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Aramis

Os judeus paranaenses (VII-final)

Fruto de quase cinco anos de pesquisas de campo e consulta a quase cem títulos, a dissertação de mestrado sobre a comunidade judaica em Curitiba (1899-1970), que a professora Regina Rottenberg Gouvea defendeu a 13 de junho último, no Departamento de História da Universidade Federal do Paraná, trouxe esclarecedoras colocações sobre o assunto, conforme ressintetizamos na série que hoje chega ao fim. Nas 172 páginas de sua tese, ilustrada com dezenas de mapas e gráficos, Regina procurou evidenciar as transformações pelas quais passou a comunidade (à qual pertence), desde a instalação dos primeiros emigrantes até 1970. E o tema a fascinou tanto que está agora desenvolvendo o estudo da última década, além de ter ampliado a pesquisa sobre a Escola Israelita Brasileira Salomão Guelmann e o Cemitério Israelita do Água Verde para ensaios à parte, os quais, juntamente com sua tese, espera ver editados em breve. Regina Rottenberg Gouvea concluiu que as mudanças se refletiram nos diversos aspectos da vida do judeu curitibano. "Nesse sentido, pode-se afirmar que a própria sociedade de adoção atuou como principal responsável, oferecendo condições de integração. Esta afirmação tem sua lógica na medida em que pressões extragrupais, no sentido do anti-semitismo, levam ao enquistamento, como forma de autodefesa. Tal fato não se manifestou de forma agravante, a não ser em certas ocasiões como, por exemplo, no Estado Novo e mais recentemente com a violação do Cemitério Israelita do Água Verde.No entanto, tais manifestações, por terem sido esporádicas, não chegaram a afetar o comportamento do grupo. Por outro lado, dentro do grupo judaico, a Escola funcionou como um agente integrador a partir do momento em que aceitou sua inserção no sistema educacional do Paraná, através de convênio assinado em 1938, favorecendo a aproximação entre judeus e não-judeus dentro do âmbito escolar. No tocante à religião, verificou-se que os judeus estão mais ligados à manutenção de suas tradições em prejuízo da religião formal. Em outras palavras, o que aparece são os valores exteriores do judaísmo numa busca de identificação com o grupo. Assim, o judeu curitibano se define como judeu a partir de uma opção pessoal, a qual está intimamente ligada ao sentimento de pertinência que o liga ao grupo. Esse sentimento está aliado à visão histórica do destino comum que vem desde as perseguições aos judeus durante o movimento das cruzadas, estendendo-se aos" pogroms" na Alemanha, Polônia, Rússia, prosseguindo até o holocausto nazista e ao ressurgimento dos partidos nazistas no mundo todo. A inobservância da religião e a modernização da educação indicam um distanciamento muito grande entre a atual comunidade judaica de Curitiba e seus pioneiros. Se entre os primeiros ainda se confundiam a noção de judaísmo, os aspectos religiosos, raciais, nacionais e as marcas do anti-semitismo vivido, restaurou-se entre os seus descendentes apenas temores de um anti-semitismo que ainda possa ressurgir. O que vem acontecendo na educação, na cultura e na religião aparece ainda mais evidênciado no que dis respeito à mobilidade ocupacional, à distribuição domiciliar e aos casamentos. O judeu curitibano tende, cada vez mais, a deixar o comércio e a indústria para ingressar nas carreiras de nível superior, como os demais cidadãos da classe média. O "klienteltshik" passou a ser um estereótipo do passado. Da mesma forma, o grupo já não tende mais à concentração domiciliar. Não se prende a um espaço geográfico comum e sim se dilui por outros bairros que não o Centro e Rebouças. Como já se observou, a escolha da moradia não é mais derivada de considerações grupais, como judeus, mas apenas de motivações provenientes de suas condições sociais. O casamento é crescentemente misto, havendo uma interpretação cada vez mais fluida entre o grupo judaico e a sociedade mais ampla, favorecendo a integração. Do ponto de vista estritamente demográfico, o fato que mais sobressai é a tendência à redução dos contingentes da comunidade, como evidenciar as taxas geométricas de crescimento. A taxa correspondente ao último período da observação é de - 0,07%, evidenciando bem que esta comunidade não alcança o índice necessário à reposição da população. Finalmente, a trajetória da comunidade judaica de Curitiba se orientou no sentido de uma ampla integração na sociedade de adoção. Em seu conjunto, seus membros vivenciaram e participaram ativamente de todos os aspectos da sociedade curitibana, sem deixar, todavia, sua condição de judeus.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
10
24/08/1980

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