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Aramis

Os filmes síntese do universo de [Hitchcok]

COM lançamento de "Festim Diabólico" (Cine Lido I) e "A Janela Indiscreta" (Cine Condor), mais dois importantes filmes do mestre Alfred Hitchcock (1899-1980) chegam para que novas platéias conheçam momentos da melhor voltagem criativa do chamado mestre do Suspense e, os mais velhos, possam reavaliar até onde a força do velho inglês resiste ao tempo. Do pacote de filmes que Hitch preservou de desgastantes reprises e exibições na televisão, "Festim Diabólico" é o mais antigo. Realizado em 1948, com base na peça "Rope's End" de Patrick Hamilton teve a originalidade de ser um filme praticamente sem cortes, com apenas dez seqüências. Um projeto que nunca voltou a ser tentado por outro cineasta e que, há 36 anos, funcionou com grande perfeição. Cinco anos antes, em "Um Barco e 9 Destinos" (Liffe Boat, 1943) já havia aceitado outro desafio arriscado: toda a ação se passava em uma lancha de náufragos navegando à deriva num mar montado em estúdio. Em "Festim Diabólico", entretanto, seu desafio foi mais longe: um filme praticamente num plano único, rompendo com a velha teoria sobre a fragmentação de planos e as imensas possibilidades que tem a montagem no que se refere a potencializar uma história. No longo depoimento que prestou ao seu mais ardoroso fã, o crítico e cineasta François Truffaut (1932-1984), Hitch disse que "a obra teatral se interpretava no mesmo espaço de tempo em que se desenrolava a ação; era contínua desde que o telão abria até que se fechasse, e eu me perguntei: "Como pode ser isto resolvido cinematograficamente?" A resposta era, evidentemente, que a técnica do filme devia também ser contínua e que não deveria haver nenhuma interrupção dentro de uma história que começava às 19h30min e terminava às 21h15min. Foi então que concebi esta idéia, um pouco louca, de rodar um filme que não teria mais do que um só plano". A idéia de limitar um filme em que a ação decorre exatamente no tempo exato da projeção viria a ter outros positivos exemplos, dos quais o mais clássico é "Matar ou Morrer" (Nigh Noon), que Fred Zinneman realizou em 1952. Mas dentro da técnica de não utilizar a montagem "Rope" continua ainda, a ser um filme único dentro da história do cinema. "A Janela Indiscreta", produção de 1954, também teve uma concisão em sua história: a ação se passa ao longo de três dias e também num único cenário: o apartamento em Greenwich Village, Nova Iorque, onde Jeff (James Stewart), um fotógrafo profissional está com a perna esquerda e o quadril imobilizado em conseqüência de um acidente sofrido durante um trabalho que estava realizando. De sua janela observa os fundos dos apartamentos vizinhos e, apenas por imagens, se toma conhecimento de vários personagens: a solteirona solitária, que janta sempre à luz de velas com seu amante imaginário; o casal de meia-idade sem filhos, que vive em função do seu cão de estimação; o compositor bêbado; o casal em lua de mel, a dançarina que tem muitos admiradores etc. Mas um dos personagens se destaca - o mau humorado caixeiro viajante, que tem que cuidar da esposa inválida. E a partir deste é construída uma estória de suspense, com lances de imaginação que, há 30 anos passados, fizeram de "Rear Window" um dos filmes de maior sucesso (em Curitiba, permaneceu várias semanas no Cine Palácio). Mesmo com a cópia prejudicada em suas cores originais, a fotografia de Robert Burks captura bem todo o micro universo de um prédio d apartamentos de Greenwich Village. Para a trilha sonora, ao invés do habitualmente denso e pesado Bernard Hermann (compositor favorito de Hitch), foi utilizado o mais eclético Franz Waxman, que aproveitando vários temas incidentais deixou também nesta sua trilha uma das mais belas canções dos anos 50 - "Liza", nome da personagem que Grace Kelly (1928-1982), então no auge de sua beleza, interpretou com tanta sofisticação e sensibilidade. Belíssima a imagem em que Grace Kelly, num fulgurante vestido branco (criação de Edith Head), chega ao entardecer e, num Close-up, praticamente beija o espectador - no caso, simbolizado pelo suarento Jeff. Hitchcok sabia, como poucos diretores, extrair o máximo rendimento d suas atrizes e em Grace Kelly obteve seus melhores momentos. No elenco d suporte, também interpretações marcantes - como da admirável Thelma Ritter com a enfermeira Stella; a Wendell Corey como o detetive Thomas Doyle e, especialmente, Raymond Burr como o vilão Lars Thorwald - num personagem em que, ao longo de todos os 112 minutos de projeção, não diz mais do que três frase. "Janela indiscreta" é o filme-concisão, com uma técnica admirável de narrativa, roteiro preciso de John Michael Hayes (um dos mais habituais colaboradores de Hitch) e cuja visão, nesta semana em que também há a [possibilidade] de se apreciar "Festim Diabólico", auxilia a compreensão porque os filmes de Hitchcok merecem até hoje, quase 3 décadas após suas realizações, tanto entusiasmo. LEGENDA FOTO - Thelma Ritter, Grace Kelly e James Stewart: "A Janela Indiscreta", um exercício de síntese visual.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
20
11/12/1984

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