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Aramis

A provinciana polêmica dos painéis paulistas

Atualmente Poty tem passado muito tempo em São Paulo, dividindo com um de seus maiores amigos, Carybé (Hector Barnabó), a execução de seis imensos painéis (três para cada um), no Memorial da América Latina, que o governador Orestes Quércia decidiu construir na Barra Funda. São 230 metros quadrados divididos em seis painéis de 5m de largura por 15m de altura, que contarão um pouco da história da América. O antropólogo Darcy Ribeiro, ex-vice-governador da Guanabara, como coordenador do projeto cultural da obra, - convidou Poty e Carybé para fazerem os painéis, enquanto Oscar Niemeyer é o autor do projeto arquitetônico. Em entrevista a Sílvia Penteado, d'"O Estado de São Paulo", Carybé, brincalhão, disse em relação a divisão do trabalho: - "Confesso que fiz uma safadeza com Poty. Dei o pior a ele. Este último, o painel dos construtores, é de lascar". Carybé, 77 anos, porteño do bairro de Lanus mas o mais baiano dos artistas (desde 1950 mora em Salvador), executa os painéis dos negros, dos ibéricos e dos libertadores. Poty, curitibano do Capanema, faz os painéis que simbolizam os índios, os imigrantes e os construtores. xxx São dois artistas de dimensão internacional, dos poucos grandes muralistas existentes no Brasil. Poty tem centenas de obras espalhadas pelo Brasil, imprimindo em todos o seu estilo característico, uma força imensa. O mesmo pode-se dizer de Carybé, artista da maior dimensão e que não só ilustrou vários livros de Jorge Amado, como é personagem em muitos deles. Atualmente, Carybé desenha os figurinos para uma nova versão de "O Cangaceiro", que Carlos Coimbra vai realizar - com base no clássico de Lima Barreto (1906-1982), para quem, há 35 anos, também fez a direção de arte. Apesar da indiscutível competência de Poty e Carybé, a execução do Memorial da América Latina começou a provocar ciumeiras nos artistas plásticos de São Paulo. A primeira a reclamar foi Maria Bonomi, que começou a protestar pela falta de concorrência, concurso, ou seleção na escolha dos muralistas. Cesar Giobbi, em matéria publicada no "Jornal da Tarde" (31/3/88), comenta que "Maria descobriu que os artistas que iriam fazer os seis imensos painéis do memorial já tinham sido escolhidos por Darcy Ribeiro sem concorrência, sem concurso, sem seleção, sem consultas. E aí começou a falar-se no assunto. Somaram-se a isso alguns artigos e entrevistas de Darcy Ribeiro (chamado aqui em São Paulo de "O eterno desempregado da esquerda") na imprensa carioca em que era deliberadamente desaforado com a intelectualidade paulista. A confusão estava formada. Críticos e artistas plásticos paulistas, mais as universidades locais, e agora também os arquitetos resolveram se indignar. Como resultado, o governador deverá receber várias cartas de entidades profissionais, reclamando dos critérios que usou para escolher arquiteto, organizador e artistas do Memorial. A carta da Associação profissional de Artistas Plásticos de São Paulo - que foi enviada ao palácio dos Bandeirantes, pedia ao governador que alterasse o projeto em andamento, e que usasse de critérios mais democráticos para as próximas obras públicas". xxx Inveja, despeito, provincianismo! Muitas adjetivações cabem a esta história que, segundo o jornalista Giobbi, "está rolando nos bastidores há pelo menos dois meses". Informa que "pelo que se pôde levantar, conversando com inúmeras pessoas do mundo das artes, Niemeyer sempre quis que Poty fizesse os painéis do memorial, que medem 15mx15m". O Instituto dos Arquitetos do Brasil-SP também decidiu entrar na briga, comentando o presidente Glauco Pinto de Morais que "há duas ou três gerações de arquitetos brasileiros que nunca tiveram vez porque Niemeyer pega, automaticamente, todas as grandes obras públicas do País". Quem conhece bem Poty e Carybé sabe que, nestas alturas, eles devem estar chateados com tanta polêmica. Artistas maiores, acima de discussões e picuinhas, não pediram para fazer os painéis. Foram convidados pelo talento e competência, de forma que não se justifica tais questionamentos. Mas a dor-de-cotovelo sempre existe! Especialmente para os artistas quatrocentões.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
05/04/1988

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