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Aramis

Polanski, um suspense que nada deve a Hitch

O médico Ben McKenna (James Stewart) está em férias no Marrocos, com a esposa, Jo (Doris Day) e o filho Hank (Christopher Olsen). Na primeira seqüência, dentro de um ônibus, conhece um árabe-francês, Louis Bernard (Daniel Gelin), que intervém quando o garoto, sem querer, tira o véu do rosto de uma mulher, provocando a ira do marido. Estabelece-se um relacionamento que, nos 117 minutos seguintes, resulta numa das maiores mostras de suspense na tela em "O Homem que Sabia Demais" (1956). O cardiologista Richard Walker (Harrison Ford) e sua esposa (Betty Buckley), de San Francisco, chegam a Paris para um congresso e uma segunda lua-de-mel, 20 anos depois e no mesmo cenário da primeira. Os primeiros 6 minutos detalham a viagem do aeroporto Charles De Gaulle ao Hotel Intercontinental: o pneu furado no velho táxi, o registro na portaria, os telefonemas - feitos pela esposa, que fala francês, e, quando Walker está tomando banho a mulher fala ao telefone - sem que ele escute o que disse - e deixa o apartamento. Desaparece. Tem início então um thriller que retoma, 32 anos depois, o mesmo vigor, suspense e força de "The Man Who Knew Too Much". Ao entardecer de sexta-feira, 9, no Hotel Meridian, presente a jornalistas ligados ao cinema do Rio e várias capitais brasileiras, Roman Polanski, 55 anos, 27 de cinema, repetiu mais uma vez aquilo que tem falado sobre "Busca Frenética" (lançamento nacional dia 15; em Curitiba, no cine Astor), desde que estreou em Paris há menos de seis meses. - "Não, em absoluto. A comparação aos trabalhos de Hitchcock, especialmente "O Homem que Sabia Demais" não me incomoda. Quando se faz um thriller, podem acontecer coisas bem piores do que ser comparado a Hitchcock. Afinal, ele fez thrillers durante toda a sua vida e aperfeiçoou as coisas, de maneira que é impossível escapar de comparação". No Rio - como em São Paulo, a partir de amanhã - Polanski fala do seu amor ao cinema. Em recentíssima entrevista a Der Spiegel, o diretor de "O Bebê de Rosemary" salientou que as comparações deste seu último filme com as obras de Hitchcock são naturais. - "Eu amava o cinema quando criança, eu o amava quando jovem e continuo amando até hoje. Eu estou constantemente indo ao cinema, pelo menos umas três vezes por semana. E quando a gente vai ao cinema descobre-se sempre gêneros que a gente gostaria de fazer. Eu sempre me comparo com um playboy, que uma vez quer uma loira, depois uma chinesa, depois uma negra e, talvez, até uma garota esquimó. Quando se vai ao cinema e se vê todos estes gêneros totalmente diferentes - faroestes, musicais, thrillers - e quando se gosta deles, é apenas natural que algum dia se queira fazer alguma coisa semelhante". xxx Em sua autobiografia ("Roman de Polanski", tradução de Thereza Cesário Alvin, 1984, Editora Record, 390 páginas), Polanski, com um estilo leve e gostoso - (afinal, sempre foi roteirista de seus filmes) fala de sua infância difícil - em 1939, em Cracóvia, foi obrigado a morar num gueto, devido à invasão dos nazistas, depois sobrevivendo sozinho, com mil dificuldades. A carreira de Polanski não foi fácil, até chegar a Escola de Cinema de Lodz, a realização dos primeiros curtas e conseguir premiações com "Dois Homens e um Armário" e o longa de estréia ("A Faca na Água"/Noz W Wodzie, 62), que realizou depois que já havia viajado algumas vezes para Paris. Em sua autobiografia, Polanski fala das dificuldades na concretização de cada projeto - o episódio rodado em Amsterdan para "As Maiores Vigarices do Mundo" (62), "Repulsa ao Sexo" (Repulsion, 65) - feito em Londres, - e "Armadilha do Destino" (Cul de Sac, 66), rodado na França. Há 21 anos, faria "A Dança dos Vampiros" (Vampire's Killers), uma comédia que revelaria Sharon Tate (1940-1969), que - a exemplo de várias outras de suas atrizes, também se tornaria sua mulher (Nastassja Kinski, em "Tess", 1980; Emmnuelle Seigner, que lança agora em "Busca Frenética"), e que teria uma morte trágica, junto com 4 amigos, assassinada em sua mansão, em Bel Air, quando foi atacada por um grupo de fanáticos adoradores do diabo, liderados por Charles Manson. Falando sobre seus filmes favoritos, Polanski diz: - "É claro que o filme mais recente sempre está mais perto da gente; É como uma pessoa que teve muitos relacionamentos amorosos e que continua sentindo o último com mais intensidade, mesmo quando ele já terminou. Mas, por outro lado, a gente também pode olhar para trás e dizer objetivamente: aquela ocasião eu realmente senti a maior felicidade de minha vida! Nesta ótica, "A Dança dos Vampiros", é o meu filme predileto. Ele me transporta a um período muito feliz da minha vida, tanto na vida particular com também na profissional. Em termos puramente artísticos, acredito que meu melhor filme seja "Armadilha do Destino". Já - "Repulsa do Sexo" é detestado - apesar da crítica o admirar bastante: - "O filme não ficou como eu o tinha imaginado. Eu não pude realizá-lo tal como queria. Não havia dinheiro para isto, nem tempo". xxx Cada filme de Polanski justifica todo um amplo espaço - o que ele faz, em "Roman" - mas que cobre apenas o período até 1983, quando frustrado por não poder realizar na época "Os Piratas", voltaria ao teatro como ator em "Amadeus". Posteriormente Polanski realizaria "The Pirates", que apesar do lançamento em Cannes, há dois anos (até o navio utilizado nas filmagens foi levado ao balneário para promoção) se constituiu num imenso fracasso (no Brasil, foi lançado em vídeo e a cópia 35mm só teve exibição até agora no Rio de Janeiro). "Busca Frenética", rodado no ano passado, surgiu em conseqüência do fracasso de "Piratas", como ele próprio tem admitido nas entrevistas. - "A primeira idéia ao fazer "Frantic" foi fazer um filme para ganhar dinheiro. Porque depois do fiasco de "Piratas" eu fiquei totalmente falido. Aí o pessoal da Warner Brothers me perguntou se eu tinha uma idéia para um filme. É claro que disse: "Lógico que tenho!". E tive de inventar bem depressa. De improviso, eu disse: "É um thriller, ambientado em Paris". Eu disse thriller, porque realmente queria voltar a rodar um thriller; e eu disse Paris, porque eu queria ficar algum tempo novamente em Paris, depois de ter passado dois anos principalmente na Tunísia". Sem poder voltar aos Estados Unidos desde 1978 (acusado de ter seduzido uma menor na casa de seu amigo Jack Nicholson, foi processado e condenado), Polanski vive em Paris. Nos EUA, em 1974, fez um excelente thriller, "Chinatown", com Jack Nicholson - e que teria, agora, uma revisitação, dez anos depois. Projetos não faltam para Polanski, que em todos os seus filmes sempre deixou uma marca extremamente pessoal. "Busca Frenética", um filme de suspense, com uma ótima roteirização e no qual revela a beleza de Emmanuelle Seigner (neta do ator Louis Seigner, da Comédie Française e de muitos filmes), o trouxe, pela terceira vez ao Brasil. A primeira foi há anos, para o carnaval, com Jack Nicholson; depois, em 1980, para promover "Tess". Nas duas vezes ficaram muitas estórias - algumas fantasiosas. Agora, ele está novamente por aqui - e de sua entrevista - e a propósito de "Frantic" - voltaremos a falar nos próximos dias. LEGENDA FOTO - Como já havia feito com Sharon Tate e Nastassja Kinski, Polanski sempre revela novas e belíssimas atrizes: em "Frantic" é a sensual Emmanuelle Seigner que surge com toda sua sensualidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
11/09/1988

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