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Aramis

Pedaladas da libertação

"Quicksilver - o prazer de ganhar" (Cinema I, até hoje, às 20 e 22h) é daqueles filmes de baixo orçamento, elenco jovem e que se constituem em surpresas das mais agradáveis. Sem nenhum nome conhecido entre os intérpretes e realizadores - uma das razões pelas quais os "inteligentes" (sic) programadores da Fucucu o desprezaram para as suas salas, classificando-o de "lixo" (que pena que a programação de boas salas esteja nas mãos de pessoas desinformadas em torno do que acontece no cinema!), "Quicksilver" sem chegar a um filme de arte ou entrar na categoria de cult-movie, é uma mostra de realização segura, revelando um competente diretor-roteirista - Tom Donnely - e elenco talentoso. O tema não poderia ser mais contemporâneo e atual: a busca do espaço para a realização profissional por parte de jovens, que sejam em Nova Iorque (onde se passa a ação) ou qualquer outra grande cidade, tem seus sonhos e objetivos bloqueados por problemas diversos. Jack Casey (Kêvin Bacon), um yuppie que em 3 anos como corretor da Bolsa de Valores foi a maior sensação - ganhando US$ 30 milhões - perde tudo em poucos momentos. Ao invés de se desesperar, decide retomar debaixo - como anônimo mensageiro que, de bicicleta, nas movimentadas ruas de Manhattan, faz entregas porta a porta. Ao invés da convivência com a canalha de Wall Street passa a conhecer jovens modestos, com sonhos que vão de possuir um carrinho para venda de cachorro-quente, chicano Hector Rodrigues (Paul Rodrigues) a insegura Terri (Jami Gertz), solitária e abandonada, na busca de quem acredite em sua honestidade. Há jovens - como Vodu (Larry Fisburne) que se envolvem com quadrilhas de tóxicos e o traficante Gypsy (Rudy Ramos), que o atropela e mata - como, no final, tentará fazer com Casey. A ação é linear, num desenvolvimento de personagens maniqueístas - mas com profunda sensibilidade e, sobretudo, direção correta de Tom Donnelly, que soube fazer o fotógrafo Thomas Del Ruth aproveitar as possibilidades de câmara instalada numa bicicleta e conseguir seqüências nervosas, de correrias e perseguições nas ruas movimentadas. Há pontos referenciais importantes - e que por certo devem ter influenciado a Donnelly na elaboração do roteiro, a partir do clássico "Ladrões de Bicicletas" ("Ladri di bicicletti", 48), de Vittorio De Sica (1902-1974) - na relação da importância do mensageiro possuir sua bicicleta para garantir o seu emprego (e os cuidados que os personagens tem para evitar o roubo das mesmas). Aliás, a bicicleta dentro da estrutura dramática de filmes já poderia merecer até uma curiosa filmografia, como veículo simples, mas que tem marcado opções em tantos filmes, inclusive um marco do cinema brasileiro, "O grande momento", 1958, de Roberto Santos (1928-1987). Tom Tonnelly mostra em seu roteiro uma construção clara dos personagens, fixando o jovem Casey, seu sucesso como corretor da Bolsa de Valores e sua conscientização em (re)descobrir a realização em atividades mais simples - no relacionamento com o pai (Geraldo O'Loughlin), numa das mais belas e humanas seqüências: ao saber que o filho havia perdido US$ 30 milhões (inclusive suas poupanças, de modesto mecânico), lhe dá força e otimismo - deixando para chorar quando imagina que Jack já tinha deixado a casa. "Quicksilver - o prazer de ganhar" é um filme que se desenvolve a cada seqüência, decolando suas ação e principalmente dando uma leitura ampla - abordando com universo jovem, mas de forma inteligente - e não na estúpida linha que tem marcado os filmes do gênero. Infelizmente, sem maior promoção ou atrativos em seu elenco, é desprezado pelo público - assim como foi considerado, sem ser visto (o que é mais grave), de "lixo" pelos programadores das salas da Fucucu (mantidas pelo dinheiro dos contribuintes), que desta forma, mais uma vez, perderam de exibir um bom filme. E preferiram, naturalmente, as reprises. LEGENDA FOTO - Pedalando nas ruas de Nova Iorque, Jack (Kevin Bacon) e Vodu (Larry Fishburne) em "Quicksilver - O Prazer de Ganhar". Em exibição no Cinema I.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
03/08/1988

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