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Aramis

Os filmes vazios de Walter Khouri

Qual o limitte que separa hoje o paulista Walter Hugo Khouri, 51 anos, realizador sério, sofisticado, da apelação comercial? A pergunta torna-se ainda mais válida após a visão - com toda boa vontade -deste seu << O Convite ao Prazer >> (cine São João, hoje, último dia em exibição). É fácil criticar WHK pela característica absolutamente erótic/Excitante de sua últimas realizações, como, no, passado (não muito distante) a ele eram endereçadas (venenosas) farpas de << hermético >>, << bergmaniano >> etc. Lembro-me que, em 1962, quando de um a de suas raras visitas a Curitiba, (quando sua filmografia não passava de quatro longa-metragens), Khouri já se recusava a comparações ao sueco Ingmar Bergman. Entretanto, na regular obra - média de um filme por ano - ele continuaria a buscar sempre como temática a solidão do homem, a procura de um enccontro, a limitação das palavras. Uma preocupação humanística, mistura de Bergman, Fellini, Antonioni - três cineastas europeus identificados a ele por uma obra extremamente pessoal. Já se disse de Khouri que basta ter visto um de seus filmes para se ter visto todos. Mas de Bergman também se disse o mesmo. E nem por isso deixa de existir uma quase unanimidade em torno do gênio sueco. Já o paulista Walter Hugo Khouri é um realizador com poucos defensores entre a dita << inteligentza >> crítica brasileira, que, ao contrário, tem preferido investir contra seus trabalhos, de pedras e paus nas mãos. Questão de subdesenvolvimento ou puritanismo? Coerência e regularidade. Pelo menos estes méritos ninguém pode negar a Khouri, além de ser, sem dúvida nenhuma, o mais requintado de nossos realizadores. Seus filmes - desde o praticamente inacabado << O Gigante de Pedra >> (1951/53) sempre se caracterizaram com um acabamento de extremo bom gosto. Aliás, a construção perfeita de cada imagem, o cuidado para obter a iluminação certa - e depois do uso regular da cor, a composição certa - valeram outras críticas. Ou, ao menos, outro tipo de colocação contrária às suas obras. Realmente, é fácil alinhavar argumentos contrários aos filmes de Khouri. Difícil talvez seja lembrar os méritos de cada uma de suas obras. Depois do que lhe valeria uma série de prêmios - há 22 anos (<< Estranho Encontro >>, 58), e dois de relativa ação (<< Fronteiras do Inferno >> e << Na Garganta do Diabo >>), viria o primeiro dos trabalhos introspectivos, de indagação - << A Ilha >> - (1963, que para muitos não seria nada mais do que uma visão tupiniquim e mal acabada de << A Aventura >>, que Michelângelo Antonioni realizou em 1959). << Noite Vazia >>, de 64 - seu primeiro << escândalo >> em termos de público (e grande sucesso de bilheteria) - está como um tripé que este << O Convite ao Prazer >> vem complementar: a longa noite de loucuras e solidão de dois homens à procura de um encontro do amor. Personagens burgueses, sem problemas materiais, insatisfeitos sexualmente na tentativa desesperada de um encontro maior. O filme realizado há 16 anos, com Norma Benguell e Odete Lara (em atuações que marcaram as carreiras destas atrizes) tinha sua ação concentrada num mesmo cenário e tempo - ao passo que neste, há um desenrolar cronológico mais externos. Também com toda a beleza, mudez e permissividade agora permitida - não se pode comparar a sensibilidade e energia de Norma e Odete a interpretações quase apagadas de Sandra Brea, Helena Ramos e Kate Lyra, que apesar de belas e nuas, nada acrescentam às suas carreiras, ou ao filme. Por incrível que pareça, são Aldine Mulher, Rossana Ghessa e as novatas Nicole Puzzi, Patricia Scalvi, Mara Husemann, Cristiana Ferhnan e Mariana Dornic, entre o grande elenco de novos e belos rostos que dão maior sustentação a << O Convite ao Prazer >>. Ao contrário de filmes onde havia apenas o hermetismo e mesmo a parapsicologia (erótica?) - de << O Corpo Ardente >> a << Paixão e Sombras >> - desta vez não há muito a desafiar a imaginação do espectador. Ao contrário, mesmo o erotismo não é sequer insinuado: é claro, quase vulgar muitas vezes, pouco restando para que certas seqüências não cheguem a um hardcore (filme pornográfico). Mas o requinte é, naturalmente, ainda grande: a fotografia de Antônio Meliande não deixa de buscar as composições mais perfeitas, a cenografia e figurinos de Campello Neto são estudadas e a trilha sonora do fiel colaborador Rogério Duprat aproveita, desta vez, temas jazzísticos com a quadrada Tradicional Jazz Band, de Tito Martino - um dos mais fiéis curtidores do estilo Dixeland em São Paulo. Sem dúvida que Walter Hugo Khoury é um homem e cineasta em permanente crise. Mas a julgar pelos caminhos deste << O Convite ao Prazer >> - aberto com uma citação de Spinoza e encerrado, como sempre, com uma longa seqüência de silêncio - parece que a sua crise não é de dinheiro, mas sim de criação. Final, em termos de bilheteria, o fato de ser hoje produzido pelo mais comercial dos produtores paulistas - A . P. Galante - já diz tudo. Este cavalheiro tem se unido a inúmeras realizações que nada acrescentam ao cinema nacional. Já Khoury, bem ou mal, ainda pode merecer uma revisão de sua obra. Pena que dificilmente aceite convites para conferências e debates, preferindo um trabalho pessoal e distante - mas que encontra cada vez menos adeptos e defensores.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
18/06/1980

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