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Aramis

O folclore da Câmara nossa, segundo Rafael

O vereador Rafael Grecca de Macedo, o mais atento cão-de-guarda da memória curitibana, começou a reunir as mais pitorescas estórias do folclore político da Câmara, para um futuro livro, destinado a ter tanto sucesso regional como as ótimas antologias do deputado federal Sebastião Nery. Como bom pesquisador, Rafael não vai limitar-se ao ( risco) folclore comtempor6aneo, mas, ouvindo velhos curitibanos que passaram pela nossa Câmara, incluirá estória do passado, já que o Legislativo Municipal sempre foi um espaço de "causos" bem humorados e curiosos. xxx Entrevista à revista "Quem", edição que está nas bancas, Rafael antecipa algumas dessa estórias envolvendo colegas do Legislativo. Estórias tão deliciosas que merecem ser contadas também aos leitores de O ESTADO DO PARANÁ, que não folhearam ainda as páginas de "Quem". xxx "Vou começar pelo vereador Ivan Ribas, bacharel furibundo, iracundo, que adora repisar, ou repassar, meus discursos. Fazendo citações, ele jamais dispensa de me chamar de "fariseu". Naturalmente, deve entender Sua Excelência que eu não vivo aquilo que digo, ou coisa parecida. Ele tem tiradas muito engraçadas. É, realmente, um tipo pitoresco dentro da Câmara - eu diria, brejeiro. Pois é desse brejeiro vereador, Ivan Ribas, um episódio ocorrido este ano. Ele, que se diz identificado com as lutas populares, encontrava-se na incômoda posição de - cerrando fileiras com o prefeito - ter que votar contra o aumento para os professores e funcionários municipais, contra o aumento que nó propusemos, que não era de 60 mas de 90 por cento - ou de 70% em julho e 15% em outubro, de acordo com a arrecadação do município. Sua Excelência rebatia, então, minha defesa de que o funcionalismo deveria ganhar de acordo com o INPC, por que assim era em abril de 83, quando o governo passou para as mãos do PMDB. Esta seria uma postura de coerência, de verdadeira "praxis" democracia do PNDB posto em Palácio, sobretudo porque eles votaram o decreto 2065, que assim determina. Feita toda a argumentação, às vezes com pouco de doce irresponsabilidade da oposição (mas somavam conosco outros vereadores, se havia feito uma projeção e achava-se que talvez houvesse possibilidade do prefeito honrar um aumento maior, de um percentual mais elevado), o vereador Ivan Ribas foi à tribuna. Tenho a impressão de que tentou estabelecer um paralelo entre minha pessoa e a de Maria Antonieta - que disse ao povo que não comesse pão, mas brioches. Eu, realmente, acho que estou longe da impáfia daquela austríaca. Talvez tenha dela algum remanescente da antiga cortesia francesa...Não sei em que Sua Excelência me viu parecido com Maria Antonieta. Mas o engraçado foi que ele disse: "Maria Antonieta, casada com Luiz XIV, no seu palácio das Tulherias!". E foi o verdadeiro "samba do crioulo doido", como observou, depois, o vereador Horácio Rodrigues. Como todo mundo sabe o Luiz XIV era o avô do marido de Maria Antonieta, e Tulherias é o palácio que Napoleão fez erguer para si. xxx Outra estória deliciosa contada por Rafael: "Uma outra vez, fizemos um voto de congratulações ao Pedro Scherer e seus companheiros de Clube de Observadores de Aves, porque eles editaram um catálogo de Oitenta e tantas aves que vivem nos campos da região de Curitiba. Eu defendia o apreço da Câmara a esse Clube de Observadores de Aves e tive a unanimidade da casa, com exceção do vereador Horácio Rodrigues, que é muito espirituoso. - Por que votou contra? - perguntei. - Por que sou contra frestradores. xxx Sobre a ida de frei Miguel à Câmara para receber o título de Cidadão Honorário, proposto por Rafael, conta este: "Ao frei Miguel atribuem-se poderes de exorcismo, de domínio sobre o mal. O fato é que a Câmara - aqueles em que suspeitamos que o mal possa residir - não vieram à festa de frei Miguel, certamente com medo de ser fustigados pela água benta ou pela radiosa luz que emana de sua figura". xxx Depois de falar dos projetos absurdos e ilógicos apresentados, inclusive o do vereador Jorge Bernardi, que queria uma rua chamada "Granada"(sem explicar se se tratava da pedra, do instrumento de ação militar, da fruta, da canção de Agostin Lara, da cidade da Espanha ou da ilha do Caribe), Rafael conta outra passagem envolvendo Bernardi " Vou falar do dia em que Bernardi vestiu duas gravatas sobrepostas. Ele não havia comparecido à Câmara, com o traje protocolar. Isso já havia sido objeto de uma questão de ordem, levantada no início do nosso mandato, quando o presidente Moacir Tosin determinou que, por traje passeio, entende-se: paletó, gravata, colarinho: e, para senhoras, o tailleur ou a saia e blusa. Muito estranho é que justamente no dia em que discutia a questão do aumento do funcionalismo municipal, o vereador Jorge Bernardi, para tentar ocupar o tempo e esvaziar a discussão - e por isso recebe nossas censuras, porque, de resto, não íamos prestar atenção na sua indumentária - subiu à tribuna de peito aberto, com uma jaqueta de couro, calça lee, usando uma gravata borboleta que tomara emprestado de um dos garçons da casa. Como se levantasse uma série de questões de ordem, entre vários outros vereadores, de que tipo de traje Sua Excelência estaria usando - se seria um black tie ou um traje passeio completo - ele tomou emprestada uma gravata do vereador Neivo Beraldim e usou uma incrível superposição de gravatas, o que de certo faria a "delícia" desse estilistas de moda italianos e franceses que mandam que se superponham os adereços. É lamentável que ele não seja o manequim apropriado e é lamentável, também, que a Tribuna Bento Munhoz da Rocha não seja uma passarela para tal. Por último, ele acabou descendo da tribuna e nós ficamos dispensados de ouvir suas perorações em favor das injustiças para com os funcionários municipais. Ainda nessa solene sessão, o vereador Jorge Bernardi fazia repetidos apartes, tentando mostrar seus gibis, dizendo que iria fazer um gibi com a vida do Barão do Serro Azul, outro com a história do Contestado. Daí, eu lhe dei o seguinte repto: - Vereador Jorge Bernardi, com respeito aos seus gibis, acho que, nessa discussão de salário, eles entram como Pilatos no Credo. Não deveriam estar, jamais, nessa discussão. Aliás, entram como Vossa Excelência, no seu Cartão de Natal, entrou no presépio: colocou-se ao lado de Jesus, de Maria e de José. Não era nenhum dos três: não é da Sagrada Família. Força-nos a pensar, pela sua postura de hoje, fiel ao prefeito e sempre abanado a cabeça em sinal de afirmação, que Vossa Excelência era a própria vaca de presépio. E isso fez com que o meu repto fosse suprimido anais, sob ameaças de arranhões na ética parlamentar e na compostura necessária à sessão. Depois expliquei ao presidente e aos demais vereadores, inclusive a Bernardi, que em nada queria desmerece-lo. Simplesmente usava a imagem popular de que a vaca de presépio, sobretudo aquela do presépio mecânico - e ele está na máquina do poder, na máquina administrativa - é aquela que concorda sempre.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Nenhum
01/08/1984

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