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Aramis

Os paranaenses e o Paraná em Brasília

BRASÍLIA, Outubro - Piraquara virou Serra Dourada - uma cidade imaginária, mas próxima a Curitiba (fotografada na beleza de sua Rua das Flores e Praça Garibaldi) para algumas seqüências de << Janete>. Com este filme polêmico e que levou 3 meses para conseguir a liberação da censura, foi aberto, na segunda-feira, 24, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em sua XVI edição. Além do Paraná ser cenário de muitas seqüências de << Janete >>, com uma feliz fotografia de José Roberto Eliezer capturando em imagens coloridas tanto a paisagem dos pinheirais, como alguns aspectos da parte mais antiga e decadente de Piraquara, o Estado tem outra forte relação com este filme: a sua bel trilha sonora foi composta pelo londrinense Arrrigo Barnabé, o vanguardista autor de << clara Crocodilo >> em sua primeira experiência na criação de uma sound-track cinematográfica. O resultado é satisfatório: ao lado de uma música vanguardista, zonal - incluindo a canção-tema, nas vozes, entre outros de Caetano Veloso e Eliete Negreiros (a nova musa vocal de arigo), há momentos de nostálgica sonoridade, como a valsinha circense. Arrigo, entretanto, preferiu escapar a uma linha de músicas ao estilo de Nino Rota, apesar da temática do filme de Chico Botelho ter o circo como principal foco de magia. Rodado no ano passado, com seqüência em Curitiba e Piraquara filmadas em agosto, com auxílio de uma equipe de curitibanos (entre os quais Francisco Alves dos Santos e Berenice, atual presidente da Associação dos Cineastas do Paraná), << Janete >> é o primeiro longa-metragem de Chico Botelho, 34 anos, santista, mais de 12 anos de vivência no cinema e televisão e que, anteriormente, realizou e televisão e que, anteriormente, realizou 4 curta-metragens. Com 6 outros cineastas, fundou a Tatu Filmes, que em associação com a Embrafilmes, produziu este filme (Cr$ 62 milhões) que na segunda quinzena de novembro estará sendo lançado em Curitiba, possivelmente no cine São João. PRESENÇA PARANAENSE O Paraná nos cenários e com um compositor nascido em Londrina em << Janete >>; a participação do ponta-grossense Sérgio Bianchi, com seu média-metragem << Mate Eles! >> - que estará em exibição na sexta-feira, 28-; o comentário << Vida e Sangue de Polaco >> de Silvio back, (exibido na terça-feira); o conto do londrinense Domingos Pellegrini Jr., << O Encalhe dos 300 >> transformado por Denoy de Oliveira no filme << Sete Dias de Aginia >> - que será exibido sábado, como último concorrente; são alguns pontos que fazem o Paraná ter este ano uma presença bem mais destacada do que em edições anteriores no festival de Brasília. É bem verdade que a comissão de pré-seleção do festivais, examinado mais de 50 curta-metragens inscritos, cortou << Quarup-Sete Quedas >>, de Frederico Fullgraf - na opinião de muitos, documentário que mereceria ser aqui exibido. No média-metragem << Tribunal Bertha Lutz >>, de João Batista de Andrade, com 30 minutos de duração, exibido na segunda-feira, 24, outra participação paranaense: a atriz Denise Stockles, na seqüência final deste polêmico filme sobre a discriminação sofrida pela mulher, realizado já há mais de um ano por João Andrade (que não veio a Brasília por se encontrar na Ilha da Madeira), e que, há algum tempo, foi projetado na cinemateca do Museu Guido Viaro. Na opinião de quem já conhece os 12 curtas e medias metragens que concorrem, << Tribunal Bertha Lutz >> poderá ficar com o Candango de Ouro em sua categoria. Mas outro forte concorrente é << Carnaval - o aval da carne >>, documentário de 42 minutos por Carlos Marques e Ralph Justino, já vendido para a televisão francesa. Carlos Marques, pernambucano, 37 anos, viveu alguns meses em Curitiba entre 1974/75, quando assessorou o guitarrista espanhol Pedro Soler em sua excursão ao Brasil. Posteriormente , Marques, apaixonado por parapsicolgia e ufologia, foi um dos organizadores de um congresso internacional de U.F.O.s., que se realizou no auditório da Reitória, prestigiado com a presença de Alan Hydeck, consultor da Nasa para esta área em que apareceu também em << Encontros Imediatos do Terceiro Grau >>, de Steven Spielberg. O CARNAVAL SEM GLAMOUR Em << Carnaval, o aval da Cerne>, 16mm colorido, produção de Cr$ 10 milhões, nas quais Carlos Marques se uniu ao mineiro Ralph Justino, foi filmado durante o carnaval de 83, com três equipes agrupando 25 técnicos. Registro do dia-a-dia da cidade grande, nessa época do ano, em três pontos de referências fixaram seus objetivos: no Instituto Médico Legal, na Polícia Militar e no carnaval, de rua propriamente dito. << A partir daí e inspirados - como diz Carlos Marques - na magia do cinema de Glauber Rocha e na visão jornalistica de Zuenir Ventura propusemos à redescoberta da realidade fantástica do cotidiano >>. Ex-repórter da revista << Manchete >> - quando, num dos carnavais da década de 60, cobriu o Instituto Médico Legal, ali tendo uma experiência agora transmitida neste seu filme, Carlos Marques viveu 8 anos na Europa, entre Paris e Madrid. Na França, foi um dos maiores amigos da jornalista Regina Delluo, de << Le Monde >>, entusiasta pela música latino-americana e graças a quem, artistas como Chico Buarque, Fagner, Alceu Valença e outros penetraram na Europa. Regine faleceu há poucos meses, num acidente automobilistico. Em Paris, Carlos Marques desenvolveu atividades musicais. Foi, por exemplo, o idealizador e produtor do lp << Traduzir-se >> registrado na Espanha e também do já famoso, mas ainda inédito no Brasil, disco que reúne Fagner, Raphael Alberti, Mercedes, Sosa e Paco de Lúcia. Ao lado das atividades musicais, iniciou um fértil relacionamento com o pessoal ligado ao cinema fantástico, especialmente com o expressivo conhecedor Sephanne Bourgoin, com que surgiu a idéia de desenvolver << Carnaval o aval da carne >>. Na França, Carlos realizou dois documentários - << Essence Verte/Nouvel Or Noir >> (1980) e << Paris par Júlio Cortazar et Aécio Andrade >> (1981). Em 1982, chegou a fazer filmagens de Fagner e jogadores da seleção brasileira de futebol para um documentário intitulado >, que ficou inacabado. De volta ao Brasil - e animado com o entuiasmo de Ralph Justino, que havia feito um curso de cinema na Ucla, em Los Angeles - fez o documentário << Carnaval, o aval da carne >>, de Grande impacto - em cuja trilha sonora a música das escolas de samba se contrapõe a um poema do também pernambucano Carlos Pena Filho (<< Tiradentes >>) musicado por Carlos Marques. Enfim um dos muitos documentário interessantes, programados nesta mostra cinematográfica. O FESTIVAL O clima político de emergência se refletiu, obviamente, no festival deste ano. As discussões da Associação dos Documentaristas foram, previdentemente, transformadas para um local distante do luxuoso Saint Park Hotel, que substitui ao Hotel Nacional como sede do festival. Aliás, o saint faz sua estréia co-patrocinando o evento, oferecendo 70 apartamentos e com um esquema envolvendo 210 funcionários. Apesar de nomes famosos presentes, o festival tem um clima tranqüilo, em seus dois primeiros dias - segunda e terça-feira, sem grandes acontecimentos. Na terça-feira foi exibido << Parahyba Mulher Macho >> (em Curitiba, em exibição agora no Glória I), cuja diretora, Tizuka Yamasaki, aqui presente recursou fosse participante hors concours. Com isto, o festival se prolongará em mais um dia na quarta-feira, foi projetado << inocência >>, de Wlalter Lima Filho; na quinta-feira, << O Bom Burguês >>, de Oswaldo caldeira; na sexta << O Mágico e o Delegado >>, de Fernando Coni Campos e no sábado; << sete Dias de Agonia >>, de Denoy de Oliveira. Na sessão de domingo, a grande homenagem a Alex Viany (Almiro Viviani Fialho), 65 anos - a serem completados no próximo dia 4 de novembro, e 50 anos de cinema, com a exibição de seu último filme. << A Noiva da Cidade >>. Na cobertura do hotel Saint Paul, pela manhã, há reuniões com os realizadores dos filmers exibidos no dia anterior e, á tarde, mesas redondas com debates de temas específicos. Na terça-feira, Clara Alvin, da Fundação Pró-Memória de Cosme Alves Neto, conservador da Cinemateca do Museu de Arte Moderna-Rio de janeiro, conduziram os debates de << O Cinema como Objeto Cultural >>. Na quarta-feira, 26, << Om Cinema e a Imprensa >> foi examinado pelos jornalistas Nelson Hoineff (TV Manchete; O Dia, Veja), Cremilda Medina (O Estado de São Paulo) , Orlando Fassoni (Folha de São Paulo), Severino Francisco (Correio Brasiliense) e este colunista, representando O ESTADO. A IMPORTÂNCIA DO FESTIVAL Realizado regulamente desde 1965, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro forma, ao lado do de Cramado, o principal evento do cinema brasileiro. Organizado pela Fundação Cultural do Distrito Federal, com apoio da Secretária da Educação e Cultura do Governador do Distrito Federal e embrafilmes, é um acontecimento dos mais representativos para o fortalecimento do cinema nacional. A sua continuidade - mesmo enfrentando períodos de grande dificuldade (e a interrupção nos anos de 1972 a 1974) - é uma das razões pelas quais se tornou num acontecimento marcante dentro do calendário cinematográfico, valorizando os filmes aqui exibidos em, obviamente, projetando os que tem conseguido obter premiações. Nos primeiros anos era denominado << Semana do Cinema Brasileira >> e, em sua primeira edição, o grande premiado foi Roberto Santos, com >, baseado no conto de Guimarães Rosa (melhor filme; direção; autor Leonardo Villar; argumento; diálogo: Gianfrancesco Guarnieri etc). Em 1965, Walter Lima Filho conquistava uma menção honrosa com << Menino de Engenho >>, seu primeiro longa-metragem, baseado em José Lins do Rego. Este ano, << Inocência >>, com roteiro original de Lima Barreto inspirado no romance de Visconde de taunay, faz de Walter Lima Filho um dos favoritos com esta superprodução de Luís Carlos Barreto, que lnça Fernanda Torres (filha de Fernando Torres/Fernanda Montenegro), no papel título (este filme está em exibição, em Curitiba, no cine Condor).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
28/10/1983

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