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Maranhão, o homem de nosso teatro amador

Em dezembro, o Teatro do Estudante do Paraná apresenta uma nova peça - "A Morta Viva". Após uma curta temporada no miniauditório Glauco Flores de Sá Brito, estará sendo levada a Feira de Santana, na Bahia. Seria apenas um pequeno registro, se não tivesse um detalhe: significa que o mais antigo grupo de teatro amador do Paraná continua em atividade - e com ele também o seu fundador e principal animador, Armando Maranhão, 61 anos, completados dia 18 de junho último, 42 de atividades artísticas. Em sua modéstia nordestina, tranqüilo, Maranhão é discreto: "Há muito que me acostumei a fazer meus trabalhos no silêncio, sem alardes, mantendo a tradição que recebi do Paschoal (Carlos Magno, 1906-1981, fundador do Teatro do Estudante do Brasil, diplomata e grande animador cultural brasileiro entre os anos 30/60). Desde que chegou a Curitiba, no verão de 1947 para aqui estudar engenharia - "já que não existia curso de arquitetura, meu grande sonho", Armando Maranhão começou a fazer teatro e nunca parou. Maranhense de Caxias, filho de uma família humilde, reconhece que foi devido à paixão de seu tio, João Castelo Branco de Almeida, que também se interessou pelo teatro. "Meu tio veio para o Rio e, sem dinheiro, dormia nos bancos da praça. Um dia descobriu que seu companheiro de "hotel sobre as estrelas" era Procópio Ferreira. Nasceu uma grande amizade: Procópio se tornaria o maior ator de sua geração e meu tio, para sobreviver, entrou no Banco do Brasil. Fez carreira e só não chegou a presidente porque morreu jovem. Mas com isto deixou de sonhar em ser ator e limitou-se a escrever nove peças, cujos originais se perderam". Mas foi o tio João que estimulou o adolescente Armando a estudar no Sul. Veio até o Rio, ficou ali uns dias e depois, com três outros jovens, veio de automóvel para Curitiba. Só que ao invés de engenharia, Maranhão acabou fazendo inicialmente o curso de Belas Artes na recém-fundada Embap e, posteriormente, foi um dos nove inscritos no primeiro (e único) curso de escultura. "O professor era Erbo Stenzel - o grande escultor de obras como o homem e a mulher nua da Praça 19 de Dezembro. Exigentíssimo, os alunos foram desistindo. Ao final, só ficamos eu, o Nilo Previde e o Abraão Assad. Previde trocou a escultura pelas gravuras, Abraão foi estudar arquitetura e eu fui o único a receber o diploma de escultor. Registrei-o no MEC, e o curso acabou desativado". Mais tarde, Maranhão faria também o curso de filosofia na também recém-formada Universidade Católica, mas, para sobreviver, trabalhou durante mais de 20 anos como desenhista no Instituto de Geografia, Terras e Colonização. Depois passou para a área da cultura e hoje, com 37 anos de serviços, é o chefe da Divisão de Preservação e Documentação da Fundação Teatro Guaíra. Apesar de um espaço reduzido, ali vem reunindo centenas de fotografias, programas, cartazes e mais de 50 mil recortes com registros da história do teatro do Paraná. Já com o tempo de aposentadoria, preocupa-se de não existir ninguém disposto a continuar este seu trabalho de guardião de nosso passado cênico. xxx "Espectros", de Henryk Ibsen (1828-1906), foi a peça com que, em 1948, estreou o Teatro do Estudante do Paraná, até a década de 60 ligada à atuante União Paranaense dos Estudantes. O grupo sobreviveu à entidade e, até hoje, Maranhão mantém o título e orgulha-se de nos 87 espetáculos nos quais dirigiu ou atuou, terem passado mais de 100 atores e atrizes, "muitos dos quais hoje são nomes nacionais". Maranhão viu surgir e desaparecer dezenas de outros grupos, acompanhou as transformações da vida cênica no Paraná. Foi PCM quem o incluiu, ao lado de outros jovens amadores de teatro, como Theresa Rachel e Othon Bastos, numa caravana de estudantes que em 1952 passou um semestre na Europa, visitando vários países e tendo aulas com nomes notáveis das artes cênicas - inclusive Sir Laurence Olivier, em Londres. Participando de todos os festivais de teatro amador promovidos por Paschoal e outros eventos - como A Barca da Cultura -, que percorreu 40 cidades ribeirinhas ao Rio São Francisco, Armando e seu grupo - do qual fizeram parte a excelente Lala Schneider e a bela Rosinha Azevedo, uma espécie de sex symbol marilyniana na época -, colecionaram premiações. Um trabalho que, mesmo tendo sido reduzido nos últimos anos, não foi esquecido. Prova de que como professor de teatro do Colégio Estadual do Paraná anualmente monta uma prova pública que, posteriormente, encena regularmente, este ano levará um de seus nove textos, "A Morta Viva", à Bahia, "lembrando dos tempos em que viajava pelo Brasil". xxx Em afetuoso depoimento ao projeto Memória Histórica do Paraná, Maranhão lembrou fatos de sua longa vida artística, os tempos e pessoas do saudável teatro amador que movimentava a cidade nos anos 50 - com inúmeros nomes que viriam a se destacar em vários setores, alguns fazendo carreira de ator, "o que sempre nos dá uma grande alegria". Cita, como exemplo de um talento jovem, que começou sob sua direção, o caso de Pedro Paulo, hoje em escalada nacional, atualmente fazendo "Meu Reino por um Cavalo", ao lado de Paulo Goulart. "A maior alegria é quando se vê um discípulo galgar um espaço nacional, com talento merecidamente reconhecido". LEGENDA FOTO - Armando Maranhão, na foto de 1960, quando fez "Entre Quatro Paredes", de Jean Paul Sartre.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
24
16/11/1990

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