ferreira), que haviam chegado há poucos dias. A grave doença que o mantinha na cama, não impedia que Luciano, 66 anos, mantivesse o interesse por aquilo que mais amou depois de sua família, ao longo de sua vida: a música brasileira. Enfermo, gravemente, Luciano não deixava de ouvir seus amados discos, especialmente da boa música instrumental e, pelo rádio de grande potência, acompanhar bons programas emitidos por prefixos de São Paulo e Rio de Janeiro. Desde terça-feira, às 14 horas, a radiola e o rádio de Luciano estão desligados. E a música brasileira perdeu um de seus mais apaixonados cultores. xxx Lapiano, nascido em 26 de agosto de 1920, Luciano Lacerda formou-se em Odontologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, na turma de 1942. Entretanto, jamais faria uma obturação ou extrairia um dente: a morte de seu pai, o fez, ao lado do irmão José, integrar-se na direção do engenho de mate da família que, mais tarde se fundiria no grupo Moinhos Unidos Brasil-Mate. Industrial por mais de 30 anos, posteriormente presidente da Junta Comercial do Paraná (1980/83), Luciano sempre teve uma grande paixão: a música brasileira. Desde os 13 anos, começou a colecionar discos e assim formou uma discoteca preciosa, em termos de raridades em 78 rpm e os melhores Lps do que saiu desde a introdução desde sistema de gravação nos anos 50. As suas aquisições, somaram-se doações de amigos e compras de acervos particulares, de forma que era, até há pouco, um dos únicos proprietários de uma organizada coleção de 78 rpm, hoje difíceis de serem manuseados e mesmo ouvidos. Generosamente, Luciano não só foi um dos herdeiros a convencer seus irmãos, cunhados, sobrinhos e outros parentes a doar a centenária mansão da família para se transformar numa casa típica da Lapa, como ofereceu também sua coleção de discos a mesma. Restaurada pelo Patrimônio Histórico, o solar dos Lacerda faz parte hoje do roteiro turístico da Lapa e ali está o precioso acervo, em 78 rpm, que Luciano reuniu ao longo de toda sua vida. xxx Violonista de méritos, com acordes modernos - soube entender a importância da batida que João Gilberto trouxe com "Chega De Saudade" (1959), amigo de virtuoses como Paulinho Nogueira e seresteiros como Paulo Tapajós, Luciano participou ativamente dos quatro encontros de música popular que organizamos a partir de 1976. Bem informado sobre tudo que se relacionava a música brasileira, memória excelente, generoso como poucos em ceder cópias de preciosidades de sua coleção, Luciano ajudou muitos pesquisadores na produção de livros e discos. Sempre ao lado de sua esposa, Vera, pai de 8 filhos e 17 netos, Luciano é mais uma pessoa generosa, e sobretudo, amável e carinhosa, que deixa menor o nosso mundo. Por certo, hoje ele já deve ter reencontrado Pixinguinha, Abel Ferreira, Dolores Duran, Maysa e tantas outras pessoas lindas que sempre soube cultuar. E, sem modéstia, com seu violão espiritual, pode fazer com o Garoto, um belo dueto de "Duas Contas", ou com Cartola - que ele conheceu e ficou amigo, numa noite inesquecível, em nossa casa - acompanhá-lo num daqueles sambas que falam de amor, de rosas & da vida.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
2
19/04/1987

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