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Aramis

O Super 8 ainda resiste no Festival de Gramado

Do "boom" superoitista que no início dos anos 70 surgia como uma nova e barata opção para alimentar os sonhos de cineastas deste nosso mundo ocidental, restou um aprendizado para os jovens mais talentosos que, pacientemente, nas tripinhas, da reduzida bitola, tiveram chance de desenvolver seus primeiros sonhos de criação cinematográfica. Ainda não foi feito um levantamento do ciclo de Super 8 no Brasil - sua importância, seus pontos altos e, principalmente, dos cineastas que hoje, na faixa dos 30 anos para cima, tiveram nos festivais que se multiplicavam por todo o país, oportunidade de apresentar seus primeiros projetos visuais. Hoje, são raros os que se dedicam ao Super 8: a Kodak, Agfa e Fuji, entre as multinacionais que dominam o mercado de filme virgem, desativaram, ao menos no Brasil, o fornecimento do filme Super 8 e com a chegada do vídeo, mais econômico, prático e instantâneo do que é registrado, o Super 8 parece ter sido sepultado de vez. Parece, mas não foi e uma das provas de resistência é o festival que, há 12 anos, realiza-se paralelamente ao de Gramado. Há os que dizem ser o último dos festivais - neste país que já chegou a ter, nos anos 70, mais de 30 eventos competitivos (inclusive em Curitiba, oficial, com grande promoção nacional). Em São Paulo, Abrão Bermann, através do Grife, se tornou o grande animador da bitola, ainda acontecem algumas tentativas e em São Luis, paralelo a jornada de Curtas-Metragens, que Euclides Marinho vem promovendo, com o maior sacrifício, há 12 anos, também há espaço para o Super 8. xxx Em Gramado, a partir de 1976, o Festival de Super 8 foi um dos fatores que estimularam os gaúchos a desenvolver um forte núcleo cinematográfico, que passando do Super 8 para o 16mm, atinge hoje o profissionalismo do 35mm - formando o terceiro eixo cinematográfico do país, conforme relataremos em próximo comentário. "Meu Primo", uma das primeiras produções de Super 8, em longa-metragem, aglutinou vários jovens, que sonhavam em fazer cinema, em torno de Nelson Nadotti, hoje com 30 anos, experiência profissional em seis longas, e que com "A Voz da Felicidade", ganhou o Kikito de melhor direção, na categoria de curta, 35mm, nacional, há uma semana. Nelson é apenas um exemplo de cineasta gaúcho que teve suas raízes no Super 8, bitola com mais de meia centena de títulos, entre curtas, médias e longas, realizados principalmente, na região de Porto Alegre - e que acaba de ser lançado em vídeo por uma distribuidora gaúcha. "Deu Pra Ti..." foi também uma espécie de piloto de "Os Verdes Anos", de Giba Assis Brasil e Carlos Gerbasse, prêmio revelação na edição 1984 do festival de Gramado, no qual concorreu na categoria de longa-metragem nacional, obtendo posterior lançamento nacional com relativo sucesso - e catapultando outras produções gaúchas. xxx Nos últimos 3 anos, a inscrição para o festival de Super 8 em Gramado é independente de seleção, já que a produção, naturalmente, se reduziu em mais de 70% - e muitos filmes que alí tem concorrido são realizações feitas no início dos anos 80. "De qualquer forma é ainda uma janela para quem fez filmes nesta bitola e deseja mostrá-los", explica Ricardo Osório, 34 anos, diretor da Agacine-Associação gaúcha de Cinema, que se encarregou sempre de organizar o evento. Este ano concorreram 39 filmes, de realizadores gaúchos, maranhenses e paulistas. Distribuídos entre documentários e ficção, houve apenas um filme de animação ("O que os olhos não vêem, o coração não sente", de Thaís Affonso e Carlos Fonseca Vicente, de São Paulo). Mesmo com um nível de qualidade bastante baixo - foram raros os filmes mais interessados - o júri presidido por Jaime Sá e Aloísio (professor de publicidade e propaganda), Ricardo Osório (do Departamento de Cine Foto Som da Sogipa) e o crítico Goida (Hiram Goidisch), do "Zero Hora", conseguiu encontrar méritos para premiar três trabalhos: "Acredite", de Lisane Cohem, de Porto Alegre, na categoria de ficção; "Gota de Teatro", também da gaúcha Lisiane, em parceria com Caroline Drehmer e Miriam Schreiner, documentário; engenheiro civil Sérgio Concilio, 32 anos, de São Paulo, e sua esposa, Vera Senise, competindo com "Viva República", ficção, 40 minutos, obtiveram menção honrosa. De todos os realizadores foram os únicos presentes, pois o Festival não tem recursos para convidar os cineastas nesta bitola, limitando sua ajuda aos membros dos júris (há alguns anos Francisco Alves dos Santos, da Cinemateca do museu Guido Viaro, fez parte do mesmo, época em que o nível dos filmes em competição era bem mais alto). Para quem se dispõe a acordar cedo e assistir aos Super 8 projetados num dos salões do Hotel Serrano, há curiosidades: "Film-Noir", dos paulistas Benjamin e Jerônimo Cafalli, é uma piada de 30 segundos, focalizando justamente negativos expostos à luz. Já o paulista Humberto Belvedere Filho, apaixonado pela obra de Rod Serling, nos últimos 4 anos fez nada menos que cinco Super 8, na linha do "Além da Imaginação": a Gramado levou os capítulos "Mais Um Beijo Querida" e "Boulevard", da série que chamou de "Zona de Luz Indefinida". Se o curtíssimo Super 8, mesmo quando subamadores, são suportáveis, difícil é resistir a documentários e, especialmente, ficções que ultrapassam a 10 minutos e são realizados de forma precária. Jaime Leite de Sá, 54 anos, presidente da Agacine, defensor do Super 8, lembra uma recente notícia enviada pelo jornalista Hélio Belik, correspondente da Folha de S. Paulo, em Nova Iorque, no qual informava que em maio último seria realizado o I Festival Internacional de Super 8, com duração de 2 semanas e mais de 50 filmes vindos de 20 países da Europa, Ásia e América Latina. Entre os mais esperados estavam os da Venezuela, que nos últimos anos desenvolveu uma dinâmica industrial de Super 8, e dos EUA, que estão produzindo filmes em Super 8 para TV, com excelentes resultados. O Brasil este ausente do festival - pois além da falta de fita virgem, não há também mais fitas adesivas para colar os filmes. Francisco Bettaga Neto, diretor do MIS-PR, e que mesmo sem ter partido para a realização do Super 8, sempre foi um defensor desta bitola, tem a mesma opinião de Jaime Sá, em relação ao fato do Super 8 não ter morrido, "o menos nos países desenvolvidos". O 8mm standard e o 9,5mm, inclusive, formato europeu, continuam vivinhos. Aqui é que o Super 8 foi morto. Mais um "assassinato cultural"? Sim, mas em função do vídeo 8, que até a Kodak produz, e interessadíssima em difundí-lo. LEGENDA FOTO - "A Voz da Felicidade", com Isabel Ribeiro: o premiado curta de Nelson Nadotti, ex-superoitista.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
02/07/1988

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