No Festival da Terra "Classe" é a premiada
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de agosto de 1987
Não foi intencional nem ideologicamente planejado mas acabou sendo o "Festival da Terra". A projeção de realizações em diferentes bitolas de obras que focalizam a questão da terra, sua ocupação e seu domínio, acabou dando um toque político ao II Festival de Fortaleza do Cinema Brasileiro, encerrado na madrugada de domingo, 9, com a projeção de "Jubiabá", de Nelson Pereira dos Santos - presente e homenageado na ocasião.
A conseqüência lógica da preocupação da questão da terra, vista de forma sincera e política em alguns filmes em exibição, cristalizou-se na dupla premiação ao curta metragem "A Classe Roceira", da curitibana Berenice Mendes.
Sem pretensões de ter premiações - tal a qualidade dos curtas em disputa dos troféus "Abrão Benjamin" e "Samburá", Berenice, 27 anos, advogada da turma de 1983 e que optou por fazer cinema teve a primeira surpresa ao ser anunciada a escolha de seu filme para o troféu "Samburá", oferecido pela Fundação Demócrito Rocha, do jornal "O Povo".
Criado pelo artista plástico Descartes Gadelha e com o nome de "Samburá" em homenagem a um dos primeiros cinemas de Fortaleza, o troféu deveria ser concedido também a um longa-metragem. Entretanto, como o Festival não foi competitivo nesta categoria, se restringiu apenas a duas premiações: o melhor filme curta, para "A Classe Roceira" e ao cineclubista cearense Darcy Costa, um dos batalhadores pela cultura cinematográfica naquele Estado.
Quando foi anunciado por Mônica Silveira e Ricardo Guilherme o troféu "Abrão Benjamin", ao melhor filme curta, Berenice quase chorou:
- "Não acredito!"
E feliz da vida, subiu ao palco para receber o troféu criado em louvor a outro pioneiro da crítica cinematográfica cearense - e que foi instituído para premiar os melhores na área do curta-metragem.
Se houvesse premiação para longa-metragem, certamente "Fronteira das Almas", do cearense Hermano Penna, primeiro filme brasileiro a abordar os conflitos de posseiros, meeiros e fazendeiros de Rondônia, levaria vários troféus. Foi o filme de maior impacto no Festival de Fortaleza, merecendo inclusive uma segunda exibição, na manhã de sábado, 9, a pedido do próprio governador Tasso Jereissati.
A questão da terra, foi enfocada também em curtas como "Quem Matou Elias Zi", de Murilo Santos, indiretamente em "Fibra", de Fernando Beléns e diretamente tanto nos longa-metragens "A Igreja dos Oprimidos", de Jorge Bodanski e Helena Salem; "O Caldeirão de Santa Cruz do Deserto", de Rosemberg Cariry (mostrados "hors concours" como no vídeo "Canoa Quebrada", de Paulo César Farah. Mesmo um filme criado a partir de uma lenda como "Ele, o Boto", de Walter Lima Jr., também trouxe condicionantes sociais, ligados a posses da terra - o que permite que se visse nos filmes que tiveram suas primeiras projeções em Fortaleza, diferentes leituras de uma questão atualíssima. Tema para ser desenvolvido em amplas discussões e visões destes filmes realizados com sinceridade e coragem sobre problemas brasileiros.
LEGENDA FOTO - No palco do Cine São Luiz, em Fortaleza, os apresentadores Mônica Silveira e Ricardo Guilherme, anunciam a vitoriosa do Festival: a curitibana Berenice Mendes.
(Foto de José de Anchieta)
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