O recesso literário de dona Flora, a cronista
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 13 de maio de 1990
Autora de dez livros de crônicas - nas quais sempre falou de fatos, pessoas e coisas, numa linguagem simples, afetiva e de grande comunicação - dona Flora Munhoz da Rocha parou de escrever regularmente nos últimos meses. Apesar de dizer que sempre teve facilidade na elaboração de seus textos - "para mim, as palavras sempre saíram com rapidez e escrever nunca foi difícil" - dona Flora tem espaçado suas colaborações na imprensa.
Rigorosa na seleção dos textos que ganham permanência em forma de livros, ela não quer estimular antologias com trabalhos que, anteriormente, foram descartados.
- "Ao contrário, acho que em livro, a crônica adquire uma maior responsabilidade e permanência, ao contrário da rapidez do jornal diário".
Com humor, sem esconder a idade, dona Flora mostra-se animada:
- "Ao completar meus 79 anos, dentro de 4 meses, já vou começar a pensar nos 80. Isto se Deus me der força e, especialmente, saúde. O importante é viver a vida, sem representar uma carga a ninguém".
Mãe de 5 filhos - o primogênito, Caetano, completou há pouco 60 anos, 17 netos e 11 bisnetos, dona Flora procura acompanhar os novos tempos, entender a mudança de comportamento. Assim já nem se assusta mais com descasamentos.
- "Dos meus 7 netos casados, seis já o fizeram por mais uma vez". Entre as netas, Renata, filha de Mitzi - esposa do ex-ministro Rafael de Almeida Magalhães - é a segunda esposa do cineasta Cacá Diegues e tem também feito filmes, inclusive curta-metragens. Há dois anos, houve quase uma tragédia: sua filha, que também se chama Flora, caiu pela janela do apartamento da Avenida Vieira Souto, mas apesar da queda de quase dez metros, não sofreu nada.
- "Milagre ou não, nem sei explicar - comenta dona Flora. Também as crianças, nesta idade, tem um anjo da guarda super-ativo. E na queda são como gatos: possuem sete fôlegos".
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Dona Flora, como apreciadora de bom teatro, também escreveu uma peça: "Dois mais Um". Em 1953, Dulcina de Moraes e Odilon gostaram tanto do texto que pretendiam montá-lo. Em sua integridade, de jamais deixar qualquer envolvimento familiar interferir com o seu cargo, o governador Bento foi contrário: é que o casal de artistas havia inaugurado o pequeno Auditório Salvador de Ferrante do Teatro Guaíra, com uma adaptação de "Os Inocentes", de Henry James, e a montagem da peça da esposa do governador, poderia parecer como uma troca de favores. Entretanto, Dulcina e Odilon chegaram a fazer uma leitura da peça, com cenários improvisados, vista por convidados especiais.
Hoje, 37 anos depois, dona Flora é crítica em relação a sua experiência de dramaturga inédita:
- "O tempo passou e a peça talvez tenha perdido a sua oportunidade". Entretanto, não custaria alguém examinar o texto e verificar se a mesma não merece uma montagem. Afinal, são raros os textos inéditos de autores paranaenses e o grande José Maria Santos se queixava da falta de originais para suas montagens.
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