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Aramis

As memórias de Niven e de outros artistas

O boom de biografias, memórias e mesmo perfis (nem sempre laudatários) de quem é (ou foi) importante tende a crescer neste ano. O resultado favorável de uma dezena de biografias de artistas, lançadas no ano passado anima as editoras a continuar investindo no gênero - que é fértil. Basta dizer que não há um mês sem que saiam novos livros de astros do cinema, cantores famosos ou mesmo realizadores - seja de filmes, teatro ou compositores e maestros. Mas é no cinema que as biografias tem seu filão maior, livros sobre artistas sofisticados - como Cary Grant (de Werner Harris, editora Rocco), ou Fred Astaire (por Bill Adler, edição da Casa de Maria/Ao Livro Técnico), ou mesmo demolidoras revisões, como a que foi feita por James Spada sobre Grace Kelly (editora Record) ou os implacáveis livros de Albert Goldman sobre Elvis Presley e John Lennon - ainda inéditos em português. Remexer a roupa suja na vida de gente famosa é um marketing lucrativo que nem Frank Sinatra ("His Way", de Kitti Kelley, Record) escapou das bisbilhotices. xxx O mineiro Paulo Barbará, 52 anos, que na segunda metade dos anos 50 morou em Los Angeles e foi motorista da atriz Susan Hayward (1918-1976), embora não a mencione pessoalmente em seu livro de memórias "Os Dourados Anos Cinzentos" (editora Francisco Alves, 134 páginas). Por cavalheirismo ou timidez, Barbará omite o nome de Susan - com quem chegou a ter uma noite de amor (após uma crise que a atriz enfrentava, ao saber que uma de suas filhas, aluna da Ucla, havia sido presa devido ao uso de drogas), e que trata cerimoniosamente. São poucas, aliás, as referências pessoais feitas no livro de Barbará que, em seus anos de Los Angeles, conviveu com o jovem Francisco Dornelles (ex-ministro da Fazenda, hoje deputado federal), na época funcionário do Consulado brasileiro e o maestro Remo Usai, então fazendo curso de música para cinema (no Brasil, Usai seria um dos mais requisitados compositores de trilhas sonoras). A fragilidade com que Barbará tratou suas memórias, sem aprofundar-se em nenhum momento - e ficando apenas no descritivo pessoal, torna fraquíssima esta contribuição à presença de um jovem brasileiro (tinha na época 23 anos) na meca do cinema. O ator que merece maior atenção - e que de certa forma se tornou seu amigo - é David Niven e Shirley Maclaine é lembrada rapidamente, de um lado pitoresco: recém-chegada da Broadway, iniciando carreira no cinema (seu primeiro filme foi "O Terceiro Tiro", 57, de Hitchcock), uma noite saiu com um executivo de uma produtora, que desejava contratá-la, mas o ciúme da esposa que julgou Shirley como mais um caso do infiel executivo, fez a cena acabar como uma comédia pastelão num dos mais elegantes restaurantes de Los Angeles. xxx Quem desejar conhecer a melhor biografia de David Niven (Kirremuir, Escócia, 1907 - Gstaad, Suíça - 1983) tem agora a oportunidade: "O outro lado da lua" (428 páginas, NCz$ 19,00) é uma bela biografia do ator que durante quase 40 anos se caracterizou como o herói refinado, sofisticado, sempre com o "british touch", em sua longa carreira no cinema americano e inglês. De certa forma, a biografia de Sheridan Morley, crítico de teatro e editor de arte da revista "Punch" desde 1975, e que conheceu Niven profundamente, é um complemento aos dois livros de memórias que Niven escreveu, ambos lançados no Brasil há anos: "A Lua é um Balão" e "Cavalos de Raça, Mulheres de Classe". Autor de várias biografias, inclusive uma definitiva sobre Noel Coward, Sheridan Marley soube dar à vida de Niven um tratamento atraente, evitando a simples descrição que torna enfadonho tantos livros do gênero.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
11/03/1989

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